Desde cedo, Zhao nunca teve a vida facilitada. Nascido na China em 1977, a infância foi passada em fugas devido aos pais, que eram professores numa altura em que o país atravessava um "pós" revolução cultural do Partido Comunista, que não era muito a favor da liberdade de pensamento nas salas de aula.
Aos 12 anos, mudou-se com a família para Vancouver, no Canadá, onde iniciaram uma nova vida. Na adolescência, Changpeng trabalhou na McDonald's para ajudar os pais a pagar as contas e começou a juntar algum dinheiro para a faculdade. Foi lá, mais precisamente na McGill University, uma das melhores do país, que tirou engenharia informática e começou a interessar-se pelo mundo das finanças.
Teve empregos na área financeira em Nova Iorque e Tóquio, onde era responsável pelos sistemas informáticos de corretoras, e uns anos mais tarde regressou à China, onde lançou o seu próprio negócio na área. Foi neste período da sua vida que entrou em contacto com o mundo das criptomoedas. Em 2013, num jogo de poker em Xangai com dois investidores locais, Zhao foi apresentado à Bitcoin, à blockchain e à visão de um mundo descentralizado.
Estes desafiaram-no a colocar 10% da sua riqueza na criptomoeda e ver o que acontecia, um repto ao qual acedeu e que pode ser olhado hoje como umas das decisões mais importante da História destes ativos. Nos quatro anos seguintes, Changpeng Zhao estudou tudo o que podia sobre estes conceitos e começou a pensar como poderiam ser aplicados ao seu mundo das finanças. Passando de aluno a professor, em 2017, decidiu vender o seu apartamento da altura, colocar o dinheiro todo em Bitcoin e criar a Binance, uma plataforma de trading de criptomoedas.
Binance resulta da fusão entre binary e finance, que podia ser uma alusão irónica ao tudo ou nada do mundo dos investimentos, mas está provavelmente associado ao background informático de Zhao. Ao contrário dos serviços concorrentes da altura, a empresa queria focar-se mais na transação de altcoins (criptomoedas menos conhecidas do que Bitcoin e Ether, com menos liquidez, maior risco e um potencial de ganhos maior). A plataforma tornou-se o destino de eleição para vários projetos a surgir no criptoverso e a sua popularidade valeu a Changpeng Zhao a alcunha de CZ, uma sigla com o seu primeiro e último nome, que simbolizava o carinho por parte de uma comunidade que ia crescendo de dia para dia.
A ideia de CZ passava por criar um mecanismo que facilitasse não só a descoberta e investimento nestes projetos, mas também o seu próprio desenvolvimento. Foi por isso que, juntamente com a sua equipa, criou a Binance Coin (BNB) e a Binance Smart Chain (BSC).
A primeira é a criptomoeda que rege a sua plataforma e que permite que cada utilizador possa ter custos de transação inferiores. Basicamente, em vez de utilizar dólares ou euros para comprar uma criptomoeda específica, o utilizador pode comprar primeiro BNB e depois sim fazer investimentos. Bom para o utilizador que poupa em custos e bom para a Binance, que diminui o papel dos bancos e vê o seu valor crescer à medida que cada vez mais pessoas utilizam o seu serviço e criptomoeda.
A segunda é a blockchain que rege toda a plataforma e que pode ser utilizada por outros projetos para lançarem os seus próprios serviços, seja na área financeira (DeFi), seja noutra área qualquer.
De 2017 para 2022, dizer que a Binance se tornou importante é um mero eufemismo, dado que é, por larga margem, a maior plataforma de investimento em criptomoedas. Um artigo recente da Bloomberg indica que o sucesso da plataforma tinha tornado Zhao um dos homens mais ricos do mundo e o n.º1 das cryptos e da Ásia, com uma fortuna estimada em 96 mil milhões de dólares. Alguns dados da plataforma ajudam a justificar este valor:
Num dia normal, o volume de transações na plataforma ultrapassa os 100 mil milhões de dólares. O volume médio é superior ao combinado das suas quatro diretas rivais.
A Bloomberg estima que, só em 2021, a Binance superou os 20 mil milhões de dólares em receitas, com base no volume e fees partilhadas pela empresa. Não estão incluídas neste valor receitas da venda de NFTs (que a empresa introduziu recentemente) e trabalho de consultoria, por exemplo.
O valor da BNB cresceu 1.300% em 2021, como um símbolo do crescimento e maior interesse da indústria das criptomoedas durante a pandemia. Atualmente, na Binance é possível investir em mais de 350 criptomoedas.
Vamos à dose de polémica
Numa indústria pouco regulada e onde o que é verdade numa semana pode não fazer sentido na seguinte, desde que foi criada, a Binance andou numa linha cinzenta que, em muitos casos, a colocou em problemas judiciais com muitos dos países onde opera. Estes são alguns dos exemplos:
Em 2018, a empresa foi banida da China por não respeitar a legislação financeira do país para valores mobiliários e "fugiu" temporariamente para o Japão.
A empresa tem atualmente processos em tribunal nos EUA, no Canadá, na Alemanha, no Reino Unido e no Japão devido a algumas irregularidades na sua plataforma, à forma como alguns ativos de risco são negociados e a alguns casos de insider trading. Uma espécie de descentralização de problemas.
Aos dias de hoje, a Binance continua sem uma sede oficial, apesar de ter um centro de operações em Malta e diversas filiais para gerir operações em países específicos como a Binance US para os Estados Unidos. A empresa está incorporada nas Ilhas Caimão, conhecido paraíso fiscal com uma paisagem de offshores e evasões fiscais.
Um dos países com que Zhao tem tido maior contacto nos últimos meses são os Emirados Árabes Unidos, cujos governantes estão a procurar transformar o dinheiro do petróleo num hub para projetos na área das criptomoedas. O próximo passo no crescimento da Binance é conseguir investimento privado e para isso vai ter de “fazer as pazes” com alguns dos países mencionados ou encontrar um país que tolere o seu feitio. Caso o faça, a Binance poderá atingir uma valorização que fará de CZ o homem mais rico do mundo, superando Elon Musk e Jeff Bezos.
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