Numa entrevista ao jornal Público e à Rádio Renascença, Pinto Monteiro defende que “não há segredo de justiça em Portugal” e que as duas soluções possíveis são ou acabar com ele ou ter meios de controlo efetivo, reconhecendo que quem o viola é quem conhece o processo.
“Só pode violar o segredo de justiça quem conhece e quem conhece é o Ministério Público, os advogados, a polícia, os juízes também, funcionários. Quando se pergunta ‘quem viola o segredo de justiça?’, deviam-se levantar todos”, afirma.
O ex-procurador-geral diz que o atual líder do PSD lhe telefonava a protestar contra as fugas de informação e que era um homem muito preocupado com a relação que dizia haver entre o Ministério Público e os órgãos de comunicação social.
Sobre a necessidade de um pacto na Justiça, de que também falou Rui Rio quando assumiu a liderança do PSD, Pinto Monteiro responde: “Há pactos e pactos. Já houve pactos da Justiça, foram um fiasco, como sabe. Este pacto da Justiça tem uma vantagem: foi discutido entre os intervenientes”.
No entanto, diz que no seio das discussões sobre o pacto da Justiça deveria haver representantes dos cidadãos, alegando que “o cidadão é quem sofre mais”.
Critica a delação premiada, que classifica como “monstruosidade jurídica”, e aconselha os juristas a lerem sobre esta matéria um artigo de Joaquim Gomes Canotilho, dizendo que é inconstitucional.
Sobre as investigações ao ex-primeiro-ministro José Sócrates, diz que quando chegou ao cargo a investigação do caso Freeport estava parada, que foram dados vários prazos e que ficou indignado quando percebeu que os procuradores se queixaram de não ter tido tempo para fazer todas as perguntas que precisavam.
“Eu fiquei indignado porque se eles entendiam aquilo [que precisavam de fazer aquelas perguntas] tiveram anos para as fazer”, afirma, insistindo: “Investigaram o tempo que quiseram. Não foi o processo mais caro da justiça portuguesa mas foi dos mais caros”.
Diz que foi boicotado sobretudo pelo sindicato dos magistrados e que há uma limitação nos poderes do procurador-geral porque o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) é composto maioritariamente pelo sindicato.
“Agora que se discute a reforma da Justiça, há duas coisas fundamentais: uma é que os sindicatos não podem substituir as instituições, os órgãos não podem ser controlados pelos sindicatos. O CSMP não pode ser controlado pelo sindicato e no meu tempo era – agora não sei”.
A propósito da duração dos mandatos do procurador-geral, Pinto Monteiro reconhece que a lei, como está, permite dois entendimentos e que quem vai resolver o assunto terá de ser o Governo e o Presidente da República.
“A única coisa que eu disse é que quando fui convidado ninguém me falou da prorrogação do prazo, não me passou pela cabeça que pudesse ser. A senhora procuradora-geral, ouvia-a dizer duas vezes que o prazo era seis anos. Provavelmente aconteceu-lhe o mesmo que a mim, se calhar também não se deu ao trabalho de ler aquilo”.
Sobre o facto de procuradores saírem de funções para ocuparem cargos em instituições privadas como aconteceu com o procurador Orlando Figueira, que está a ser julgado no âmbito da Operação Fizz, Pinto Monteiro diz que propôs ao CSMP que sempre que um magistrado ocupasse um lugar sensível, se saísse voluntariamente, devia estar dois anos sem ocupar um lugar na vida privada.
“Se se tivesse seguido isso não havia o sarilho que há, com o dr. Orlando Figueira (…). Mas o CSMP reprovou esta minha ideia! Chumbaram! E chumbaram porque não interessava ao sindicato, corporativamente, uma coisa destas”, acrescenta.
Sobre o facto de Angola defender que o processo da Operação Fizz relativo ao ex-vice-presidente angolano Manuel Vicente devia ser julgado em Angola, alegando a convenção da CPLP que regula casos judiciais entre os dois países, Pinto Monteiro afirma: “É claro que, se cometeram um crime…se a lei permite que ele seja julgado em Angola, tem de haver fortes razões para não ser”.
“Mas eu não estou a par do processo”, ressalva.
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