A funcionar desde o início de janeiro deste ano, a clínica no Lumiar juntou-se à já existente, desde 2018, na freguesia de Santo António, também em Lisboa, tendo como missão prestar cuidados de saúde oral e acompanhamento psicossocial a populações vulneráveis economicamente.
Catarina Sousa, uma das sete médicas dentistas que trabalha nas clínicas lisboetas do projeto, assumiu o cargo de diretora clínica da ‘Lumiar a Sorrir’, fazendo igualmente consultas no Centro Social Laura Alves, localizado na freguesia de Santo António.
A mais recente clínica surgiu, segundo Catarina Sousa, “acima de tudo da necessidade da população” e para responder às necessidades a nível de saúde oral de quem pertence às freguesias de Santa Clara e do Lumiar.
Para se ter acesso a uma consulta é preciso ir à junta de freguesia, “onde são pedidos uma série de elementos, para se perceber se as pessoas se enquadram nos critérios necessários para ser utentes da clínica”, explicou à Lusa Catarina Sousa.
“A partir daí, nós fazemos tratamentos perfeitamente normais, como qualquer outra clínica. A ideia é sempre trabalharmos muito os hábitos. Estamos a falar de pessoas que muitas vezes não têm qualquer tipo de hábito de saúde e de higiene oral. E, portanto, temos também o apoio psicossocial em simultâneo ao apoio médico dentário”, salientou.
Maria Ofélia, de 49 anos, chegou à clínica através da assistente social. Reunia os critérios necessários e, conforme contou à Lusa, sem esta “ajuda económica espetacular” não conseguiria fazer todos os tratamentos que precisa a nível dentário e que a levarão a ter um sorriso novo.
“Estava com muitas necessidades, com muitas dores. Foi tudo tratado com os relatórios médicos, a consulta prévia e depois comecei o tratamento”, explicou Maria Ofélia.
Agora experimentou os moldes, fizeram-se pequenos ajustes e, daqui a uma semana, é entregue a prótese definitiva.
“Para mim não é só a prótese, não só a parte económica. É também a parte pessoal. Estava a sentir-me com uma baixa autoestima só com um dente, não gosto de me olhar ao espelho assim e então [a consulta na clínica] ajuda-me em tudo, em várias áreas”, desabafou.
Maria Ofélia revelou também que os seus filhos precisam “de tratamentos caros” e, por isso, vai iniciar o processo para que também beneficiem das consultas, adiantando que, se encontrar alguém conhecido que precise, vai “passar a palavra, com toda a certeza”.
Apesar de estar ainda numa fase inicial, a clínica do Lumiar, na Alta de Lisboa, já fez cerca de 30 consultas de primeira vez, o que, para Catarina Sousa, é “promissor” porque estão a ter muita procura, embora reconheça que os arranques “são sempre às vezes um bocadinho mais lentos” do que gostariam.
De acordo com a médica, e com a experiência que tem tido, às clínicas chegam “muitas pessoas já com a perda dentária muito significativa”, outras que “não têm qualquer hábito de higiene oral instituído na sua família”.
“Recebemos assim cenários que achamos que não seria possível de encontrar no nosso país, mas que são mais comuns do que gostaríamos. Falamos de pessoas que nunca foram ao dentista, pessoas com 50 anos, que vêm pela primeira vez ao dentista aqui connosco, pessoas que nunca escovaram os dentes, que utilizam uma escova de dentes para o agregado familiar”, lamentou.
Segundo Catarina Sousa, mais do que tratamentos dentários, que reconhece ser o que “obviamente as pessoas mais precisam e anseiam”, há também todo um trabalho da parte “psicossocial e de preparar estas pessoas para mudarem efetivamente os seus hábitos de uma forma que seja eficaz e que tenha realmente significado para si”.
André Sousa, coordenador do ‘Lumiar a Sorrir’, ‘Santa Clara a Sorrir’ e ‘Santo António a Sorrir’, explicou que o projeto começou no Norte, no Porto e em Braga, e expandiu-se para Lisboa em 2018, havendo também clínicas em Cascais.
“As respostas neste sentido de medicina dentária são muito escassas. Existiu a possibilidade, através de um PRR (Programa de Recuperação e Resiliência) e da Câmara Municipal de Lisboa, de alargarmos a nossa intervenção, nomeadamente à Alta de Lisboa e aqui estamos nós”, disse André Sousa.
Segundo o coordenador, no total, já reabilitaram centenas de pessoas desde 2018.
O objetivo, segundo André Sousa, é que a equipa de sete profissionais a tempo inteiro e os voluntários, também eles médicos dentistas, possam fazer até final de 2025 “perto de 4.000 consultas, com 1.600 rastreios comunitários”.
“Ou seja, dirigirmo-nos também às instituições locais destas duas freguesias, fazermos rastreios à comunidade, despistarmos e, acima de tudo, capacitarmos os profissionais e também utentes, para estas questões da saúde oral e da patologia”, salientou, acrescentando que já foram despistadas “algumas patologias mais graves”.
O projeto ‘Mundo a Sorrir’ é uma Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (ONGD), fundada em julho de 2005 no Porto, que promove a saúde e a saúde oral como um direito universal junto das populações em situação de vulnerabilidade socioeconómica, desenvolvendo a sua atividade em Portugal e em alguns Países de Língua Oficial Portuguesa.
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