
Há cada vez mais vídeos que se tornam virais nas redes sociais, a grande maioria gravados por pessoas que com um telemóvel em punho. A esta realidade juntaram-se os carros com câmaras que gravam o exterior. Mas, afinal, o que estão a gravar estas pessoas e estas viaturas?
"A 'imagem' de alguém é um dado pessoal na medida em que permite identificar ou tornar identificável uma pessoa singular. A imagem de um objeto, ou de parte dele, também pode ser um dado pessoal, como acontece com a matrícula de um veículo, porque é uma informação que é reconduzível a alguém, proprietário ou condutor. Qualquer operação que incida sobre este dado implica necessariamente a realização de um tratamento de dados à luz dos artigos 4.º, alíneas 1) e 2), do Regulamento Geral de Proteção de Dados", diz ao SAPO24 a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), salientando também que "a circunstância de quem trata, recolhe, regista, conserva, divulga, entre outras operações, o dado imagem, obtido pelos mais variados meios e formas não conseguir reconduzi-lo a alguém em concreto não lhe retira essa natureza".
"A divulgação de imagens por qualquer meio, nomeadamente nas redes sociais, é, em regra, proibida, a não ser quando haja consentimento ou outro fundamento de licitude"CNPD
Resumidamente, "a obtenção de imagens em locais públicos de utilização comum só é legalmente possível pelas forças e serviços de segurança ao abrigo da Lei n.º 95/2021, de 29 de dezembro".
Isto tudo não quer dizer que as pessoas, ou as viaturas, não poderão fazer filmagens na via pública. Podem, mas com uma ressalva.
"Uma gravação genérica da via pública a partir de um dispositivo móvel, para uso doméstico, para o próprio, não direcionada para uma pessoa ou grupo de pessoas em concreto, não está em princípio abrangida pelo RGPD. Porém, a divulgação dessas imagens por qualquer meio, nomeadamente nas redes sociais, é, em regra, proibida, a não ser quando haja consentimento ou outro fundamento de licitude", diz a CNPD, abordando depois a mais recente polémica sobre as gravações de carros, que curiosamente até têm ajudado as autoridades, como foi o caso no mês de maio quando a PSP deteve um homem por roubo com a ajuda das câmaras de um Tesla.
"O recurso a equipamentos, integrados ou não em viaturas, que possibilitam a obtenção de imagens, designadamente sistemas de vigilância em carros - sentry mode, dashcam, drone, google glasses, câmaras de vídeo, fotográficas ou telemóveis -, tem a capacidade de intrusão na vida privada e na liberdade das pessoas, sendo, por isso, suscetível de afetar numa enorme medida os direitos fundamentais à reserva da intimidade da vida privada, da proteção dos dados e da liberdade, como revelam os artigos 26º, 27º e 35º da Constituição da República Portuguesa", referem.
"É ilícito captar dados pessoais na via pública, matrículas e pessoas, a partir de câmaras instaladas em automóveis"
Tal como os vídeos dos telemóveis, "a utilização destes equipamentos ou sistemas têm implicações na esfera das pessoas, envolvendo algumas restrições também em relação ao direito à imagem, para além do condicionamento à liberdade de movimentos, integrando esses dados, por isso, informação relativa à vida privada".
"Neste sentido, só o consentimento poderia surgir como fundamento de licitude para o tratamento, o qual resulta da captação e/ou gravação das imagens obtidas dos transeuntes, ou de informações que direta e/ou indiretamente possam identificar pessoas singulares, como por exemplo por referência às matrículas de veículos. Acontece que o tipo de espaço, o universo de pessoas a abranger e, ainda, a ampla mobilidade desses equipamentos, tornam inexequível a obtenção do consentimento", salienta a Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Como conclusão, a CNPD refere que "só é possível a utilização de qualquer dos equipamentos referidos se as imagens captadas e objeto de gravação não puderem identificar ou tornar identificável qualquer das pessoas presentes no(s) dia(s), no espaço objeto de filmagem pelo referido equipamento e durante o período de tempo em que a captação de imagens estiver a decorrer".
"A lei nacional proíbe expressamente a captação de imagens na via pública para fins de proteção de pessoas e bens (artigo 19.º da Lei 58/2019, 8 de agosto), sem prejuízo de regimes especiais em que a legislação assim o preveja. Por isso, é ilícito captar dados pessoais na via pública, matrículas e pessoas, a partir de câmaras instaladas em automóveis", dizem, confirmando que existem "coimas associadas a este tipo de contraordenação grave".
Comentários