Foi com grandes filmes como Dark Knight Rises e Inception que Christopher Nolan conquistou o público mundial, sendo considerado por muitos um dos melhores realizadores da atualidade. Depois de experimentar filmes de ação com a saga “The Dark Knight”, thrillers como em “Memento” e “The Prestige” ou ainda épicos de ficção científica com “Interestelar” e “Inception”, a nova aposta do realizador é Dunkirk, um histórico de guerra.
Dunkirk decorre na segunda guerra mundial, nas praias da costa norte de França, numa altura em que franceses e ingleses se aliam para impedir que o exército alemão ultrapasse o último reduto da Europa continental e invada a Grã-Bretanha. O episódio central desta batalha na praia de Dunkirk não é a luta em si, mas o salvamento das tropas aliadas que estavam a ser fortemente atacadas pelo inimigo. O filme não se centra numa cena de guerra explícita, como na maioria dos filmes, mas sim no que acontece para lá da verdadeira linha de combate, onde soldados ingleses e franceses se encontram encurralados entre o avanço dos alemães em França e o regresso, de uma parte substancial, a Inglaterra que se preparava para uma possível invasão nazi.
É aqui que se inicia o processo que faz deste filme único e muito diferente dos filmes de guerra a que estamos habituados. Nolan, ao que consta, decidiu utilizar esta história para relatar a verdadeira luta pela sobrevivência que os soldados enfrentam no dia-a-dia de uma guerra. Assim, em vez do clássico heroísmo e da destreza militar dos clássicos soldados ilustrados por Hollywood, assistimos, no seu ponto de vista, aos esforços incansáveis, aos engenhos, aos medos e ao desespero que estes sentem na pele. Terá sido também por isso que o realizador optou pela ausência de uma personagem principal - outro fator diferenciador - e pela colocação de várias personagens em pé de igualdade de protagonismo na narrativa ou narrativas. Temos um piloto da força aérea (desempenhado por um ator de eleição do realizador, Tom Hardy), um capitão de um barco familiar que participa no resgate de salvamento às tropas (Mark Rylance), um comandante da marinha (Kenneth Branagh), um soldado da marinha (desempenhado por outro grande parceiro de Nolan, Cillian Murphy) e ainda meia dúzia de soldados do exército, onde Harry Styles (vocalista dos One Direction) desempenha um surpreendente papel. Estamos habituados a ter uma personagem principal que nos guie ao longo da narrativa, mas em Dunkirk a grande maioria destas personagens permanece no anonimato durante todo o filme, sem nome e sem história, o que é pouco habitual, estranho até, e nos coloca fora da zona de conforto enquanto espectadores. É deliberado e tem o propósito de criar um herói coletivo deste episódio, que são os soldados das tropas aliadas que lutam pela sobrevivência.
Relacionado com este estilo de realização está o argumento, escasso em diálogos, que chega a ficar vários minutos sem uma única palavra. Felizmente a clássica banda sonora de Hans Zimmer acompanha o filme de forma inquietante, como um relógio-bomba, e quando ilustra imagens dos aviões, da água, da praia e do fogo, traz toda a emoção que falta ao diálogo. O irrepreensível trabalho de Hans Zimmer merece uma nota à parte em Dunkirk não pela resultado mas pela intensidade: a música não descansa nem por um segundo e não dá espaço ao silêncio que em alguns momentos fazia falta. Como consequência, há uns crescendos de suspense durante o filme que acabam por resultar em nada de relevante e a banda sonora fica desajustada do que se está a passar na ação. O resultado final é bastante cru, apenas se notam as emoções dos atores e toda a narrativa é percebida de forma indireta pelos espectadores através de suposições e de deduções.
Outro elemento que diferencia o filme dos restantes são as imagens em grandes planos dos navios e da praia, alternadas com outras mais próximas das personagens, com muita sincronização. Não seria exagero dizer que a edição é a componente mais forte do filme, pelo notável trabalho que Lee Smith (e o realizador) desempenhou em jogar com a perspectiva do tempo. Logo no início do filme são nos apresentados três espaços onde decorre a ação, em três tempos diferentes: No cais a ação dura uma semana, no mar um dia e no ar uma hora. As imagens destas três situações vão sendo misturadas como se fossem simultâneas, ainda que sejam em espaços temporais totalmente distintos, veiculando a ideia de que o tempo passa a diferentes velocidades nas diferentes situações. Por fim, as três histórias juntam-se estando entrelaçadas em mais que uma ocasião. Esta estrutura irregular, muito típica dos filmes de Nolan, está bem conseguida em Dunkirk.
Dunkirk é, acima de tudo, interessante. Não apenas pelo seu tema original e por certamente fazer muitos espectadores revisitar a história da 2ª Guerra Mundial, mas também pelo caráter diferenciador e arrojado de construir uma narrativa sem personagem principal, poucos diálogos e uma estrutura fora do normal. Há vários críticos de cinema que consideram que este é o melhor trabalho do realizador, pelo tema, pela qualidade técnica e por ser tão arrojado para um blockbuster de tamanho orçamento. Será tudo verdade mas não deixa de fazer falta alguma emoção ou sensações mais fortes, como é habitual nos filmes de Nolan.
Comentários