O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu hoje que o presidente da Câmara de Pedrógão Grande, Valdemar Alves, não vai a julgamento no processo sobre as responsabilidades no grande incêndio de junho de 2017, ao dar provimento aos recursos apresentados por Valdemar Alves e pelo Ministério Público (MP), no sentido de o autarca não ser constituído arguido.
Porém, o advogado Ricardo Sá Fernandes, que representa a assistente que requereu que Valdemar Alves fosse constituído como arguido na fase de instrução, acredita que o autarca será julgado num processo autónomo.
No recurso apresentado pelo Ministério Público à Relação de Coimbra, a procuradora Ana Simões questionava a legitimidade daquele requerimento pela assistente, mas assumia que havia indícios suficientes que permitiam responsabilizar criminalmente Valdemar Alves.
"O MP irá, oportunamente, requerer a extração de certidão dos presentes autos, para instauração de inquérito contra o mesmo", referia a procuradora, no próprio recurso.
Ricardo Sá Fernandes esclareceu que, na abertura da instrução, apresentou documentação que comprovava que o presidente da Câmara de Pedrógão Grande não tinha delegado as competências relacionadas com as faixas de gestão de combustível como invocava que tinha delegado e o MP "não teve acesso a essas provas e, por isso, não acusou".
"Estou convencido de que o presidente da Câmara de Pedrógão Grande irá responder, só que num processo autónomo", disse à agência Lusa o advogado.
Ou seja, apesar de o presidente da Câmara de Pedrógão Grande não ir a julgamento neste processo, poderá ir num outro que o Ministério Público já anunciou ter intenção de instaurar.
À agência Lusa, o advogado referiu que, logo que a decisão da Relação transite em julgado, o MP poderá extrair certidão e avançar com um inquérito contra Valdemar Alves.
Sobre o acórdão da Relação de Coimbra, Ricardo Sá Fernandes aceita a decisão e não irá contestá-la.
Valdemar Alves, que não tinha sido inicialmente acusado pelo Ministério Público, tinha sido constituído arguido durante a instrução, sendo que, agora, a Relação de Coimbra decidiu que o autarca não vai a julgamento neste processo.
O Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) considerou que o requerimento da assistente, representada por Ricardo Sá Fernandes, para Valdemar Alves ser constituído como arguido padecia de "legitimidade".
Para isso, os juízes desembargadores sustentam-se no facto de os familiares da assistente terem morrido na estrada nacional 236-1, cuja gestão de faixa de combustível é da responsabilidade da Ascendi e não do município de Pedrógão Grande (que responde por mortes em estradas municipais).
"Não tendo a assistente relação com as vítimas mortais por cujos homicídios por negligência pretende ver pronunciado o recorrente [Valdemar Alves], carece de legitimidade para requerer a instrução", justificam, no acórdão hoje proferido.
Segundo o TRC, a assistente "não foi admitida para toda a matéria de investigação e objeto de acusação, mas apenas para a matéria relevante para os crimes que vitimaram os seus ascendentes".
Antigo vice-presidente da Câmara “abalado” com decisão de ir a julgamento
A decisão proferida hoje determina ainda que o antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, José Graça, vai a julgamento.
“Vamos analisar o conteúdo do acórdão [da Relação de Coimbra] com atenção e o respeito que nos merece qualquer decisão judicial, mas sempre na intransigente defesa dos superiores interesses do nosso cliente, o qual ficou naturalmente abalado com o conteúdo do acordo, mas com a serenidade própria de quem se considera inocente”, disse à agência Lusa Belmiro Fonte, advogado de José Graça.
No despacho, o Tribunal da Relação de Coimbra determinou dar provimento ao recurso do Ministério Público (MP), que o tinha acusado.
Na fase de instrução, o juiz da Instrução de Leiria tinha decidido retirá-lo do processo.
Agora, o acórdão, assinado pelos juízes Vasques Osório e Helena Bolieiro, concluiu que José Graça "coordenava a atividade desenvolvida por trabalhadores municipais, tendo por objeto a gestão de combustíveis", nomeadamente nas estradas municipais do concelho onde morreram sete pessoas.
Já relativamente ao comandante distrital de operações de socorro de Leiria à data dos factos, Sérgio Gomes, e ao segundo comandante distrital, Mário Cerol, que tinham sido acusados pelo Ministério Público, mas retirados do processo na fase de instrução, o TRC confirmou a última decisão, decidindo não os levar a julgamento.
Os juízes desembargadores consideraram que Sérgio Gomes não terá "inobservado qualquer regulamento" no que toca ao combate ao fogo, tendo feito consideração semelhante relativamente a Mário Cerol.
No dispositivo, a Relação de Coimbra nega o recurso do Ministério Público para estes dois responsáveis regionais da Proteção Civil irem a julgamento, notando, porém, que a não pronúncia deve-se "a razões não completamente coincidentes".
Assim, vão a julgamento os então presidentes dos municípios de Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, Fernando Lopes e Jorge Abreu (que se mantém no cargo), respetivamente; o na altura vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, José Graça, e a engenheira florestal do município Margarida Gonçalves [na altura dos incêndios]; o comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut; o subdiretor da área comercial da EDP, José Geria, e o subdiretor da área de manutenção do Centro da mesma empresa, Casimiro Pedro; e três responsáveis com cargos na Ascendi Pinhal Interior: José Revés, António Berardinelli e Rogério Mota.
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