Nas alegações finais efetuadas no debate instrutório do caso também conhecido por Universo Espírito Santo, o advogado Miguel Coutinho, que representa a massa insolvente do BES, ou seja, o banco em liquidação, criticou os atrasos no processo e tirou por isso “o chapéu à defesa”, sem deixar de notar que a “prova entra pelos olhos dentro” e não foi contrariada durante as sessões desta fase processual.
“É chocante que nove anos depois da resolução do BES ainda se esteja a discutir se tudo o que aconteceu tem a mínima dignidade para ir a julgamento”, afirmou o causídico, sublinhando: “É importante não deixar de ter presente que existem lesados, existem vítimas, e não podemos deixar passar o tempo com prescrições que são um descrédito para a justiça”.
Numa intervenção que abrangeu diversas questões técnicas, com o intuito de evidenciar a conduta dos arguidos e a sua responsabilidade no colapso do BES, Miguel Coutinho contrariou também a tese da defesa de Ricardo Salgado, segundo a qual o antigo presidente do Grupo Espírito Santo (GES) não teria um poder absoluto na instituição.
“A defesa diz que não há provas de que Ricardo Salgado fez alguma coisa. Essa narrativa acaba aqui e acaba hoje. (…) Ficou vastamente provado que a cabeça e o ‘Big Boss’ do BES era Ricardo Salgado”, resumiu, formulando um pedido ao juiz de instrução Pedro Santos Correia: “Pronuncie nos exatos termos da acusação, assim se fazendo justiça”.
A sessão de hoje foi preenchida apenas pelas alegações de assistentes do processo, com a mandatária da massa insolvente da ESI (Espírito Santo International) e da Rio Forte Investments – cujas sociedades estão no processo como arguidas – a defender que o caso siga para julgamento, mas sem a pronúncia das sociedades, ressalvando que estas “foram instrumentalizadas por pessoas singulares” para a prática dos crimes imputados pelo Ministério Público (MP).
“Não houve nada no decurso da instrução suscetível de colocar em causa a narrativa da acusação”, referiu a advogada Madalena Dias Parca, frisando que os crimes “foram levados a cabo fisicamente por outras pessoas, sendo as sociedades meros peões” na ação de “pessoas singulares que as utilizaram em seu benefício com um plano criminoso”.
A mandatária explicou ainda que as assistentes ficaram insolventes “devido à atuação dos arguidos”.
Sobre a dupla condição associada à ESI e à Rio Forte Investments, em que as sociedades respondem como arguidas e as massas insolventes decorrentes do colapso destas entidades detêm o estatuto de assistentes, Madalena Dias Parca argumentou que um futuro ressarcimento pode gerar “situações díspares” entre credores com os mesmos direitos.
A sessão prossegue na quinta-feira, no tribunal de Monsanto (Lisboa), com a conclusão das alegações dos representantes dos assistentes e o início das intervenções das defesas dos arguidos, sendo que os advogados de Ricardo Salgado apenas deverão fazê-lo na sexta-feira.
Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro.
Segundo o MP, cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.
Comentários