Para o poeta, tradutor, professor, crítico e ensaísta Adolfo Casais Monteiro (1908-1972), um dos primeiros investigadores a ousar “a construção de um percurso reflexivo” sobre a obra pessoana, Fernando Pessoa é “um dos quatro maiores” da poesia portuguesa, ao lado de Luís de Camões, Teixeira de Pascoaes e Antero de Quental.
Na antologia “Poesia de Fernando Pessoa”, que organizou na década de 1950, uma das primeiras dedicadas ao poeta, e para a qual escreveu a introdução, Casais Monteiro afirma que “nem por sombras” pretende “‘explicar’ a poesia” do criador de Alberto Caeiro e Álvaro de Campos, referindo a sua obra como ”um produto de cultura, uma dessas obras cujas raízes vão buscar o mínimo de sangue que lhes é necessário a uma tradição literária”.
O “segredo” do poeta Pessoa “é que ele transforma, diga-se assim, em emoções os seus pensamentos”, “sensibilizou o cerebral, deu raízes de existência ao absoluto”, escreve o autor de “Canto da Nossa Agonia” sobre o criador de “Chuva Oblíqua”.
A antologia, publicada sob a chancela da Editorial Presença, conta mais de 30 poemas de Pessoa, incluindo dos seus heterónimos Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.
Casais Monteiro defende uma absoluta unidade na obra de Fernando Pessoa, mesmo tendo em conta os seus heterónimos.
“Tal unidade parece-me existir na poesia de Pessoa. Que a multiplicidade de planos não nos iluda: que importa quanto se contradigam os vários heterónimos, se ao fim nos resta uma impressão de totalidade?”, interroga-se Casais Monteiro.
Para o professor que a ditadura do Estado Novo afastou do ensino, Fernando Pessoa “resume em si todos os caminhos”, e se se apresenta em todas as suas contradições, “como um clássico e como moderno, se ora é um cético, se cabem nele um materialista, um espiritualista e um panteísta, nos deixa ao fim uma impressão de totalidade”.
“Sim, a poesia de Fernando Pessoa parte de um nódulo central; daqui, os seus tentáculos estendem-se ao longo de túneis que a ansiedade do Homem escava em todas as direções, toma mil formas segundo o ‘drama’ que encarna e salta por cima da maior ou menor vivacidade de quaisquer formas da experiência” humana, afirma Casais Monteiro.
A antologia inclui a transcrição da célebre carta de Pessoa sobre a génese dos heterónimos, o único testemunho global sobre a sua criação, que dirigiu ao próprio Casais Monteiro, e as “Notas para a Recordação do Meu Mestre Caeiro”, assinadas por Álvaro de Campos, heterónimo com o qual colaborou nos primeiros dois meses de 1931 na revista Presença, onde publicou também o poema “O Guardador de Rebanhos”, de Caeiro.
A Antologia inclui poemas como “O Menino de Sua Mãe”, “Marinha”, “Passos da Cruz”, “Chuva Oblíqua”, “Como a Noite é Longa!”, “O Andaime”, “Natal”, “Tabacaria”, “Gazetilha”, “Aniversário”, “Poema em Linha Reta”, num total de três dezenas de obras-chave de Pessoa.
Casais Monteiro “é um crítico literário dos mais importantes do século XX português, e também poeta relevante”, caracteriza o projeto Modern!smo – Arquivo Virtual da Geração de Orpheu, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, coordenado pelo professor e ensaísta Fernando Cabral Martins, responsável por diversas edições anotadas e comentadas de Fernando Pessoa, entre outros autores.
Adolfo Casais Monteiro, codiretor da revista Presença de 1931 a 1940, com os escritores João Gaspar Simões e José Régio, foi perseguido pela oposição à ditadura. Afastado compulsivamente do ensino, em 1936, exilou-se no Brasil, em 1954, onde morreu 18 anos mais tarde.
O Arquivo Virtual da Geração de Orpheu destaca “a incontornável associação do nome de Adolfo Casais Monteiro ao de Pessoa”, por “uma multiplicidade de fatores”, em particular o facto de Pessoa lhe ter dirigido “a famosa carta acerca da génese dos heterónimos”.
Para os investigadores deste projeto da Nova, Casais Monteiro tem um papel pioneiro na “construção de um percurso reflexivo” da obra pessoana, pelo número de estudos que lhe dedicou, inclusive no contexto do seu trabalho para a Universidade de São Paulo, destacando-se ainda a antologia que organizou, e que publicou no Rio de Janeiro, em 1957, com um ensaio de introdução e uma bibliografia do autor.
Antes, na década de 1940, apenas a editora Ática iniciara a publicação da poesia de Pessoa, com organização do crítico e ensaísta João Gaspar Simões e do editor Luiz de Montalvor, um dos sobreviventes da chamada Geração de Orpheu, a revista do Modernismo português.
Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, num prédio no largo de S. Carlos, no dia 13 de junho de 1888. Por ser dia de Santo António, tomou o nome de Fernando António Nogueira Pessoa.
Campo de Ourique foi o último bairro lisboeta onde morou, tendo residido com a família no primeiro piso de um prédio no n.º 16 da Rua Coelho da Rocha, depois de ter deambulado pela cidade, e alugado quartos na Estefânia e no Príncipe Real, entre outros bairros.
Pessoa é autor de obra vasta e plural, escrita em português e também em inglês.
O autor publicou poucos textos em vida, um deles foi “Mensagem” (1934), tendo a maior parte da sua obra sido publicada na segunda metade do século XX. Atualmente, continuam a surgir inéditos.
Numa nota biográfica que escreveu meses antes de morrer, em Lisboa, a 30 de novembro de 1935, Pessoa afirmou-se poeta e escritor “por vocação”.
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