No Palácio de Queluz, Chico Buarque recebeu hoje o Prémio Camões. Galardoado em 2019, a cerimónia de entrega nunca se realizou depois de ter feito várias críticas às políticas culturais do anterior Presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que na altura se recusou a assinar o diploma, cuja entrega formal estava prevista para abril de 2020.
A falar por último, depois de Manuel Frias Martins, Marcelo Rebelo de Sousa e de Lula da Silva, Chico Buarque dedicou o prémio a todos os artista que "foram humilhados por estupidez e obscurantismo" durante a presidência de Jair Bolsonaro.
Brincando que se começava a questionar se algum dia receberia o prémio por terem passado quatro anos desde que foi anunciado, o escritor e compositor descreveu esse período como um tempo em que os anos pareciam mais longos por causa da pandemia.
“Ao que se refere ao meu país, quatro anos de governo funesto levaram uma eternidade [a passar], porque foi um tempo em que o tempo parecia andar para trás. Aquele governo foi derrotado nas urnas, mas nem por isso nos podemos nos distrair, porque a ameaça fascista persiste no pais e um pouco por toda a parte”, afirmou o músico brasileiro.
Referindo-se ao antigo Presidente brasileiro, Chico Buarque ainda afirmou que este teve a “rara fineza” de não sujar o diploma do prémio com a sua assinatura, deixando o “espaço em branco para a assinatura do nosso Presidente Lula”.
O presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, falou nesta cerimónia, começando por lembrar que neste "dia há 49 anos foi o último da ditadura, mas que é mais um assinalável encontro entre o Portugal e o Brasil em democracia”. O presidente português fez referências ainda a Jair Bolsonaro, antigo presidente do Brasil, afirmando que "os que não gostaram do Camões atribuído a Chico Buarque, caíram no absurdo".
Por fim, o presidente português comparou o Prémio Camões atribuído a Chico Buarque com o Nobel atribuído a Bob Dylan e ainda pediu desculpa ao músico brasileiro, novamente com referências a Jair Bolsonaro: “Meu caro amigo, me perdoe por favor este atraso [na entrega do prémio].”, afirmou Marcelo.
O Presidente do Brasil, Lula da Silva, em visita a Portugal, também esteve presente no Palácio de Queluz. Tal como Marcelo, Lula da Silva referência o seu antecessor, afirmando que "O prémio devia ter sido entregue em 2019. Todos sabemos porque não foi”.
Apesar disso, Lula da Silva explica que é "uma enorme honra" e que a entrega do prémio é assim "o regresso da democracia ao Brasil. Uma vitória do talento contra a censura".
O presidente do júri do Prémio Camões de 2019, o académico português Manuel Frias Martins, destacou a ética e o alcance humanístico da obra de Chico Buarque nas suas mais diversas vertentes.
Defendendo que o premiado “marcou a cultura portuguesa do último meio século”, Frias Martins afirmou que os poemas que constam das canções de Chico Buarque “são abraços que unem continentes onde se estuda a língua portuguesa em toda a sua riqueza e variedade”.
O académico desejou que a atribuição do prémio, “que peca por tardia mas não por imerecida”, sirva para “reforçar a união das nações que se entendem em português”.
“Obrigado, Chico Buarque, por toda a arte e beleza que nos trouxe”, concluiu o presidente do júri, composto ainda por Clara Rowland (Portugal), Antonio Cícero e Antonio Hohlfeldt (Brasil), Ana Paula Tavares (Angola) e Nataniel Ngomane (Moçambique).
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