É uma mulher que marca pela beleza (ou não fosse Mia modelo profissional de fatos de banho), mas não só. Aos 28 anos, e ao contrário do que o seu físico possa sugerir, teve de confrontar vários demónios pessoais. Em 2016, acabou por vencer uma votação de um concurso da Swim Sports Illustrated. Porém, parece que a sua vocação está... no Muay Thai. E tem uma história semelhante à do ator britânico Idris Elba que, aos 44 anos, decidiu treinar para um combate profissional de KickBoxing.
Filha de mãe sul-coreana e pai britânico, nasceu e foi criada em Hong Kong. Tem passaporte suíço e vive em Nova Iorque. É modelo, mas também é mestre em Finanças e Legislação Financeira pela Universidade de Londres. Por tudo isto, considera ser uma cidadã do mundo.
À primeira vista, parece aglomerar tudo aquilo que se idealiza num mundo cosmopolita: beleza, estabilidade profissional e a viver numa das cidades mais excitantes do mundo. No entanto, a realidade dita algo bem diferente. Numa entrevista ao programa MMA Hour, conduzido por Ariel Helwani, jornalista do site MMA Fighting, confidenciou que a pressão do mundo da moda chegava a ser intolerável. Especialmente porque tinha de corresponder a certas expectativas dos empregadores, corresponder a uma imagem específica. E, isso, confessa, estava a drená-la completamente a nível emocional.
"Tenho sido julgada pela minha aparência dia sim, dia não, desde que tenho 13 anos. Passei por todo o tipo de distúrbio alimentar e dismorfia no planeta que possas imaginar. Anorexia, bulimia, adição a diuréticos, laxantes. Total dismorfia (alteração, deformidade) corporal. Olhava para o espelho e via uma pessoa gorda ao espelho”, explicou no programa.
“Cresci obesa, com excesso de peso e fui vítima de bullying. Vivi em ambos extremos: fui tamanho 14, fui tamanho 0. E dia sim, dia não, sentia-me culpada sempre que comia qualquer coisa. E ser criticada por cada centímetro do teu corpo, simplesmente fartei-me.”
Mia começou a treinar Muay Thai (uma arte marcial onde os lutadores, de pé, combinam e desferem entre si movimentos de punhos, cotovelos, joelhos e canela num ringue) depois de ver alguns rapazes a executar alguns exercícios enquanto viajava de carro pela Tailândia, para onde foi em retiro espiritual. E, ao dar por si, parou e perguntou se podia treinar com eles. Mas, quando regressou a Nova Iorque, debaixo de todo o aparato do mundo da moda, sentiu necessidade de fugir e de voltar a treinar, pois queria lutar. Então, largou tudo e regressou à Tailândia, desta vez por nove meses.
“Só queria ir para Tailândia e estar ao sol. [Praticar] Muay Thai, viver num campo de treino [numa espécie de estágio, onde os atletas treinam, dormem e se dedicam em exclusivo à modalidade]. Passar por tudo isso ensinou-me a respeitar o meu corpo. (...) Até as coisas mais simples como comer três refeições por dia — aprender a fazer isso... descobri ter força no corpo que desconhecia. Vi coisas no meu corpo, cheguei a ter abdominais definidos — que nunca pensei vir a ter na minha vida. Deu-me autoestima e ajudou-me a livrar-me de muitas inseguranças que me inquietaram durante toda a minha vida.”
Mas Mia quis ir mais longe. Treinar por si só não era suficiente. No início deste mês, decidiu lutar profissionalmente pela primeira vez. Não se trata apenas de elevar o patamar, mas de aumentar exponencialmente o grau de dificuldade de um enorme desafio que se impôs a ela própria — aprender uma arte marcial física e emocionalmente exigente. Ao fazer esta opção foi obrigada a fazer uma dieta rigorosa, atingir o peso de uma determinada categoria, fazer treinos por vezes bidiários, enfrentar dores e mazelas inerentes à pratica do desporto, e viver uma exigência física bastante dura. Tudo isto, enquanto se aprende uma nova disciplina.
Acabou por ganhar o combate no terceiro assalto por nocaute técnico (ou TKO, que acontece quando o árbitro decide que um lutador não tem condições para continuar a lutar sem comprometer a sua integridade física [no sentido de não ser fatal], terminando de imediato o combate). Ao MMA Fighting, Mia esclareceu que um dos seus primeiros pensamentos, após o desfecho do combate, foi de que tinha que fazer aquilo novamente. E que, muito provavelmente, fará a transição para as Artes Marciais Mistas.
No entanto, não será para já. Por agora quer fazer mais umas lutas de Muay Thai (a sua estreia nos Estados Unidos deve acontecer algures em julho) e ir aprendo outras disciplinas antes pisar pela primeira vez no octógono. Para essa finalidade, já contratou inclusivamente o manager de Jon Jones (um dos nomes maiores do MMA e que nunca perdeu nenhum combate — o cinturão foi-lhe retirado e não “perdido”) ou de Tyron Woondley, assim como ja se encontra a trabalhar com outros treinadores altamente credenciados em disciplinas consideradas essenciais para a modalidade, tais como o boxe, wrestling ou jiu-jitsu brasileiro (arte marcial de submissão que é disputada no chão).
“Entretanto, tenho estando a aprender alguns princípios de wrestling, algum jiu-jitsu… Mas, não vamos esquecer: isto é divertido para mim. Isto é aquilo que eu quero fazer. Apaixonei-me verdadeiramente pelas artes marciais e desejava ter começado mais cedo e pretendo ver o que há mais por aí”.
Por agora, terminada a primeira experiência no mundo do desporto de combate, Mia voltou a Nova Iorque e ao mundo da moda. Apesar da pressão, sente que tudo está a ser canalizado para o Muay Thai. Mais: a Sports Illustrated está a realizar um documentário que visa acompanhar todo este processo. Porque agora, diz, já não está para fazer os mesmos sacrifícios que não beneficiam em nada a sua saúde. Não quer voltar a passar fome, ficar magra demais, nem sentir-se insegura relativamente à sua figura. Outra vez. “Encontrei saúde, confiança e felicidade através deste desporto”, revelou.
“Eu fui aquela rapariga de 14 anos que folheava as revistas e pensava: ‘Porque é que não sou assim? Porque não sou tão magrinha?’ Não. Alguma coisa precisa de mudar. A sério, o Muay Thai fez mais por mim do que as pessoas pensam. As pessoas olham para mim e pensam que é apenas outra modelo a posar as luvas. Mas eu sou toda por aquela vida”.
A transição para o MMA deve levar algum tempo — pelo menos, assim confessou a Ariel Helwan. Mia explica que “não vai tentar precipitar nada” e que vai levar o andar ao seu “próprio ritmo”, fazendo apenas aquilo que a fizer sentir-se confortável.
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