“Volvidos quase dois anos da vigência de uma aberração jurídica cuja constitucionalidade foi unanimemente questionada pela ALP e pela generalidade da comunidade jurídica, são agora revertidas as limitações abusivas impostas ao Direito de Propriedade que esta lei desencadeou, promovendo, paralelamente um fenómeno de aproveitamento e especulação imobiliária por parte de alguns inquilinos”, refere a associação de proprietários em comunicado.
O Tribunal Constitucional declarou inconstitucional a lei 64/2018, que alterou os termos do exercício do direito de preferência pelos arrendatários na transmissão de imóveis, na sequência de um pedido de fiscalização sucessiva efetuado pelo PSD e CDS-PP em outubro de 2018.
Segundo o acórdão a que a agência Lusa teve acesso, os juízes do Tribunal Constitucional concluem que o regime especial de preferência “sacrifica excessivamente o direito à livre transmissibilidade do prédio, sem satisfazer o objetivo da estabilidade habitacional”.
“Trata-se, pois, de uma intervenção legislativa que, nos seus efeitos restritivos ou lesivos, não se encontra numa relação proporcional ou razoável – de justa medida – com os fins prosseguidos”, defende.
A ALP lamenta, por isso, que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que “vetara a primeira formulação da Lei, devolvendo-a ao parlamento, se tenha abstido de suscitar a fiscalização preventiva da sua constitucionalidade ao Tribunal Constitucional”, uma faculdade que “teria impedido” que os direitos dos proprietários de imóveis “tivessem sido lesados” durante este longo período de tempo, lê-se no comunicado.
A nova lei, que visava o “exercício efetivo do direito de preferência pelos arrendatários na alienação do locado”, foi promulgada pelo Presidente da República em 12 de outubro de 2018, após a apresentação de uma segunda versão do diploma pelo parlamento, na sequência do veto presidencial da primeira versão.
No final de outubro de 2018, CDS-PP e PSD apresentaram o pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade do diploma, no caso, o n.º 8 do artigo 1091.º do Código Civil, considerando o então líder parlamentar centrista, Nuno Magalhães, que as normas que tinham entrado em vigor violavam “princípios constitucionais fundamentais previstos na Constituição da República Portuguesa”, nomeadamente o direito à propriedade privada, os princípios da proporcionalidade e o direito à justa indemnização.
A ALP alega que na sequência da entrada em vigor da lei 64/2018, que veio alterar o artigo 1091º do Código Civil, várias operações de compra e venda de imóveis foram afetadas com “severos prejuízos” para os seus proprietários.
Esta lei permitiu, no caso de prédios não constituídos em propriedade horizontal, em que não existem frações autónomas, que o arrendatário passasse a ter direito a preferir na aquisição da parte do prédio que ocupava”, recorda a associação de proprietários.
E prossegue: “Nesta formulação esdrúxula do legislador, o inquilino preferente passou a ter uma quota indiferenciada no prédio, correspondente à permilagem que ocupava do locado, passando a ser comproprietário juntamente com o novo proprietário, mas que materialmente se cinge àquela parte exclusiva do prédio onde reside”.
Nesse sentido, “esta possibilidade bloqueou diversos negócios em que o comprador apenas pretendia adquirir a totalidade de um imóvel, não desejando a compropriedade”, além de ter promovido uma “severa especulação imobiliária”, já que, segundo a ALP, alguns inquilinos exerceram o direito de preferência “unicamente para vir negociar com o promitente comprador no dobro ou mais do valor proporcional da quota-parte do imóvel”.
Para a ALP, é precisamente esse o ponto que o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) invoca.
Os juízes do TC concluem que o regime "sacrifica excessivamente o direito à livre transmissibilidade do prédio, sem satisfazer o objetivo da estabilidade habitacional".
"Trata-se, pois, de uma intervenção legislativa que, nos seus efeitos restritivos ou lesivos, não se encontra numa relação proporcional ou razoável - de justa medida - com os fins prosseguidos", remata.
A ALP congratula-se com a decisão Tribunal Constitucional porque entende que esta “repõe a justiça a favor dos proprietários”, recordando que os seus direitos “têm sido profundamente lesados” pelas sucessivas alterações legislativas do atual e do anterior Governo, nomeadamente em matéria de leis do arrendamento, e cuja constitucionalidade nunca foi suscitada pelo Presidente da República.
Numa altura em que vários direitos dos proprietários “estão suspensos”, devido à pandemia de covid-19, a ALP apela para que o Presidente da República “cumpra na defesa da Constituição da República e na defesa dos direitos consagrados de todos os cidadãos”, lê-se no comunicado.
A segunda versão da lei, agora declarada inconstitucional, foi aprovada em 21 de setembro de 2018 pela Assembleia da República, com votos contra de PSD e CDS-PP e a favor de PS, BE, PCP, PEV e PAN, introduzindo as propostas do PS e do PSD relativamente ao requisito de “local arrendado há mais de dois anos”, para que os arrendatários possam exercer o direito de preferência em caso de compra e venda ou dação das habitações.
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