O momento do dia seria certamente o concerto do britânico Ed Sheeran, de regresso ao festival no qual já tinha estado em 2014. Desta vez numa localização diferente, o rapaz ruivo lembrou o público em diferentes momentos das memórias que tinha do festival e da colina da Bela Vista.
Com uma nostalgia comum ao cabeça de cartaz, muitos festivaleiros entraram este domingo pelas portas do Parque Tejo, num dia que iniciou com a atuação do português Fernando Daniel.
O jovem de 28 anos que venceu a 4.ª edição do The Voice Portugal já encanta o público português há vários anos e reúne uma série de fãs que fizeram questão de encher o recinto para o ver.
O momento mais emocionante do primeiro concerto do Palco Mundo foi quando Fernando se juntou a Lukas Forchhammer, vocalista dos dinamarqueses Lukas Graham, que iriam atuar mais à frente, horas depois, no Palco Galp.
O português cantou assim com o líder da a banda do êxito ‘7 Years’ o tema em português 'Casa’ com a ajuda do telemóvel.
Fernando apelou ainda a quem não tinha vindo para o ver e agradeceu a quem lá estava por ele, que eram muitos: "Sei que muitos não cá estão por minha causa, mas também muitos estão cá por mim”, disse.
As multidões, as filas e as sombras (ou falta delas)
O programa do Palco Mundo seguiria com Jão, que tentou tudo para que os festivaleiros o ouvissem, mas as mais de 100 marcas presentes e os mais de 150 espaços do festival levaram o público para outro tipo de atrações.
Com o êxito mais conhecido, ‘Idiota’, o cantor não impressionou o público do Palco Mundo, que encheu outras zonas do festival sem sombras e àquela hora ainda com muito calor.
As filas foram uma religião e os festivaleiros fizeram tudo para receber os vários brindes oferecidos por marcas, empresas, bebidas e outros parceiros do festival. Eram dezenas de filas com centenas de pessoas em todos os cantos do evento.
Ainda no que diz respeito ao sol, Roberto, um festivaleiro de várias edições, salienta que não existe um único espaço com sombras no festival, uma afirmação parcialmente verdadeira se excluirmos a nova área ALL Experience, que se localiza no antigo espaço construído para acolher a visita do Papa Francisco, em 2023, e cujo custo da pala para a Câmara Municipal de Lisboa ultrapassou os 3 milhões de euros.
"Felizmente o festival é em junho. Seria impossível realizar alguma coisa neste espaço com este calor mais à frente no verão. Não existem espaços com sombras. Se não estivermos preparados para o sol e para o frio não se sobrevive a este festival", aponta.
Neste novo espaço ALL Experience, os festivaleiros podem, além de realizar uma experiência imersiva, responder a um questionário para ganhar uma pulseira do movimento ALL, com diferentes mensagens inclusivas de apoio a causas defendidas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis das Nações Unidas (ONU). Há ainda neste espaço, criado pelo arquiteto Diogo Campos, um mural pela paz e por um mundo melhor.
Do lado de fora há uma instalação de um Espelho Harmonioso, que pretende ser "um conceito que abraça a interconexão entre o indivíduo e o mundo ao seu redor, promovendo uma sociedade baseada na igualdade, paz, grandes sonhos e ação imediata". A obra é da autoria do Coletivo de jovens do Rock in Rio de Lisboa, do qual fazem parte Pedro Borges, Nicole Ferreira, Vitória Medina, Diogo Robledo, Gabriela Cunha, Catarina Alves, Mariana Leitão e Anna Luisa Marotti, entre outros.
Durante o dia, muitos festivaleiros recorreram a esta zona para descansar, comer e tirar fotos com o mural como pano de fundo, já que era um dos únicos espaços com sombra. Além disso, e a pensar na inclusão, este é também um espaço que não esquece quem não se identifica com o género masculino e feminino e dispõe, na parte exterior, de uma casa de banho mista, além de feminina e masculina. Alguns festivaleiros acusaram a organização de utilizar a pala do Papa Francisco nas Jornadas Mundiais da Juventude apenas para tapar os lavabos. Mas esses ficavam algo distantes da instalação e da ALL Experience, não sendo sequer apanhados pela sua sombra.
A surpresa de Carolina de Deus que encheu o Palco Galp e um Calum Scott comovido
Antes de Calum Scott atuar no Palco Mundo, os festivaleiros que desistiram das filas ainda tiveram a oportunidade de se surpreender com o espetáculo de Carolina de Deus no Palco Galp, às 19h00, que mesmo antes do cair da noite encantou uma multidão maior que o espaço em frente do palco.
Ao longo de praticamente uma hora de concerto, não faltaram as músicas mais conhecidas de Carolina, havendo ainda tempo para receber em palco Nena, e apresentarem o single que têm em conjunto. Já a cantora de 23 anos dominou o Palco Galp a cantar e dançar acompanhada de quatro incansáveis bailarinos e não deixou nada a desejar a outros palcos.
Às 20h00 em ponto foi a vez de Calum Scott tirar as atenções de Carolina e atrair a multidão, fazendo a maior parte deslocar-se em massa para o Palco Mundo.
Também inglês, de Beverley, foi a entrada perfeita para o que viria ainda nessa noite que começava a ser gelada. Com energia nova depois do concerto pouco convincente de Jão, o cantor e compositor revelado há 9 anos no concurso “Britain's Got Talent” fez tudo para conquistar os festivaleiros, e conseguiu.
Com músicas sempre muito emocionantes e sentimentais, o vibrante Scott conquistou as 80 mil pessoas presentes com quase todo o seu reportório. Cantou ainda êxitos de outros como ‘Stop Kissing Boys in the Street’, do escocês Greg Holden, e ‘This Love’, dos Maroon 5, onde aproveitou para recordar o tempo em que fez parte de uma banda de ‘covers’ dos Maroon 5, “mas éramos só 4”. “Eu via as performances do Adam Levine no Rock in Rio e agora estou aqui”.
“Nunca vi tantas pessoas num só lugar e isso faz-me sentir adoentado”, disse em tom de piada.
“É o meu dever e obrigação fazer-vos chorar e tocar-vos nos sentimentos. É o início do mês do Orgulho, o que é incrível”, deixou ainda a mensagem antes de se sentar para cantar 'If Our Love is Wrong', que fala sobre a sua homossexualidade e a forma como isso o afetava em criança.
Um dos momentos mais emocionantes foi quando o próprio Calum começou a chorar graças à dimensão do coro formado pelos fãs em 'You Are The Reason'.“Esta foi uma das atuações mais emocionantes desta canção”.
“Sonhei com isto [este concerto no Rock in Rio], andei a preparar-me. Se cantei desafinado, perdão", disse na saída altamente aplaudida.
Um rapaz ruivo, uma guitarra e a incomparável loop station
Lisboa já se habitou a receber Ed Sheeran mas a magia do rapaz da guitarra que entretém 80 mil pessoas sozinho em palco surpreende sempre.
Quando Sheeran tocou pela primeira vez no Rock in Rio, era ainda uma descoberta recente do pop mundial e não o gigante que é hoje. Em 2014, tinha acabado de lançar o álbum "x" e temas como ‘Thinking Out Loud’ eram faixa frequente nas rádios do mundo inteiro.
Os fãs não se esquecem de o ver por cá há cinco anos, em duas noites esgotadas no Estádio da Luz e agora, pouco tempo volvido, volta ao palco onde esteve pela primeira vez: o Rock in Rio.
Para mostrar como gosta dos portugueses, gravou até uma versão de ‘Castle on the Hill’ numa das torres do Castelo de São Jorge, em Lisboa, onde é acompanhado por uma gaivota, e que partilhou este domingo nas redes sociais.
O alinhamento do concerto contou com os grandes momentos da carreira do britânico e músicas que escreve para outros acompanhados apenas pela sua guitarra e a incomparável loop station, que permitem possivelmente um dos mais eficazes one man shows da música pop. “Quando não estou em palco, componho. E quando não estou a compor, dou concertos”, disse aos 80 mil que o ouviam no Palco Mundo.
À semelhança do que fez em 2019, explicou a complexa tecnologia que o faz conseguir ter todos os concertos diferentes. Uma guitarra e uns pedais mágicos na sua frente com que grava sucessivamente partes do que toca e canta ao vivo e adapta a todas as músicas num jogo de habilidades único.
Começou com ‘Castle on the Hill’, no meio de fogo de artifício e outras pirotecnias.
Um dos momentos mais emocionantes foi quando cantou ‘Eyes Closed’, a canção que compôs após a morte do empresário Jamal Edwards, seu melhor amigo, em 2022.
Antes de ‘The A Team’, a canção que, garante, “mudou tudo” na sua vida, lembrou: “Quando toquei aqui pela última vez havia uma colina”, que recordava cheia de luzes na Bela Vista.
A interação entre público e cantor foi tanta que até nos ecrãs da língua gestual se dançava. Do repertório de outros ainda tocou Stevie Wonder, com 'Superstition', e Bill Withers, com 'Ain't No Sunshine'. Mas foi o seu ‘Thinking Out Loud’ que colocou todas as lanternas no ar.
Os clássicos 'Photograph' e 'Perfect' não lhe ficaram atrás no número de telemóveis em riste.
Ouve ainda tempo para 'Shape of You' e 'Bad Habits', antes de fechar num show de foguetes que coloca o final do segundo dia num patamar difícil de ultrapassar no próximo fim de semana.
Ao público cheio do frio provocado pela proximidade do rio, restou arrastar-se lentamente para a saída numa procissão que se esperava lenta e penosa até se sair do recinto. As filas para os autocarros de regresso eram ainda maiores em relação às enormes já reportadas na partida para o recinto, pelo que muitos optaram por fazer o caminho a pé até à estação do Oriente.
Tendo em conta a enchente de pessoas que desfilava pelo Parque das Nações vindos do Rock in Rio, o percurso até à Gare demorou mais de uma hora, apesar de na realidade se fazer em pouco mais de 30 minutos a pé em circunstâncias normais.
No caminho de regresso, as críticas à organização e o desejo de voltar rapidamente à Bela Vista, onde existe metro, autocarro e comboio ouviam-se entre os festivaleiros, mas nada tirava dos rostos cansados a alegria de terem visto novamente o rapaz ruivo e a sua guitarra.
Para os mais corajosos, ainda houve a oportunidade de ver Diego Miranda a fechar o Palco Galp até à uma da manhã.
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