Veja aqui o RESET de Valter do Hugo Mãe no podcast RESET, apresentado por Bumba na Fofinha:
O tema que deu o mote à conversa foi a última obra do escritor, Doenças do Brasil, publicada em setembro. Questionado pela anfitriã se foi "difícil de parir" e se o texto final o deixa orgulhoso, o autor confessa estar "muito contente" com o resultado final. Se foi complicado escrevê-lo? "Sim, mais ou menos", uma vez que demorou oito a nove anos a prepará-lo.
"Que direito tinha eu de embeirar das perseguições dos povos vermelhos?", disse, explicando que se debateu com questões "éticas morais" interiores durante o processo criativo quando descobriu sobre aquilo que ia escrever.
Só que este podcast é sobre fracassos e não dos sucessos do escritor que estão na mesa-de-cabeceira de Mariana Cabral. E a conversa passa da literatura para a vida e da vida para a adolescência. O que se segue depois é uma história de sapos, amores e comida gourmet "de outros tempos", os hambúrgueres.
"Um dos meus fracassos foi ter uma juventude [em que fui] feio como um sapo. É uma das grandes tragédias da minha vida. É um bocadinho ao contrário. Agora que não preciso da beleza para grande coisa é que sinto que estou mais ou menos adornado", explicou à entrevistadora Bumba, que depois de elogiar a sua barba "à George Clooney", ouvindo esta declaração, quis aprofundar a questão: "quão feio, em jovem?". "Eu era mesmo um miúdo muito feio", ouviu, para depois ficar a saber que as "miúdas gostavam de mim pelo interior e assumiam".
Num diálogo aberto e bem-disposto, a conversa chega à idade redonda do autor: 50 anos. Instado a comentar se atingida essa meta psicológica é um homem de fazer balanços, o vencedor do Prémio Saramago sublinha que é um "homem que balança muito". Não no baloiço literal, do parque, mas no da vida. Isto porque não vai ter tempo de fazer tudo. É então que surgem "as listagens" e "uns tarefários" — em desenho. "Desenho mal, mas muito", conta.
Antes, tinha dado azos a alguns traços de personalidade que o caracterizam, em que disse ser "muito politicamente correto" e que nunca diz "nada que não deva dizer". "Às vezes até me canso e me penalizo por isso", conta.
Falou-se também de viagens e experiências mais e menos agradáveis. Se por lado deu a entender que quando são pagas sucumbe um pouco à luxúria do conforto de um hotel mais requintado ou de um bilhete de avião mais executivo, quando estas lhe saem do bolso é altura de voar nas low-cost e fazer Airbnb — acampar é que é hipótese fora do baralho.
No entanto, diz sentir-se privilegiado. Porquê? Por viver dos direitos de autor do seu trabalho. Para Valter Hugo Mãe, ter a hipótese de gerir o seu tempo em torno da escrita de um livro é um "privilégio absoluto" — algo que, ainda assim, lhe traz pressão, apesar de dizer que só compete com ele próprio, pois quando brinca com o "rival" Eça de Queiroz, na verdade o que quer dizer é que o único (rival) que sente ter é ele mesmo.
"Só quero ser melhor do que eu já fui", diz, antes de confidenciar que, "como falhou em todos os outros", o seu maior sonho "é escrever um livro melhor". Esta exigência inferniza o seu dia-a-dia porque faz com que deite fora os livros (ou versões) que vai escrevendo. Até porque não guarda muito do que escreve e costuma deitar fora parte do rascunhos.
Mas não se pense que a conversa abordou apenas e somente escrita ou memórias. Houve espaço para medos, inseguranças, saúde. Nem que seja porque acabaria por deambular entre os meandros dos exames de diagnóstico ao colón aos fetiches que envolvem lamber pés e dedos na boca. E de quem é ou não um "caça-brindes" ou faz roubos às unidades hoteleiras durante o pequeno-almoço.
Marcar na agenda:
Valter Hugo Mãe foi o quinto de oito convidados da segunda temporada do RESET. Para ouvir os restantes episódios, basta ir ao Spotify ou ao YouTube.
O podcast de Mariana Cabral tem um cunho social e solidário. Conta com o apoio da Delta Q, que doa, depois de cada episódio, 500 euros a uma causa escolhida pelo convidado. Desta vez, Valter Hugo Mãe escolheu a Associação Animais de Rua, que trata dos animais sem abrigo e que estejam doentes, além de os alimentar e esterilizar para que não se reproduzam. A associação tem por objetivo promover o convívio pacífico entre os animais e as pessoas, em respeito pelo bem-estar animal e a saúde pública.
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