"A minha resposta ao que me pergunta" e "O característico distintivo", os textos inéditos agora recolhidos em livro, encontram-se na segunda parte desta edição, entre os 19 "trechos vários e fragmentos".
A primeira parte inclui "artigos e entrevistas", entre os quais "Portugal, vasto império - um inquérito nacional", "O Provincianismo português" e "Entrevista sobre arte e literatura".
"Se fosse preciso usar de uma só palavra para com ela definir o estado presente da mentalidade portuguesa, a palavra seria provincianismo (...). O amor às grandes cidades, às novas modas, às últimas novidades, é o característico distintivo do provinciano".
O livro tem edição de Richard Zemith e Fernando Cabral Martins, que, no prefácio, recordam como Fernando Pessoa (1888-1935), ao longo da vida, voltou várias vezes ao "caso mental português", publicando artigos e dando entrevistas, culminando, em 1928, na publicação de "O Provincianismo Português", a que se seguiu a edição, em 1932, de "O Caso Mental Português", na revista "Fama".
Pessoa partiu da tomada de consciência, no século XIX, por Antero do Quental e Eça de Queirós, do que estes autores consideraram a marginalidade e decadência de Portugal.
Afirmam os editores desta edição, que "a linha que segue Pessoa pouco ou nada tem a ver com a reflexão moderna iniciada pela Geração de [18]70", da qual Eça e Antero fizeram parte.
Segundo os editores, que citam Eduardo Lourenço, "dá-se em Pessoa um processo de efetiva 'desprovincialização' do imaginário português", e é nele que "consiste a resolução da decadência".
Segundo Zemith e Cabral Martins, "a análise da psique portuguesa levada a cabo por Pessoa não se reduz a uma colocação sociológica ou cultural do problema", o provincianismo é "caracterizado pela confiança cega na inspiração e definido noutros textos pela 'vivacidade pobre' na emoção e, sobretudo, pelo 'espírito de imitação'".
Na crónica iniciada pela expressão "Das feições de alma que caracterizam o povo português", publicada n'O Jornal original, em abril de 1915, que faz parte desta edição, Fernando Pessoa escreveu: "Trabalhemos ao menos - nós, os novos - por perturbar as almas, por desorientar os espíritos. Cultivemos em nós próprios a desintegração mental como uma flor de preço. Construamos uma anarquia portuguesa, ‘escrupelizemos’ no doentio e no dissolvente. É a nossa missão a par de ser a mais civilizada e a mais moderna, será também a mais moral e a mais patriótica".
No mesmo texto Pessoa afirma: "Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando fizemos uma 'revolução' [republicana, em 1910] foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficámos miserandamente os mesmos disciplinados que éramos. Foi um gesto infantil de superfície e fingimento".
Para o poeta de "A Mensagem", "o português é Individualista por emoção e não pela vontade; doce, por ser mais emotivo do que apaixonado (como é o espanhol); indisciplinado perante as regras, disciplinado perante os chefes (...) e ei-lo, tal como é necessário conhecê-lo para o compreender politicamente".
Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, em 13 de junho de 1888, viveu os primeiros anos na colónia de Natal, na África do Sul, onde fez a escolaridade. Aos 17 anos escrevia, fluentemente, em três línguas.
Em vida apenas publicou uma pequena parte da sua vasta obra, redescoberta após a sua morte, em redor de uma arca que ainda hoje continua a revelar inéditos.
Em vida, além de textos e poemas dispersos publicou, no ano antes de morrer "Mensagem" .
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