Arlindo Oliveira vai ser o presidente do 33.º congresso da APDC, que se realiza em 14 e 15 de maio, em formato híbrido, a partir do auditório da Faculdade de Medicina Dentária de Lisboa, e que este ano decorrerá sob o mote “40 years futurizing”.
“A APDC é uma instituição importante e é com muita honra que aceitei esse convite”, que acontece numa altura em que “a tecnologia desempenha um papel fundamental”, afirma o professor catedrático do Instituto Superior Técnico (IST) e presidente do INESC.
“As maiores empresas do mundo são da área da tecnologia, desempenham um papel importante na sociedade e, mesmo em termos geopolíticos, a tecnologia é uma questão essencial”, sendo que o entusiasmo “mais recente” tem a ver com a inteligência artificial (IA), adianta o antigo investigador do CERN.
Questionado sobre o que o mais surpreendeu até agora em termos tecnológicos, diz que foram os telemóveis.
Quando se desenvolveram os telemóveis “eram para os polícias, bombeiros, eventualmente para os médicos, nunca se pensou” que o telemóvel viesse a ser tão divulgado e que todos viessem a ter um dispositivo, refere.
E muito menos que os telemóveis “mudassem tão profundamente a maneira como interagimos com o mundo”, até porque se alguém deixa o telemóvel em casa é como “se tivesse deixado as chaves”, salienta.
"A revolução que foi trazida pela computação móvel e pelos ‘smartphones’, para mim, foi a mais surpreendente porque foi a que não antecipei, nem eu, nem praticamente ninguém”
Por isso, a “revolução que foi trazida pela computação móvel e pelos ‘smartphones’, para mim, foi a mais surpreendente porque foi a que não antecipei, nem eu, nem praticamente ninguém”, reforça Arlindo Oliveira.
Aliás, “mesmo nos filmes de ficção científica não se vê, é curioso. Se for ver o ‘2001: Odisseia no Espaço’, eles não têm telemóveis”, sublinha o investigador do INESC-ID.
Considerando que esta é uma “altura interessante para ter” a “oportunidade de presidir” ao congresso, admite, contudo, ser difícil antecipar o “mundo a 40 anos”.
Mas, se “andarmos 40 anos para trás”, trata-se de uma altura em que não havia telemóveis, havia uma Internet “muito incipiente”, “era um mundo profundamente diferente”, prossegue.
Dentro da dificuldade em prever o mundo em 2064, “eu imaginaria que é seguramente um mundo onde as interfaces com a Internet vão ser muito diferentes” ou que pelo menos “vão existir também interfaces muito diferentes”, quer as que usam IA e, portanto, “falaremos com os telemóveis ou com o que quer que tenhamos, da mesma maneira que agora falamos com pessoas, e provavelmente – sou também um otimista nesse aspeto – alguma componente do metaverso, da realidade virtual” e “da realidade aumentada”, refere Arlindo Oliveira, licenciado em engenharia eletrotécnica e de computadores pelo IST e doutorado na mesma área pela Universidade da Califórnia em Berkeley.
"Acho que em 40 anos é suficientemente seguro (…) que uma fração significativa das pessoas vai passar uma parte da sua vida no metaverso"
“Acho que em 40 anos é suficientemente seguro (…) que uma fração significativa das pessoas vai passar uma parte da sua vida no metaverso, interagindo também com uma Internet e com agentes que vão ser profundamente diferentes do que são agora”, considera.
À parte disso, “espero que muitas coisas sejam como até agora: continuam a ser os seres humanos que controlam o planeta, a política e a economia” e “que haja uma menor desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres em todo o planeta”, reforça.
A tecnologia “já permite levar cuidados médicos” a África, criar negócios através do telemóvel mesmo num sítio onde não há outros recursos, mas em conjunto com a globalização também traz “um risco de concentração” do poder económico num pequeno número de empresas ou num pequeno número de países, pelo que “esta ambição da redução das desigualdades” pode vir a não ter lugar, diz, manifestando-se mais otimista face às questões do aquecimento global.
“A capacidade de adaptação da sociedade e até do planeta (…) é maior do que aquela que pensamos, os fenómenos extremos seguramente que existirão”, mas tem vindo “sempre a decrescer” o impacto destes na humanidade, pelo que “espero que essa tendência não se altere” e “conto que haja uma alteração suficientemente forte na trajetória de maneira que as emissões de carbono, a principal ameaça neste momento, venham a ser muito menores”, salienta.
E, talvez dentro de 40 anos, “até possamos já estar numa situação de carbono zero, até com alguma absorção do carbono existente e, portanto, que tenhamos controlado o aquecimento global” e os impactos dessa alteração “sejam menores do que os piores cenários” previstos. Em termos de questões ambientais, espera que a diversidade se mantenha.
Numa perspetiva a cinco anos, espera uma “integração significativa de ferramentas de inteligência artificial em sistemas de informação”, com qualquer pessoa a ter acesso a serviços jurídicos ou médicos “muito mais acessíveis e de maior qualidade” do que atualmente.
“Os sistemas, não substituindo os especialistas da área, fazem uma certa triagem, substituindo um certo nível de serviços quando telefonamos para a linha Saúde 24”, exemplifica.
"Em cinco anos é razoavelmente seguro prever que vamos ter sistemas que exibem níveis de competência comparáveis à de especialistas em diversos domínios”
“Acho que em cinco anos é razoavelmente seguro prever que vamos ter sistemas que exibem níveis de competência comparáveis à de especialistas em diversos domínios”, aponta, acrescentando que a IoT (Internet das Coisas) vai “continuar a crescer”, com um universo de eletrodomésticos e objetos ligados à Internet.
Isso “vai ser uma coisa muito marcante e vamos ver também as primeiras a aplicações dos sistemas de 5G, com latência reduzida (…) e também maior largura de banda que vai permitir um conjunto talvez não tão grande como poderíamos pensar, mas um conjunto de novas aplicações, quer na condução autónoma ou semiautónoma e na medicina à distância, nas questões de cirurgia” ou na gestão logística, elenca.
“Em cinco anos vamos começar a ver as primeiras aplicações reais e úteis da tecnologia 5G”, conclui.
Manifesta-se um “bocadinho pessimista” relativamente à computação quântica “no sentido formal da computação de computadores que são exponencialmente mais rápidos que os tradicionais, usando um mecanismo de ‘entanglement’ [entrelaçamento quântico]”.
“Acho que já não vou ver nenhum e francamente tenho alguma dúvida que se venha a tornar uma realidade este século ou talvez nunca”, remata.
*** Alexandra Luís (texto) e Jorge Coutinho (Vídeo), da agência Lusa ***
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