“Assinala-se hoje, 24 de agosto, 600 dias após a data indicada pelo governo português para a restrição da comercialização e produção de combustíveis ou biocombustíveis que contenham óleo de palma”, começa por dizer a associação em comunicado, acrescentando que a promessa foi incluída no Orçamento do Estado de 2021 sem ter sido concretizada, e que é também um compromisso da Lei de Bases do Clima.
A Comissão Europeia já tinha em 2019 dado “um sinal forte” para a necessidade de se abandonar o uso de culturas alimentares para a produção de biocombustíveis, incluindo desde logo o óleo de palma, por a cultura estar a levar à destruição de ecossistemas ricos em carbono, como as turfeiras ou as florestas tropicais, ameaçando mesmo o habitat do orangotango.
Lembra a Zero que a nível europeu se estabeleceu um abandono progressivo, até 2030, do óleo de palma na produção de biodiesel, um calendário que poderia ser antecipado. Portugal foi logo um dos países que se comprometeu em abandonar o óleo de palma a curto prazo, mas a associação considera que “a grande ambição de Portugal no pelotão europeu virou uma completa desilusão”.
No comunicado, e citando dados públicos, a associação refere que nos últimos quatro anos houve no setor dos biocombustíveis “uma ligeira redução na produção nacional na ordem dos 13% e um forte incremento das importações, com uma subida de 900%” (biocombustíveis para incorporação no gasóleo e na gasolina).
Afirmando que na produção de biodiesel a aposta em Portugal é essencialmente no FAME, um biodiesel que utiliza na sua produção óleos vegetais virgens, óleos alimentares usados ou gordura animal, a Zero acrescenta, citando os números oficiais, que “tem existido uma evolução muito positiva no abandono da utilização de óleos alimentares virgens como a soja, colza e palma”, e uma aposta crescente na utilização de matérias-primas residuais (como óleos alimentares usados).
Mas, alerta, há “um senão”, que é a dependência da importação: em Portugal a recolha de óleos alimentares usados só garante 10% das necessidades, sendo os restantes importados de mais de 40 países (mais de 600.000 metros cúbicos nos últimos quatro anos). E essa importação, diz a Zero, “levanta sempre muitas dúvidas quanto a eventuais esquemas de fraude”.
A Zero manifesta-se também preocupada com a questão da transparência dos dados sobre biocombustíveis, lamentando que o Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG) tenha publicado em maio de 2023 o relatório de 2021 e mesmo assim com falta de “dados fundamentais”, especialmente sobre as importações, para se escrutinar a aplicação da legislação.
“Esta situação é tão mais grave quando existem suspeitas de fraude com o comércio de matérias-primas, nomeadamente residuais que podem estar a ser adulteradas, de forma a beneficiarem de um enquadramento fiscal mais favorável e de subsidiação, assim como de biocombustíveis importados para a Europa, que podem colocar em causa toda uma boa intenção de utilização de energias renováveis e redução de emissões implícita na Diretiva das Energias Renováveis”, alerta a Zero.
A associação pede que se se abandone de imediato, e não até 2030, o óleo de palma, dando resposta às promessas não cumpridas do Governo. E que se faça um “escrutínio sério sobre o mercado dos biocombustíveis”, tornando pública em tempo útil a informação sobre produção e importação.
Deverá ainda haver, diz, um mecanismo europeu de rastreabilidade, que garanta de forma clara a existência de informação sobre percurso de matérias-primas e biocombustíveis ao longo de toda a cadeia de abastecimento.
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