O ano começou com o PCP e BE a avançarem propostas, no Parlamento, para reduzir o financiamento público de colégios privados, matéria que o Governo abraçou sem vacilar. O país ficou dividido. Seguiram-se ações em tribunal e manifestações na rua que juntaram milhares de pessoas em defesa dos contratos de associação entre o Estado e os estabelecimentos particulares. Por oposição, sai também à rua um movimento em defesa da escola pública, que além de reunir dezenas de milhares de pessoas, consegue o apoio de intelectuais, artistas e autarcas. Em maio, o Ministério da Educação anunciou a decisão de não abrir turmas de início de ciclo em 39 colégios com contratos de associação, uma redução de 57% no financiamento de novas turmas. Finda esta batalha, o Executivo abre uma segunda, desta vez com as editoras livreiras. O Governo congelou o preço dos manuais e avançou com a distribuição gratuita aos alunos do 1.º Ciclo, uma medida que agradou às famílias, mas que foi mal recebida pelas editoras. A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) chegou a afirmar que a medida teria “graves impactos económicos”, antevendo mesmo a “destruição do tecido livreiro” em Portugal.
Estávamos a 7 de junho quando as equipas de Obstetrícia e da Unidade de Neurocríticos do Hospital de São José, que pertence ao Centro Hospitalar de Lisboa Central, realizaram uma cesariana para fazer nascer uma criança cujas últimas semanas de gestação ocorreram com a mãe em estado de morte cerebral. A progenitora estava neste estado há 15 semanas. Lourenço que chegou ao mundo com 2,350 quilogramas foi o bebé milagre de 2016. A Comissão de Ética e Direção Clínica do CHLC deu o seu parecer e, em conjunto com a decisão da família da mãe e da família paterna da criança, acordaram manter a gravidez até às 32 semanas de maneira a garantir a viabilidade do feto. “A mãe foi uma incubadora viva e doou o seu corpo ao seu filho”, disse na altura o presidente da comissão de ética do Centro Hospitalar de Lisboa Central, Gonçalo Cordeiro Ferreira. Facto inédito na Medicina portuguesa, esta foi uma história de contrastes: a chegada daquele bebé ao mundo era também sinónimo de despedida para aquela família. Aos 29 dias de vida o pequeno Lourenço teve alta da maternidade. Começou um novo capítulo.
No mês seguinte, também a dia 7, Carlos Cruz, condenado no âmbito do processo Casa Pia saiu em liberdade condicional do Estabelecimento Prisional da Carregueira, Sintra. Nesta altura, o ex-apresentador de televisão já tinha cumprido dois terços da pena de seis anos de prisão a que foi condenado. À imprensa, Carlos Cruz disse que aquela era “mais uma etapa de uma longa maratona", para provar a sua inocência. "Isto não acaba aqui”, prometeu. “Quando se tem razão, quando se está inocente a força é enorme, não há obstáculo não há nada. Eu estive aqui mil e seiscentos e tal dias, e todos os dias eu acordava e adormecia inocente e isso dá-nos uma força que o conceito de tempo deixa de ser um conceito material, para ser um conceito abstrato, e nós vamos vivendo sempre na esperança que a verdade venha ao de cima e um dia virá”, afirmou. O processo Casa Pia foi o maior escândalo de pedofilia em Portugal.
Apenas um dia depois, a 8 de julho, ficou a saber-se que José Manuel Durão Barroso, ex-presidente da Comissão Europeia, foi nomeado presidente não executivo e consultor do Goldman Sachs. A notícia é recebida com consternação no seio da comunidade europeia e Portugal não se poupou à polémica. Face às reações, Barroso chegou mesmo a considerar, em carta enviada ao seu sucessor, Jean-Claude Juncker, que as posições do executivo comunitário sobre a sua ida para o Goldman Sachs eram discriminatórias contra si e contra o banco de investimento, além de inconsistentes. Mais tarde, em novembro, Barroso atribuiu a polémica em torno da sua ida para o banco norte-americano a uma "atitude negativa" da Europa face aos Estados Unidos.
A escolha de Barroso foi amplamente debatida em solo nacional e nas instâncias europeias, mas o facto é que em outubro Comité de ética da União Europeia concluiu que o político português não violou as "regras de integridade”, apesar de não ter demonstrado “a sensatez que se poderia esperar de alguém que ocupou o cargo de presidente durante tantos anos”. De referir que o Goldman Sachs é criticado pelo seu papel no despoletar da crise financeira de 2008 e por ter ajudado a Grécia a ocultar a sua dívida.
Em agosto, um incêndio nas imediações do festival "Andanças", em Castelo de Vide, no distrito de Portalegre, apanhou todos desprevenidos. O fogo destruiu mais de 400 viaturas. Poucos dias após o incidente é divulgado pela Associação Portuguesa de Seguradores (APS) que cerca de cem automóveis destruídos têm cobertura de incêndio e que os proprietários receberiam um total de um milhão de euros de indemnização. Muitos dos outros lesados continuam na incerteza quanto a eventuais indemnizações e a aguardar as conclusões do Ministério Público, depois das investigações realizadas pela Polícia Judiciária (PJ). Quatro meses depois, o "cemitério de automóveis" desapareceu das margens da albufeira, continuando apenas por reclamar pelos proprietários “10 a 12” veículos, sobretudo de festivaleiros estrangeiros, que foram para um depósito do município de Castelo de Vide.
Naquele que foi o segundo verão mais quente desde 1931, há ainda que registar o drama dos incêndios que este ano afetou sobretudo a ilha da Madeira e os concelhos de Arouca e de S. Pedro do Sul. Na segunda semana de agosto, os concelhos de Funchal, Ponta do Sol, Calheta e Santa Cruz, na ilha da Madeira, foram afetados por incêndios que causaram três mortos, um ferido grave, a destruição parcial ou total de mais de três centenas de edifícios, dezenas de desalojados e prejuízos na ordem dos 157 milhões de euros. Foi a primeira vez que um incêndio que começou nas zonas altas do concelho do Funchal desceu até ao centro da cidade. Os incêndios obrigaram a deslocar cerca de mil pessoas de casas e hotéis e a evacuar, por precaução, os hospitais dos Marmeleiros e João de Almada, na freguesia do Monte, e o Hotel do Castanheiro, no centro do Funchal. Em Portugal continental, foi na região Centro que as chamas deram mais dores de cabeça aos bombeiros: começaram no concelho de Arouca, no distrito de Aveiro, e passaram para o concelho vizinho de S. Pedro do Sul, no distrito de Viseu, onde só foram apagadas cerca de uma semana depois. No Orçamento do Estado para 2017 estão inscritos 5,5 milhões de euros para a recuperação dos danos provocados pelos incêndios.
Rapidamente se chega a setembro, mais especificamente a 4 de setembro, dia em que um militar morre durante um exercício do 127º curso de Comandos. Seis dias depois, uma segunda morte. Estas mortes motivaram uma investigação judicial inédita que resultou até ao momento em cinco acusados, um dos quais, o capitão-médico encarregado de zelar pela saúde dos formandos, por dois crimes de homicídio negligente. Outros quatro militares estão acusados do crime de ofensas à integridade física graves e negligentes. Até haver uma decisão política sobre os moldes do curso de Comandos, em função da avaliação interna que está a ser feita, não serão abertos novos cursos. O ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes, sublinhou desde o início o seu empenho político para que os factos fossem apurados e para a responsabilização dos eventuais culpados, mas afastou a possibilidade de acabar com a especialidade.
Outubro é o mês em que se destaca uma história feliz, a do pequeno Martim, de dois anos, encontrado pelas autoridades quase 24 horas depois de ser dado como desaparecido. Martim foi encontrado a cerca de dois quilómetros de casa dos avós maternos, na localidade de Amieira, Urqueira, no concelho de Ourém, distrito de Santarém. O momento em que foi encontrado, a 25 de outubro, ficou marcado por aquela que será, certamente, uma das imagens do ano.
A 8 de novembro chega ao fim, de forma bastante inusitada, a saga de Pedro Dias, conhecido também por “piloto”. A RTP emitiu nessa noite, em direto, o momento em que o homem, suspeito dos crimes de Aguiar da Beira, se entregou às autoridades. Pedro Dias estava desaparecido desde 11 de outubro, dia em que dois militares da GNR foram atingidos a tiro, em Aguiar da Beira, no distrito da Guarda. Um morreu e o outro ficou ferido. Na mesma madrugada, um outro homem morreu e a mulher ficou gravemente ferida, também alvejados a tiro na viatura em que seguiam. O homem, de 44 anos, está acusado da autoria material de dois crimes de homicídio qualificado, três de homicídio qualificado na forma tentada, três de sequestro e um de roubo.
"Eu, António Guterres, juro solenemente exercer com toda a lealdade, discernimento e confiança, as funções que me são confiadas”. Dia 12 de dezembro os portugueses encheram-se de orgulho para assistir à confirmação de Guterres como novo secretário-geral das Nações Unidas. António Guterres, 67 anos, vai iniciar o seu mandato de cinco anos a 1 de janeiro de 2017, três semanas antes da tomada de posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos da América, em Washington. Entre os principais desafios de Guterres nos próximos anos está o restaurar da imagem da organização, lutar contra a burocracia interna e, ao mesmo tempo, lidar com o conflito sírio, o problema nuclear na Coreia do Norte e os esforços para combater as alterações climáticas. Não terá mãos a medir.
Mário Soares, ex-Presidente da República, é internado no dia 13 de dezembro devido a “um quadro de agravamento do seu estado geral”. À data de fecho deste artigo, Soares continua hospitalizado, em coma, com prognóstico muito reservado. O país está em suspenso, aguardando novidades sobre o estado de saúde do histórico socialista, de 92 anos, cujos boletins clínicos são atualizados diariamente.
Quando o tema que dá mote a esta revista do ano são as histórias que emocionaram o país, é impossível não lembrar a conquista do Euro2016 de Futebol ou as medalhas olímpicas conquistadas por atletas portugueses... mas isso fica para a nossa revista do ano de desporto, em que recordamos alguns dos marcos desportivos deste ano.
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