O documento é subscrito pelo ministro do Ambiente e Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, e pelos seus homólogos da Alemanha, Áustria, Dinamarca e Luxemburgo.
No texto apresentado hoje no âmbito da 26.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP26), que decorre em Glasgow, na Escócia, os cinco governantes manifestam-se preocupados com a questão da energia nuclear.
“Reconhecemos o direito de soberania dos Estados-membros para decidirem a favor ou contra a energia nuclear como parte dos seus sistemas energéticos. Contudo, preocupa-nos que incluir a energia nuclear na taxonomia (da União Europeia – UE) possa prejudicar permanentemente a sua integridade, credibilidade e, consequentemente, a sua utilidade”.
A taxonomia da EU é o sistema de classificação que estabelece quais os investimentos ambientalmente sustentáveis, no contexto do Acordo Verde Europeu, e, por isso, excluir a energia nuclear implica que deixe de poder receber financiamento europeu.
Na declaração, os signatários defendem que esta década será decisiva para o percurso conjunto dos Estados-membros da UE em direção à neutralidade climática e a um sistema económico que respeite o planeta.
“Nesse sentido, é essencial que tenhamos uma taxonomia da UE credível, orientada para objetivos, que determine o grau de sustentabilidade ambiental de uma atividade ao longo de todo o seu ciclo de vida”, sublinham, reiterando que a energia nuclear não deve ter espaço nessa lista.
Recordando que vários investidores institucionais de renome já se manifestaram contra a inclusão da energia nuclear nas fontes energéticas consideradas sustentáveis, os cinco ministros apelam para que essas vozes sejam ouvidas.
“A energia nuclear é incompatível com o princípio ‘não representar um dano significativo’ da regulação da taxonomia da UE. Por isso, instamos a Comissão Europeia a não comprometer o caminho corajoso que tem vindo a ser percorrido no sentido de tornar a UE o principal mercado global de finanças sustentáveis”, concluem.
Na quarta-feira, João Pedro Matos Fernandes anunciou que Portugal faria parte dos países subscritores desta declaração conjunta, defendendo que é “absolutamente essencial garantir que o dinheiro europeu, mesmo para projetos dentro da Europa, se faz exclusivamente para projetos do domínio da energia que sejam considerados sustentáveis”.
“Queremos deixar claro que há um conjunto de países, incluindo alguns que têm nuclear, como é o caso de Espanha, que sentem que uma coisa é a utilização da energia nuclear, e até a admissão de alguns projetos do nuclear, mas daí a ele ser considerado sustentável de forma a obter fundos comunitários para a sua construção, isso nem pensar”, frisou em declarações aos jornalistas.
Matos Fernandes notou ainda que há posições divergentes relativamente à produção de energia a partir de fontes nucleares, o mais notável dos quais a França – cuja produção energética depende em dois terços de fontes nucleares – e alguns países de leste.
"Não estamos aqui para definir as políticas energéticas de nenhum país. Estamos aqui para enfatizar que realmente é uma má decisão colocar o nuclear dentro da taxonomia europeia. Não é seguro, não é sustentável e custa muito dinheiro”, argumentou.
O financiamento europeu, vincou Matos Fernandes, deve direcionar-se para outras opções, principalmente as energias eólica e solar, e adiantou estarem em contacto com o setor privado para tomar esta mesma posição.
“Todo o dinheiro que se coloca na energia nuclear é definitivamente dinheiro que se devia colocar em energia renovável e é disso que o mundo precisa. Precisamos de energia, mas que não venha de [combustíveis] fósseis. E precisamos de energia que não tenha lixo nuclear”, insistiu.
Numa intervenção antes de Matos Fernandes, a ministra do Ambiente alemã, Svenja Schulze, afirmou que “a energia nuclear não pode ser uma solução para a crise climática” porque é muito arriscada, muito lenta e não sustentável.
Atualmente, cerca de 12% da eletricidade da Alemanha tem origem no nuclear e metade em fontes renováveis.
Em 2011, depois do acidente na central nuclear japonesa de Fukushima, a chanceler alemã Angela Merkel anunciou que iria por fim às 17 centrais nucleares do país até 2022, apesar de receios que tal implique um aumento de emissões de gases com efeito de estufa devido ao recurso ao gás e carvão.
França é o terceiro maior produtor de energia nuclear do mundo, atrás dos Estados Unidos e China.
Decisores políticos e milhares de especialistas e ativistas reúnem-se até sexta-feira na COP26 para atualizar os contributos dos países para a redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 e aumentar o financiamento para ajudar países afetados a enfrentar a crise climática.
A COP26 decorre seis anos após o Acordo de Paris, que estabeleceu como meta limitar o aumento da temperatura média global do planeta entre 1,5 e 2 graus celsius acima dos valores da época pré-industrial.
Apesar dos compromissos assumidos, as concentrações de gases com efeito de estufa atingiram níveis recorde em 2020, mesmo com a desaceleração económica provocada pela pandemia de covid-19, segundo a ONU, que estima que ao atual ritmo de emissões, as temperaturas serão no final do século superiores em 2,7 ºC.
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