No Reino Unido, 84% dos consumidores dizem que o facto de um produto ser “amigo do ambiente” é muito importante para eles, contudo, 68% dessas pessoas não são capazes de citar sequer uma marca que realmente se destaque como amiga do ambiente.

A partilha é de Luc Speisser, CIO da consultora de branding Landor&Fintech, que subiu ao palco PandaConf com Nachson Mimran, CEO e cofundador da organização To.org, numa conversa moderada por Rute Sousa Vasco, fundadora do The Next Big Idea e Managing Partner da MadreMedia.

O mote — ou a provocação — para a conversa foi o seguinte: "pare de apenas cumprir metas e comece a diferenciar-se: Como aproveitar o poder da marca e da criatividade na sustentabilidade".

“Os acionistas, reguladores e investidores estão a pedir às empresas e às marcas que façam mais quando se trata de sustentabilidade. E tudo isto é ótimo, mas aqui está um número bastante surpreendente: 37% dos consumidores esperam que as marcas e as empresas não só façam parte do jogo, mas até cubram os custos”, diz Luc Speisser.

Isto coloca as empresas perante um significativo desafio ao nível dos custos que têm de suportar para cumprir estas exigências — e o facto é que simplesmente "cumprir" pode nem sequer ser suficiente.

O diretor de inovação da consultora explica que “os reguladores vão continuar a elevar os padrões”, mas os consumidores "não estão dispostos a pagar mais por um produto só porque é mais sustentável”, mesmo que "digam que sim, a realidade é que o preço ainda é o maior e mais importante critério de escolha”.

Portanto, se é verdade que cumprir as normas de conformidade assegura relevância às marcas, isso não as diferencia, o que limita o retorno do investimento feito para estar à altura das exigências. A solução? Apostar tudo na diferenciação, dizem os oradores.

“Um negócio existe para fazer dinheiro, caso contrário morre”, nota Speisser. Daí que considere fundamental trazer para o debate da sustentabilidade das empresas a própria definição sustentabilidade, de acordo com as Nações Unidas, e que visa a questão económica, ambiental e social, também conhecida como três P's (Pessoas, Planeta e lucro – Profit). “Se o terceiro P for esquecido, quando se trata de empresas, a sustentabilidade deixa de poder ser sustentável", defende Speisser, reiterando que “não deve haver vergonha em ganhar dinheiro”, reitera.

E quando as empresas estão preocupadas em "assinalar 'caixas', em mostrar somente que estão a cumprir com as metas, isso torna-as relevantes, mas a relevância não é suficiente para impulsionar a rentabilidade”, diz.

“Tornar-se relevante impulsiona a penetração no mercado. Sim, é relevante poder responder à pergunta ‘esta marca está a fazer o que eu preciso?’. Mas se todos fizerem aquilo que precisamos, qual é a diferença? Apenas o preço”, explica Speisser.

Em suma, o diretor de inovação considera que o componente que falta à sustentabilidade é a diferenciação e a pergunta a que de deve procurar dar resposta é a seguinte: "como é que eu, como marca e negócio, posso destacar-me?".

“É importante que as marcas continuem a melhorar, a reduzir os danos e também a fazer o bem, mas ao mesmo tempo precisam de encontrar uma forma de ligar a sustentabilidade ao negócio, àquilo que fazem melhor, e ligar a sustentabilidade à marca, que é única". O caminho passa "por conseguir que a sustentabilidade deixe de ser um custo e passe a ser um investimento que impulsione o lucro. É necessário fazer da sustentabilidade uma marca”, conclui.

Marcas "à prova de futuro"

Mas nem todas as marcas nascem sustentáveis e, segundo o CIO da consultora de branding Landor&Fintech, isto aplica-se principalmente às grandes marcas. Nestes casos, a empresa de consultoria tem o objetivo de atuar em duas dimensões: tornar as marcas à “prova de futuro” e atualizar o portfólio.

“Onde quer que estejam na sua jornada, o que importa é que não se limitem a falar, têm de agir”, diz Luc Speisser.

A título de exemplo mencionou a Tommy Hilfiger, que lançou a linha Adaptive, pensada para pessoas com deficiência. A coleção inclui decotes de abertura fácil, botões magnéticos e calças ajustáveis, por exemplo. Os artigos encomendados online a partir desta linha também são entregues em embalagens acessíveis e de fácil abertura e utilização.

“Se pensarmos, há cinco anos atrás, era o tipo de marca old fashioned, enraizada no estilo de vida do sonho americano... Primeiro, mudámos o propósito: qual é o sonho americano do século XXI? O sonho é tornar tudo possível para toda a gente, é isso que querem fazer. Uma vez dito, têm de agir sobre isso, em conformidade”, explicou Speisser.

A esta iniciativa juntam-se outras, como o programa “waste nothing”, que conseguiram melhorar a reputação da marca. Resultado? “A empresa cresceu 300 milhões de dólares no primeiro ano da iniciativa, sendo que 40% das vendas adicionais não foram apenas nesse segmento [linha Adaptive]. Isso para mim é um grande exemplo do que é a sustentabilidade: faz o que dizes e diz o que fazes — e liga-o à tua marca e ao negócio”, conclui Speisser.

Nachson Mimran traz à conversa um ensinamento partilhado consigo por Speisser no momento em que se conheceram: “uma marca é uma promessa, e uma boa marca é uma promessa bem cumprida”.

O CEO da To.org, que cria e apoia empresas e organizações que se propõem tornar o mundo mais sustentável, recorda o caso de uma das startups que a fundação apoiou e que conseguiu aliar a noção de sustentabilidade à ideia de “cool”. O sucesso foi tal que a empresa até se ofereceu para ajudar quem os estava a copiar a... copiar melhor.

“Só sabes que és cool quando a fast fashion te começa a copiar", brinca Nachson Mimran. "Sentimos-nos honrados por ver outras marcas de fast fashion a copiarem-nos, mas não nos estavam a copiar usando os mesmos materiais. Então, através da conta de Instagram chamamos a atenção para isso: 'Podem contactar-nos e nós tratamos dos materiais e, assim, podem ser verdadeiros copy cats'. E isto é um exemplo de provocação construtiva. Temos de ajudar o provocado a desenvolver-se e tornar-se melhor e com isso já estamos a ter algumas conversas com outras marcas de moda”, acrescenta.

Outra iniciativa com impacto, recorda, foi com a Mattel. No verão de 2019, a fundação doou um fablab a uma comunidade criativa e, pouco depois, o primeiro brief que receberam foi de uma fonte inesperada, da sua filha de 7 anos.

“Como muitas crianças pequenas, ela queria uma coleção de ‘mini humanos de plástico’ para brincar, mas, como muitos pais, senti-me um pouco desconfortável, já que algumas destas bonecas [Barbies e outras] não eram os modelos que eu queria que os meus filhos seguissem”, contou.

E foi assim que confiaram ao coletivo criativo a impressão dos bonecos em 3D a partir de materiais reciclados e desenvolveram um novo projeto com designers de moda locais. Mas não ficaram por aí e enviaram uma caixa para a sede da Mattel, a “empresa mãe” da Barbie, a dizer "a vossa Barbie é ‘naughty’, venham brincar connosco", referindo-se às questões de sustentabilidade e apelando a uma transformação.

Desde então, Nachson Mimran desenvolveu uma ótima relação com o CEO e presidente da Mattel, e inspirou a empresa a repensar a sua utilização de materiais e a acelerar o seu caminho para uma cadeia de fornecimento circular. “Se olharem para os recentes desenvolvimentos da Mattel, lançaram a ‘Barbie loves the ocean’ [feita de plásticos reciclados] — e convido-vos a verificar o preço das ações”, remata.

“Investe, inova e destaca a tua marca, mas sê humilde, para colaborar com outras empresas, criando um ecossistema de colaboração, mas sem ter vergonha de ter lucro”, nota Luc Speisser. "O importante é olhar para a sustentabilidade não como uma obrigação, mas como uma oportunidade”.

Até porque “se até 2030 não resolvermos os problemas das alterações climáticas, reduzirmos as desigualdades e lutarmos contra a pobreza extrema, estamos lixados”, conclui Nachson Mimran.

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