“Gostava que as pessoas levassem um pequeno murro no estômago, porque dizer que [a peça] é uma comédia é redutor. Ela talvez fosse assim uma tragédia cómica ou uma comédia trágica, porque é, certamente, negra”, disse Diogo Infante, numa entrevista à agência Lusa.
Porque o lado da violência na natureza humana é algo que os entristece e que faz parte de nós, desde os primórdios, sublinhou.
Escrita pela dramaturga francesa de ascendência iraniana, autora de "Felizes os felizes" e "Uma desolação", “O Deus da carnificina” brinca, “de forma inteligente”, com o lado mais negro do ser humano, aquele que, de alguma forma, todos tentamos disfarçar, acrescentou Diogo Infante.
“O politicamente correto, as máscaras que utilizamos no ato social, tentamos projetar uma coisa que depois na verdade não somos e o que acontece ao longo desta hora e 20 [minutos], que dura o espetáculo, é que vamos assistindo ao cair das máscaras, dos filtros, daquilo que nos torna, às vezes, seres menos genuínos”, frisou.
A ação da peça centra-se numa disputa física entre dois miúdos de 11 anos e, como se sabe, quando se trata de defender os seus pequenos, os pais conseguem chegar a extremos, acrescenta Diogo Infante, sublinhando que, desde que é pai, conhece melhor essa realidade.
“Por vezes sinto-me embaraçado ao pensar era capaz de dizer ou fazer isto”, ressalvou, adiantando que, apesar de haver discursos conotados com determinados perfis mais ou menos identificáveis em termos de comportamento social, e de todos pensarem que não são assim, “lá bem no fundo, muitos de nós seríamos capazes de agir assim”.
O que Diogo Infante promete para esta peça – que já estava gizada por Inês de Medeiros, que o antecedeu na direção artística do teatro, e na qual contracena com Jorge Mourato, Patrícia Tavares e Rita Salema – “é uma noite muito bem passada”, garantiu.
Contudo, a peça não é de riso fácil. É, sobretudo, de "riso de desconforto", enfatizou.
Diogo Infante mostrou-se muito entusiasmado por regressar ao Trindade, onde se estreou como encenador (com “O amante”, de Harold Pinter, em 1992), pelo que este voltar à sala do Chiado, em Lisboa, é algo que o deixa “muito enternecido e honrado”.
“Tudo farei para dar o melhor de mim. Procurarei pôr também ao dispor deste projeto as minhas valências de ator e de encenador sempre que forem necessárias”, disse, a propósito do cargo de direção artística do Teatro da Trindade, que assumiu esta temporada.
Diogo Infante acaba também de se estrear como realizador de uma curta-metragem, que diz contar com interpretações dos “mais notáveis” atores deste país.
“Foi uma estreia muito auspiciosa e não poderia ter desejado melhor. É algo que sempre quis fazer e que quero continuar a fazer”, referiu, acrescentando ter outros projetos em carteira, e que vai tentar viabilizá-los.
“Para já, trata-se de ultimar esta curta-metragem, de a acabar e, depois, de a partilhar”, observou.
A curta-metragem tem o apoio da RTP, mas Diogo Infante conta apresentá-la no circuito de festivais de cinema e numa sala de Lisboa, sublinhando, porém, que isso não depende de si.
Foi uma experiência muito especial, acrescentou.
A curta-metragem intitula-se “Olga Drummond”, é uma história ficcionada e trata-se de uma homenagem aos atores mais velhos. Passa-se numa espécie de casa de artistas, numa casa de atores reformados.
Protagonizada por Eunice Muñoz, a obra começa com a chegada de Olga Drummond a essa casa, o que vai provocar uma grande comoção nos residentes e funcionários, já que é através das suas memórias que se percebe "a importância que esta mulher teve nas suas vidas e no teatro em geral", explicou Diogo Infante.
O filme tem 20 minutos e foi uma oportunidade de trabalhar com atores como Eunice Muñoz, Ruy de Carvalho, Lurdes Norberto, Cecília Guimarães, Manuela Maria, Manuela Couto, Isabel Abreu, Rita Salema, Patrícia Tavares. "A própria Lídia Muñoz, neta da Eunice, também participou numa cena absolutamente deliciosa com a avó", acrescentou.
“Foi uma estreia que muito me orgulha e pronto… agora quero mais”, indicou.
Com tradução, versão e encenação de Diogo Infante, “O deus da carnificina” tem cenografia e adereços de Catarina Amaro e desenho de luz de Tânia Neto.
O espaço sonoro é de Rui Rebelo e a peça, que se estreia a 01 de março, vai estar em cena até 29 de abril, com espetáculos de quarta-feira a sábado, às 21:30, e aos domingos, às 18:00.
No dia 15 de abril haverá uma conversa com o público sobre a peça.
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