“As marionetas falam comigo e eu falo com elas. Não consigo fazer uma única voz se não tiver uma marioneta calçada”, diz à agência Lusa o marionetista, de 61 anos, diretor da companhia Maurioneta, de Reguengos de Monsaraz (Évora).
A propósito do Dia Mundial da Marioneta, que se comemora esta terça-feira, Maurício conta que tem uma relação especial com os seus “bonecos”, que o transportam para o mundo da fantasia.
“Há uma certa cumplicidade. Elas falam umas para as outras, eu esqueço-me completamente que sou eu que lá estou. Portanto, é uma cumplicidade, uma amizade, um amor que se tem por elas, é como se fosse um filho”, afirma.
Ao longo dos quase 30 anos como marionetista, o antigo professor do 1.º ciclo, reformado, já colecionou mais de 100 exemplares, que estão agora expostos na vila medieval de Monsaraz, no concelho de Reguengos de Monsaraz.
A coleção pode ser visitada na Igreja de Santiago, até ao final deste mês, e convida a apreciar marionetas que Maurício faz para os próprios espetáculos e outras de 10 países espalhados pelo mundo, que adquiriu diretamente ou através de amigos.
Além de títeres tradicionais de Portugal, como robertos e bonecos de Santo Aleixo, a sua “família” inclui marionetas da Indonésia, Myanmar (antiga Birmânia), Índia, Polónia, França, Inglaterra, México, República Checa e Argentina.
“Tenho de variadíssimos locais, dos mais representativos em termos de marionetas”, afiança, sem dar a coleção por terminada porque ainda quer exemplares de “outros países de referência, como a Turquia”.
Feitos em diferentes materiais, como madeira ou couro, os “bonecos” são manipulados de diversas formas, consoante o país. Maurício Rebocho tem de fios, de varão, de luva e, os mais raros, de sombras, provenientes da ilha indonésia de Java.
“As marionetas mais raras são as da Indonésia, se bem que as da Birmânia também [são]. Para arranjar a primeira da Indonésia, andei mais de 20 anos à procura”, relata, realçando que os títeres desse país, tais como os da antiga Birmânia, são “muito caros”.
Recordando que as marionetas “nasceram” para “contar histórias” e “ passar mensagens”, apesar do clima de brincadeira, Maurício considera os “bonecos” desempenham um importante papel, muitas vezes desprezado.
“Hoje utiliza-se depreciativamente o termo ‘fantoche’ ou ‘fantochada’, como sendo uma coisa qualquer. Mas não era uma coisa qualquer, era a única forma que se tinha de dizer verdades”, argumenta.
Atualmente, há também “muita gente que se substitui ao marionetista e pensa que está a fazer bem”, mas trata-se de uma arte que requer “muitos anos de aprendizagem e de ensaio”, não bastando “colocar-se detrás de um pórtico e contar uma história e mexer um ‘boneco’”.
“É mais do que isso, é dar-lhes vida e dar-lhes vida é fazer crer ao espetador que aquilo é um ‘bonequinho’ real”, assegura.
Sem conseguir explicar a “magia” que o mundo das marionetas encerra, Maurício diz que esta “surge como se viesse do nada e cresce”, como uma “bola de neve”.
“E a seguir não nos conseguimos desligar”, acrescenta, frisando que os “bonecos” permitem sonhar: “Quando colocamos uma marioneta, e se quisermos interiorizar um personagem, voamos até ao inimaginável”.
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