“Temos de estar vigilantes sobre o que pode acontecer, mas não nos podemos deixar pressionar por essa ameaça de perder a liberdade”, disse o criador à agência Lusa antes da estreia de “Há qualquer coisa prestes a acontecer”.

A nova coreografia parte de um verso do tema “Inquietação” do cantautor José Mário Branco, e estreia-se no Teatro Aveirense para refletir sobre as ameaças à liberdade.

Criada a convite do Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, no âmbito das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril, a peça lançou Victor Hugo Pontes num processo de trabalho com os intérpretes que começou por ser pessimista, “devido aos atuais ventos adversos” à liberdade.

“Nós temos esses valores [da liberdade] e não vamos deixar que se percam. É muito importante para mim que esta peça seja um lugar feliz, e não uma ideia de opressão ou pessimismo. Vamos celebrar o que temos, e não anteceder o que de mau virá aí”, apelou.

Com estreia marcada para o Teatro Aveirense, no âmbito da programação da Capital Portuguesa da Cultura 2024, a peça irá ser apresentada no CCB a 13 e 14 de dezembro.

Depois de se deparar com os versos de José Mário Branco, Victor Hugo Pontes achou que a frase poderia ser “um bom ponto de partida numa fase em que se vive uma espécie de ameaça de que os tempos podem mudar”.

“A situação política está a mudar no nosso país e no mundo. Quando comemoramos 50 anos de liberdade, há muita coisa que começa a ser posta em causa, direitos adquiridos que começam a ser questionados”, alertou o artista.

Criador multifacetado, 44 anos, nascido em Guimarães e diretor da estrutura Nome Próprio, com sede no Porto, leva duas décadas de percurso artístico como ator, coreógrafo, encenador, cenógrafo, figurinista, curador, formador e professor.

“Apesar de soprarem ventos adversos devemos continuar a celebrar a liberdade”, defendeu Victor Hugo Pontes, sublinhando que o seu novo trabalho “é, acima de tudo, uma peça sobre libertação que acontece em contexto de liberdade, e que não seria possível fazer num outro contexto”.

Os corpos nus de bailarinos em palco são a força motriz do espetáculo que tem o corpo como elemento central, e com 19 intérpretes a experimentar profundamente a própria fisicalidade e a do grupo.

“O coletivo é, ao mesmo tempo, plural e individual, e funciona como massa, como dança e combate, mas sem cada um deles perder a sua individualidade”, disse sobre “Há qualquer coisa prestes a acontecer”.

“Quando começo a criação por estes corpos nus é para tirar todas as camadas, e pensar que podem ser qualquer pessoa. Não há nenhum adereço que me indique qual o estatuto social, a classe social, que pessoa é, porque todos somos corpos feitos de carne, ossos, cabelos”, apontou o criador.

A nudez integral percorre todo o espetáculo e é como um “grito libertador”, em corpos “que se comportam de forma mesmo muito livre na forma como se expressam a maior parte da peça”.

“Não existe uma narrativa, mas uma dramaturgia com vários momentos, e acima de tudo existe uma ideia de comunidade que habita a cena, com todos a partilhar os mesmos princípios e dos mesmos valores”, salientou ainda o artista que, como intérprete, trabalhou com diversos encenadores e coreógrafos entre os quais Nuno Carinhas, Lygia Pape, Clara Andermatt, David Lescot e Joana Craveiro.

"Três Pancadas": a nova Newsletter com tudo sobre teatro inclusive bilhetes para espetáculos

A Newsletter "Três Pancadas" irá trazer todas as novidades do mundo do teatro, nomeadamente reportagens, crónicas e entrevistas, bem como a agenda dos próximos acontecimentos no mundo do espetáculo. Todos os meses abrirá a cortina para os palcos e as três pancadas de Molière dão início às leituras para que não se perca pitada das artes de palco.

Para subscrever basta colocar o e-mail neste formulário abaixo ou neste link.

Para Victor Hugo Pontes, a liberdade de pensamento e de expressão é essencial a todos, “com respeito pelo próximo”, e também muito importante para os artistas “conseguir criar num contexto de liberdade sem censuras ou cancelamentos”.

Com direção artística de Victor Hugo Pontes, o espetáculo tem cenografia de F. Ribeiro, música de João Carlos Pinto e direção técnica e desenho de luz de Wilma Moutinho.

A interpretação é de Abel Rojo, Alejandro Fuster, Ana de Oliveira e Silva, Ángela Diaz Quintela, Daniela Cruz, Dinis Duarte, Esmée Aude Capsie, Fabri Gomez, Guilherme Leal, Inês Fertuzinhos, João Cardoso, José Jalane, Liliana Oliveira, Rémi Bourchany, Rita Alves, Tiago Barreiros, Valter Fernandes, Joana Couto e Tomás Fernandes.

Os bilhetes já estão à venda e podem ser adquiridos aqui por 7.50 euros.