"Desde que o Governo conservador entrou no poder [em 2010], os cortes na saúde, educação e serviços especiais foram tão extremos que não consigo fazer o meu trabalho como deve ser e entregar a qualidade de serviço que os utentes merecem", afirmou à agência Lusa.

No Reino Unido desde 1995, Dina, como é conhecida, quer "estar numa arena onde possa influenciar esses cortes, que são decididos pelas autarquias", aproveitando a sua experiência para intervir nos pelouros da saúde pública e das crianças e jovens.

"A única forma de mudar a situação é estar na mesa que toma decisões", vincou a portuguesa, que nasceu em Cabo Verde, mas cresceu em Lisboa.

Dina faz parte de um grupo de 13 imigrantes de países como Roménia, Itália, Colômbia, Nigéria, Índia ou Brasil que se inscreveram na segunda edição do MPower, um programa de liderança política.

O curso de quatro meses pretende capacitar imigrantes para se candidatarem a eleições britânicas com informações sobre o funcionamento do sistema político, aulas sobre oratória e conversas com autarcas de origem estrangeira.

A maioria já tem experiência de voluntariado dentro das suas próprias comunidades através de organizações que ajudam pessoas que precisam de apoio, por exemplo com documentos de residência, apoios sociais, trabalho ou habitação.

"A nossa prioridade é formar pessoas que já tenham essa liderança, organização, personalidade e que estejam envolvidas nas suas comunidades pois sabemos que serão capazes de se tornarem bons autarcas", afirmou a diretora-executiva e co-fundadora do Migrant Democracy Project, Lara Parizotto.

A vantagem dos imigrantes, defendeu, é que têm uma "experiência vivida" com uma parte importante da população britânica, cerca de 16% a nível nacional no Reino Unido e 40% na região metropolitana de Londres.

"Queremos ajudá-los a pensar no que essa carreira política pode significar para eles, mas também no que pode significar para a sua comunidade como um todo, ou seja, como podem usar o poder de ser um representante eleito para apoiarem as comunidades de onde são e a área local em geral", acrescentou.

Mas este o percurso nem sempre é fácil, como Parizotto sentiu pessoalmente.

A jovem brasileira foi ela própria eleita em 2022 membro da assembleia municipal em Brentford, perto de Londres, pelo Partido Trabalhista, mas demitiu-se um ano mais tarde, frustrada com a posição do 'Labour' sobre o conflito na Faixa de Gaza.

"Não vamos dizer às pessoas com que partido devem ou não devem candidatar-se, mas queremos ajudar as pessoas a refletir sobre isso por si próprias", salientou.

No ano passado, nove pessoas participaram na primeira edição deste programa, duas concorreram nas eleições autárquicas de maio e ambas foram eleitas, entre as quais Kemal Cufoglu, em Colchester, cerca de 130 quilómetros a nordeste de Londres.

"Como alguém que sofreu racismo e islamofobia, que sempre terá um sotaque e poderá parecer um pouco diferente, valorizei muito a oportunidade de ser apoiado e treinado por indivíduos com experiência prática e visões com as quais me identifico", disse o autarca cipriota à Lusa.

Cufoglu destacou ainda o "apoio moral" recebido tanto pelos formadores como pelos colegas durante a campanha eleitoral, quando foi vítima de difamação e ataques hostis.

"Estava a afetar o meu estado de espírito e a minha motivação. Mas partilhei estes problemas com a Lara e os outros colegas, que me apoiaram e aconselharam", disse.

Atualmente, são elegíveis para se candidatarem e votarem nas eleições britânicas imigrantes naturalizados, cidadãos de países da Commonwealth residentes e irlandeses com estatuto de residente.

Os europeus com estatuto de residente pós-Brexit estão limitados às eleições autárquicas.

Portugal, Espanha, Polónia e Luxemburgo assinaram entretanto com o Reino Unido acordos bilaterais que garantem direitos políticos recíprocos em eleições autárquicas.