Desde o lançamento de “The Resistance”, de 2009, que os Muse se tornaram sobretudo uma banda política; se dantes havia, nos seus álbuns, espaço para um pouco de tudo (canções de amor, de ódio, odes épico-espaciais sobre caubóis, sobre os últimos pensamentos de um ateu ou sobre o “efeito borboleta”), é com esta obra que a banda britânica se tornou bastante mais ativista que o que tinha sido até então, debitando palavras de guerra contra a ordem instituída e fazendo com que os seus fãs pensassem, por breves instantes que fosse, se não estaremos de facto a ser todos enganados por quem nos governa.
A crise financeira de 2008 contribuiu, em parte, para essa segunda vida dos Muse; uma crise financeira à que se seguiu o colapso da Grécia, as revoluções árabes, a guerra civil Síria, a migração de milhões e a tomada do poder por agentes populistas e de extrema-direita. Tudo isto fez com que o trio achasse que não deveria estar calado perante o que se passa no mundo. Tudo isto, e mais, foi o mote para uma revolução muito própria dos Muse. Isso mesmo nos explicou o baterista Dominic Howard, numa curta conversa um par de horas antes do seu espetáculo no Rock in Rio Lisboa.
"Talvez não tenha havido, ainda, uma revolução global”
Os Muse têm gritado, mas a verdade é que a revolução parece ainda não ter tomado forma. Dominic, que nas redes sociais chegou a ser comparado por alguns ao “nosso” Fábio Coentrão, discorda: “Acho que as pessoas se têm revoltado”, diz. “Protestam em relação àquilo que querem, àquilo em que acreditam, àquilo por que lutam. Talvez não tenha havido, ainda, uma revolução global”. Uma revolução que poderia partir de 'Uprising', um dos maiores êxitos da banda pós-2006 e que foi o mote da pergunta feita a Dominic. “Essa canção foi, certamente, influenciada pelo que se passou em Londres, na Grécia, em 2008, 2009”, em plena crise financeira.
Mas voltemos atrás; como é que os Muse encontram um equilíbrio entre canções mais românticas e sensuais, como por exemplo 'Supermassive Black Hole', e temas in your face como 'Uprising'? Como incorpora a banda todas essas facetas no seu espetáculo ao vivo? “Quando estás em palco e tocas as tuas canções, sentes que todas elas diferem entre si”, comenta. “Quando dás um concerto, creio que o contexto de cada canção é diferente daquele de um álbum... Tocas canções de discos diferentes, de alturas diferentes, de sentimentos diferentes”. O baterista não nos sabe dizer, no entanto, como lida com esse equilíbrio ou com a falta dele: “limito-me a tocar”, apenas e só. “Desfruto de canções diferentes de formas diferentes”.
Canções essas que podem até ter algum sentido de humor na génese da sua criação – como a novíssima 'Thought Contagion', editada em fevereiro deste ano. À BBC, a banda explicou que o tema foi influenciado, entre outras coisas, por memes da Internet... Tendo o baterista revelado qual o seu favorito. Spoiler: envolve uma cena de “Planeta dos Macacos” e uma frase retirada do contexto, e está disponível no Instagram de Dominic. “Um amigo mandou-me isto no outro dia e eu ri-me como o caraças”...
Na sua última passagem por Portugal, que teve lugar na (então) MEO Arena, os Muse trouxeram consigo um vasto arraial cénico, de onde se destacavam os drones que sobrevoavam a cabeça dos muitos presentes nessa sala. No Rock in Rio, esses mesmos drones foram colocados de lado, mas o espetáculo ao vivo da banda britânica continua conhecido pela sua grandeza. Algo que poderá, no futuro, mudar para uma coisa mais crua e mais focada nos próprios elementos da banda, diz-nos o baterista.
“Por acaso estivemos a falar sobre isso na viagem de avião para cá [Lisboa]. Temos uma espécie de plano para a próxima digressão; queremos tentar fazer algo diferente, que nunca tenhamos feito antes. Os drones eram um elemento mais teatral, e tínhamos outros elementos que eram difíceis de incorporar em muitas das salas [por onde passámos]. Sempre quisemos fazer algo que fosse como uma outra performance, em palco, ter outras pessoas... Não uma performance musical, mas algo talvez mais teatral. Já o fizemos noutras digressões, de estádio, com acrobatas, uma lâmpada gigante, um disco voador, coisas assim. Gostávamos de levar isso mais além”.
"Temos uma espécie de plano para a próxima digressão; queremos tentar fazer algo diferente, que nunca tenhamos feito antes."
Mas, ressalva, “isto pode parecer uma resposta contraditória: ao mesmo tempo, falámos de como seria bom não ter, necessariamente, todas essas coisas, e fazer com que o enfoque nos concertos fosse a música. Um bocado mais cru, mas ainda em grande escala, épico, que não tivesse outras merdas para onde as pessoas pudessem olhar para além de nós”, brinca. “Ainda estamos a trabalhar nisso, ainda não decidimos o que iremos fazer. Mas continuará a ser um grande espetáculo rock... Vai é [possivelmente] passar a ter-nos a nós em destaque”.
Essa digressão – e esse novo espetáculo cénico – poderá estar mais próximo daquilo que se pensa já que, confidencia-nos Dominic, o novo álbum da banda (sucessor de “Drones”, de 2015) sairá já este ano. “Provavelmente sairá no final do ano”, explica. A tempo de os fãs os comprarem como prenda de Natal para família ou amigos? “Sim... Se alguém ainda pagar por música”, atira. “Eu já não o faço, ninguém o faz. Mas poderão enviar o link do Spotify aos amigos... [O álbum] Já está praticamente acabado, só temos que lhe dar alguns retoques, iremos tratar disso no mês que vem”. Prometida está, também, nova passagem por Portugal: “de certeza que voltaremos cá para o ano. Talvez em nome próprio, por altura do verão”. Cá os esperamos.
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