"É triste saber que há pessoas ali, que têm famílias, que estão no mesmo desespero que eu estava até ainda há pouco", avançou à Lusa Daisye Quinta, que se encontra junta ao Porto de Lisboa a aguardar que a mãe e a filha, de 72 e 30 anos, respetivamente, possam sair do navio.
Muitos dos passageiros encontram-se no cimo do navio, observando o aparato dos meios de comunicação, em busca de respostas sobre o que vai acontecer, com o som da sirene a despertar frequentemente.
"Ainda não estou muita calma, porque ainda não tenho elas aqui ao pé de mim, mas é muito complicado, inclusive sei de portugueses, que estão lá dentro, que têm filhos brasileiros, nasceram no Brasil, não tem ainda cidadania [portuguesa] e não podem sair, porque não há lógica deixarem os filhos no navio", indicou Daisye Quinta, a única familiar que se encontra junto ao navio, pois há três dias que tinha informação de que atracariam em Lisboa.
Segundo esta familiar, o que estava previsto é que o navio atracasse em Cascais, não no Porto de Lisboa, como aconteceu.
"Saíram do Brasil dia 10 deste mês e a rota foi mudada toda, por causa disso [da pandemia covid-19], não puderam parar em praticamente lugar nenhum, virem direto para Lisboa", disse Daisye Quinta, acrescentando que, "até ao dia 16 [segunda-feira], estava tudo tranquilo, porque não sabiam de nada".
A partir de terça-feira, os passageiros começaram a ter acesso a internet e a televisão, o que "foi um caos".
"Toda a gente lá tensa, toda a gente nervosa, porque não sabe o que é que vai acontecer, não sabe para onde é que vão, se vão deixar assim ou não, foi bem complicado", expôs.
Aguardando desde a manhã de hoje que as suas familiares saiam do navio, altura em que conseguiu fazer vídeo chamadas com ambas, porque pelas 14:00 deixaram de ter internet no navio, Daisye Quinta estava à espera de que pudessem sair "a partir das 13:00", mas tal atrasou, porque "vão ter que fazer um despiste".
"Penso que em quatro, cinco horas, espero que saiam", referiu a familiar, indicando que, "dentro do navio, não sabem de nada, até ao momento".
Enquanto aguarda que passem as "cerca de cinco horas" até que se concluam os testes de despiste da covid-19, Daisye Quinta assegurou que as suas familiares vão ficar de quarentena em casa.
"Vamos fazer também de certeza, até para segurança nossa, porque não temos nada, por enquanto, porque acho que isso [o contágio da covid-19], infelizmente, vai calhar à grande maioria das pessoas e vamos ficar realmente em casa, o tempo que for preciso", frisou.
A viver há 16 anos em Portugal, Daisye Quinta contou que já estava previsto que a minha filha viesse morar para Lisboa, enquanto a mãe "veio de surpresa".
"A minha mãe estava previsto ela voltar dia 12 de abril, agora já não, agora já não tem como voltar e também não há pressa, o que importa é que fiquem todos bem e volte quando for possível", sublinhou a familiar, referindo que a mãe é portuguesa e a filha tem a dupla nacionalidade.
Ambas estão entre os 27 portugueses que podem sair do navio e ficar em Portugal. Os outros passageiros, mais de 1.300 pessoas, provenientes de 38 países, vão ser repatriados, após os testes de despiste, no âmbito do combate à covid-19.
Daiyse Quinta considerou que houve descuido das autoridades brasileiras, que não deviam ter deixado sair o navio.
"Esse, inclusive, pelo que sei, foi o último navio que saiu do Brasil, nenhum mais saiu", apontou, defendendo que as autoridades brasileiras "não têm noção da dimensão" da pandemia de covid-19.
Em relação a Portugal, Daisye Quinta disse que há pessoas a desvalorizar o novo vírus, o que "é muito triste": "Não digo pelas autoridades, estou a dizer pela própria população, devia ter mais consciência".
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 308 mil pessoas em todo o mundo, das quais mais de 13.400 morreram.
Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.
Em Portugal, há 14 mortes e 1.600 infeções confirmadas.
Portugal encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de quinta-feira e até às 23:59 de 02 de abril.
Além disso, o Governo declarou na terça-feira o estado de calamidade pública para o concelho de Ovar.
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