O Instagram, seguido do Snapchat, é a aplicação mais preocupante para a sanidade mental dos jovens, seguindo-se o Facebook e o Twitter. O YouTube consegue uma avaliação positiva entre as cinco redes sociais analisadas, segundo o recente estudo "#StatusOfMind" da Royal Society for Public Health (RSPH) e do Young Health Movement (YHM).
Uma rede social é entendida tanto como uma aplicação como os sítios Web que permitem a criação e partilha de conteúdos ou para participar em interacções sociais.
Com base em inquéritos a quase 1.500 jovens, com idades entre os 14 e os 24 anos, realizados no Reino Unido entre Fevereiro e Maio passado, o estudo recomenda a introdução de um aviso "pop-up" de alerta para a utilização excessiva dos media sociais (71% dos inquiridos apoia esta medida), bem como um aviso para as imagens manipuladas (68% concordam).
O Instagram foi apontado principalmente por efeitos negativos como ansiedade e a percepção da imagem corporal, quando os jovens se comparam com fotografias que podem ter sido digitalmente manipuladas.
Uma outra medida potencialmente mais polémica (mas com um apoio de 80% dos inquiridos) propõe às redes sociais "identificarem" os utilizadores que possam revelar problemas de saúde mental a partir do que divulgam "online".
Para Shirley Cramer, do RSPH, “os media sociais já foram descritos como mais viciantes do que os cigarros e o álcool, e estão agora tão impregnados nas vidas dos jovens que já não é possível ignorá-los quando se fala das questões de saúde mental deles". Até porque, como nota Becky Inkster, da Universidade de Cambridge, os media sociais fazem parte da vida diária dos jovens e, "por vezes", eles "sentem-se mais confortáveis a falar online das suas questões pessoais".
Mais ansiosos, mais deprimidos
O alerta surge quando 91% destes jovens diz usar as redes sociais e os seus níveis de ansiedade e depressão cresceu 70% nos últimos 25 anos, assim como os níveis de "cyberbullying".
O estudo não aponta apenas problemas como a ansiedade de se "sentir excluído" ("fear of missing out" ou FoMO) por não se acompanhar o que é partilhado, com implicações no sono dos jovens que acordam para verificar as mensagens com o consequente cansaço durante o dia. Nota igualmente que se devem instalar "protecções" e que 70% dos inquiridos consideram mesmo ter "suporte emocional" nestas redes sociais.
Mas um em cada seis jovens aponta que ansiedade e depressão ocorrem nas suas vidas e consideram que as redes sociais pioram esses estados. Os que acedem mais de duas horas diárias a redes sociais têm uma maior tendência para revelar uma "fraca saúde mental", incluindo sintomas de depressão ou ansiedade, diz o estudo. Isto pode ser agravado quando se gere a presença simultânea em várias redes sociais.
O Instagram surgiu em Outubro de 2010 como rede social de partilha de fotografias e de vídeos. A aplicação que juntava a "instant camera" ao "telegram" contava com 10 milhões de utilizadores em Setembro de 2011 para, seis meses depois, chegar aos 30 milhões.
Foi quando o Facebook a comprou por quase mil milhões de dólares, crescendo em número de utilizadores para 150 milhões no final de 2013 e 700 milhões em Abril passado.
Esta rede potencia verem-se imagens "online" de amigos em festas ou em férias e dinamiza uma atitude de "comparação e desespero", com uma consequente baixa estima pessoal - mesmo que as imagens nem sempre sejam reais. No entanto, a representação "irrealista" de uma certa realidade e a "pressão dos pares" no mundo "online" pode desencadear a também denominada "depressão do Facebook".
Popularidade, a doença social
Num artigo recente, "Cracking the Popularity Code", o psicólogo Mitch Prinstein, da Universidade da Carolina do Norte, considera existirem dois modelos de popularidade e que a cultura actual se "estabeleceu no tipo mais disfuncional".
Segundo Prinstein, a popularidade é algo que afecta os jovens em geral, incluindo o potencial para desenvolver doenças "décadas mais tarde".
O investigador separa a popularidade em dois tipos: uma que afecta mais as crianças e tende a ser proporcionada pelo reconhecimento positivo dos outros, enquanto a segunda emerge na adolescência, tendo mais em conta o "status" (como a "visibilidade, influência, domínio e poder").
Como adulto, o ser humano pode seguir um ou outro caminho, explica, mas é "uma decisão mais dificultada pelo crescente número de plataformas ("reality TV", media social, etc.) concebidas para ajudar a ganhar 'status'".
No caso dos jovens, o "status" é constantemente avaliado pelo que publicam online - seja ou não verdade. Mas tem ainda outros impactos na saúde dos jovens.Falta de sono e de auto-estima
O relatório da RSPH aponta como vários estudos anteriores "mostraram que o crescente uso dos media sociais tem uma associação significativa com a fraca qualidade do sono em jovens", algo agravado com o uso das redes sociais antes de se deitarem. Não só isto leva a que demorem mais tempo a adormecer como "um em cinco jovens diz acordar durante a noite para verificar mensagens nas redes sociais", o que leva a estarem mais cansados durante o dia (por comparação com os colegas que não têm este hábito).
O acesso a redes sociais provoca um outro "estrago" na auto-estima dos jovens, principalmente das jovens. "Nove em cada 10 dizem sentir-se infelizes com o seu corpo" e, no caso das adolescentes ou jovens nos 20 anos, quando acedem ao Facebook, "mesmo que por um curto período de tempo, as preocupações com a imagem do corpo são mais elevadas" do que ocorre com as não-utilizadoras. Isto leva a quererem mudar a sua aparência, incluindo mesmo efectuarem "cirurgia estética" para aparecerem melhor nas fotografias.
O relatório foca ainda a questão do "cyberbullying", um "factor de risco" na juventude para questões como saúde mental, educação e relações sociais, com efeitos duradouros. Como há pouco tempo para estarem "incontactáveis", os jovens estão mais vulneráveis ao "cyberbullying", com sete em 10 a afirmarem terem sido vítimas dessa prática (principalmente no Facebook). Pior ainda é que "91% dos jovens que reportaram 'cyberbullying' dizem que nada foi feito", segundo um outro inquérito da associação Bullying UK.
O medo de não estar presente
Uma tendência nova mas crescente que o estudo detectou foi o "Fear of Missing Out" ou FoMO. Este conceito passa pela "preocupação de que eventos sociais, ou actividades de outra forma divertidas, possam estar a ocorrer [nas redes sociais] sem se estar presente para os apreciar".
40% dos pais desconhece mesmo o termo, que se generalizou nos jovens, principalmente entre aqueles com uma vida menos positiva e assim justificando o estarem sempre conectados. Desta forma, eles "experienciam um fluxo praticamente interminável das experiências dos outros".
O círculo vicioso do FoMO parte exactamente desta premissa: para ver o que os outros estão a viver, é preciso estar ligado às redes sociais. Em resultado disso, os jovens acabam com sinais de ansiedade e sentimentos de inadequação.
O relatório não apresenta apenas pontos negativos sobre o uso das redes sociais pelos jovens. Por exemplo, nota que em questões de saúde mental, a partilha de experiências com pessoas da mesma idade pode ter efeitos benéficos "para a sua própria realidade". No mesmo sentido, a comunidade médica pode adoptar estratégias para se integrar nos "espaços interactivos" que os jovens frequentam, até para desmentir informação pouco credível ou incorrecta e providenciar aconselhamento útil.
Noutro patamar, esta interacção facilita a conversação com jovens com problemas, "particularmente quando eles podem não ter acesso a apoio presencial". Neste caso, o Facebook é tido como a rede social onde recebem um maior "apoio emocional" da sua comunidade de amigos ou de grupos. Estes "podem ser minorias no mundo real mas podem desenvolver comunidades online que asseguram uma rede segura para os jovens", sem problemas com a distância geográfica e numa relação muitas vezes interpessoal (o que obriga igualmente a ter atenção para prevenir abusos de "cyberbullying" ou outros assédios).
Os dados do inquérito a 1.479 jovens apontou, relativamente às cinco redes sociais analisadas, que o pior efeito para os jovens ocorre ao nível do sono - só no Snapchat o FoMO o ultrapassa, embora por pouco.
O segundo pior impacto no YouTube foi também o FoMO, enquanto no Twitter se seguiu a ansiedade e a auto-estima. No Facebook, o FoMO foi também classificado como segundo problema, seguindo-se o "bullying". Por fim, no Instagram, é a auto-estima e o FoMO que lideram.
Os truques das redes sociais
O relatório "#StatusOfMind" mostra alguns dos problemas (e potencialidades) do uso das redes sociais pelos jovens, mas outros trabalhos ajudam a perceber como estas redes funcionam e por que os jovens devem ser acompanhados ou educados na sua utilização.
Um recente artigo na Vice explica como as redes sociais usam "truques manipuladores", nalguns casos imitando os dos casinos.
Por exemplo, recuando à introdução do botão "Like" no Facebook, em Fevereiro de 2009, ele dinamizou consequências então inimagináveis. Um dos seus criadores afirma mesmo que "teve demasiado sucesso". Em 2010, a Google instalou uma opção semelhante no YouTube, assim como o Instagram. O Twitter colocou o seu coração de "gosto" em 2015.
A explicação é simples: os utilizadores partilham coisas para que outros gostem deles. E é esta tendência que permite às redes sociais terem lucros, baseadas na "economia da atenção": "quanto mais atenção uma plataforma tiver, mais eficaz será o seu espaço publicitário, permitindo cobrar mais aos anunciantes", diz o artigo.
Esta atenção "é finita", nomeadamente pela necessidade de sono ou do trabalho, mas o que as redes sociais descobriram é que existe igualmente uma necessidade de "feedback" social que gera uma "explosão de felicidade tão curta que é viciante, levando-nos a voltar mais" e a ver mais "posts" no Facebook, por exemplo.
"Não acho que as empresas de media social estejam a tentar criar plataformas 'viciantes', por si. Mas como todas estão a competir pelo nosso (limitado) tempo e atenção, elas concentraram-se sempre em possibilitar uma experiência mais cativante", refere Adam Alter, autor de "Irresistible: The Rise of Addictive Technology and the Business of Keeping Us Hooked".
Tristan Harris, ex-Google, criou o site Time Well Spent onde explica como este tipo de empresas vive numa corrida pela atenção: o YouTube re-inicializa vídeos para não se sair dali, enquanto o Instagram "mostra novos gostos de cada vez, pelo que se continua a aceder". Já "o Facebook mostra tudo o que nos mantenha ligado no ecrã, seja verdade ou não", "os media noticiosos transformam tudo em notícias de última hora e o Snapchat transforma as conversas em fluxos que não se querem perder".
Para Harris, estas "recompensas variáveis intermitentes" são como as "slot machines" num casino: puxa-se a alavanca para saber se há um prémio. Nas redes sociais, continua-se no mesmo modelo, à procura de algo que dê satisfação.
Mas há outros truques. Quando se acede ao Instagram ou ao Twitter, a demora de poucos segundos para actualizar a "timeline" visa igualmente levar o utilizador a poder "saborear" a "recompensa" de ler ou ver as mensagens. São três segundos em que se antecipa o futuro.
No Facebook, a "reciprocidade social" gera que alguém simpático para um utilizador possa ter deste uma resposta semelhante, e igualmente simpática. Isto é fomentado pelos alertas de que alguém gostou ou comentou um "post".
Estes mecanismos têm impactos reais: segundo o Facebook, um utilizador jovem acede a qualquer dos seus dispositivos electrónicos de interacção social 157 vezes por dia - o equivalente a 145 minutos diários. Quase duas horas e meia de vida que não se viveu na "real life".
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