António Costa deu a conhecer ao país na sequência do Conselho de Ministros que dedicou esta quinta-feira na delineação de medidas, com "restrições ao direito de deslocação e à liberdade de iniciativa económica", na sequência do decreto de estado de emergência proclamado na quarta-feira pelo Presidente da República.

Salientando que várias disposições do decreto anunciado por Marcelo Rebelo de Sousa ao país são "claras e exequíveis por si próprias", como é o caso das que "suspendem o direito de resistência ou direito à greve em determinados setores estratégicos", o primeiro-ministro afirma que as novas medidas, definidas no Conselho de hoje, foram pensadas com a “máxima contenção e mínimo de perturbação” do dia a dia dos cidadãos.

"Isolamento obrigatório" para doentes e "dever especial de proteção" dos grupos de risco

O chefe do governo começou por anunciar que as pessoas que se encontrem doentes por infeção com o novo coronavírus (Covid-19) ou sob vigilância ativa das autoridades de saúde que não respeitem o "isolamento obrigatório", quer em contexto hospitalar ou domiciliário, incorrem num "crime de desobediência".

Em relação aos grupos de risco, definido como as pessoas “com mais de 70 anos ou pessoas com morbilidades”, é “imposto um dever especial de proteção”.

“Só devem sair em circunstâncias muito excecionais”, como a compra de bens, ir a um banco, aos CTT tratar “da reforma” ou ao centro de saúde, fazer “pequenos passeios higiénicos” ou “para passear animais de companhia”.

“Deve evitar, a todo o custo, para sua proteção qualquer deslocação para fora da residência”, insistiu, pedindo que prossiga “o esforço que as famílias, vizinhos, nas redes sociais, municípios e juntas de freguesia para apoiar muitos destes idosos de forma a permitir evitar deslocações desnecessárias”.

"São pessoas de particular risco, a experiência revela que são os que estão mais sujeitos à contaminação e que a doença atinge com maior intensidade. É imposto um dever especial de proteção pelo qual só devem sair das suas residências em circunstâncias muito excecionais e quando estritamente necessário", disse o primeiro-ministro.

Quanto aos restantes cidadãos, que não estejam doentes ou em vigilância, o recolhimento não é obrigatório, devendo cumprir um “dever geral de recolhimento domiciliário”.

O primeiro-ministro esclareceu que não haverá recolher obrigatório, uma medida que foi tomada em vários países por forma a combater a pandemia. Em vez disso, existirá uma atuação pedagógica por parte das autoridades, com António Costa a considerar que seria "um desrespeito pelos portugueses impor um quadro sancionatório", uma vez que a população tem "cumprido tão bem" as recomendações de isolamento.

No entanto, Costa salientou que "as forças de segurança manterão informado o ministro da Administração Interna da forma como estas medidas vão sendo cumpridas e, em função dessa avaliação, o Governo reserva-se o poder de estabelecer, se for necessário, um quadro sancionatório de punir o incumprimento, quer do dever especial de proteção, quer do dever geral de recolhimento".

"Não podemos perder nesta crise aquilo que recuperámos da crise anterior"

"Nas atividades económicas, como regra, aquilo que vigorará é que, salvo os casos de atividades que se dediquem ao atendimento público, devem manter atividade normal", apontou António Costa, dizendo que serão exceções casos como os do município de Ovar, onde foi decretada calamidade pública local e foram impostas "medidas e restrições específicas" ao desenvolvimento da atividade económica.

Pelo contrário, nas atividades económicas que envolvem atendimento ao público, como estabelecimentos comerciais, "a regra é o seu encerramento".

Neste caso serão exceções estabelecimentos como as padarias, mercearias, supermercados, bombas de gasolinas, farmácias ou quiosques, que "desempenhando e vendendo bens essenciais à vida do a dia, podem e devem manter-se abertos", apontou o primeiro-ministro.

Quanto aos estabelecimentos ligados à restauração "devem ser encerrados no seu atendimento público", mas António Costa apelou a que se possam manter em funcionamento para serviços de entrega ao domicílio e `take-away´ (recolha na loja).

António Costa considerou mesmo "particularmente importante" que estes estabelecimentos de restauração se mantenham abertos "nas aldeias, nas vilas, nos bairros" para continuar a apoiar os que não podem ou não devem andar na rua, como os doentes e os idosos.

Já na fase das perguntas e, questionado sobre o funcionamento dos centros comerciais, António Costa reiterou que. para os estabelecimentos de atendimento ao público "a regra vai ser o encerramento", com exceções dos que são "essenciais à vida das pessoas".

Quais os impactos sociais e económicos do estado de emergência? É preciso que não se criem “maiores dificuldades económicas a uma situação que já é muito dura”, diz António Costa
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"Os centros comerciais serão encerrados com exceção das lojas que tenham esta natureza e que podem permanecer abertas", disse.

António Costa apelou a que em todos os estabelecimentos comerciais que se mantenham abertos sigam as normas ditadas pela Direção Geral de Saúde quanto ao "afastamento social", devendo privilegiar o atendimento à porta e no postigo para evitar o contacto dos clientes com os colaboradores.

A higienização das superfícies e a utilização, quando indicado, de equipamento de proteção individual foram outras das normas recomendadas pelo primeiro-ministro.

"Não podemos perder nesta crise aqui que recuperámos da crise anterior", disse o chefe de governo em alusão à necessidade de manter a economia viva, ao mesmo tempo que é preservada a saúde de todos os trabalhadores.


Pode rever aqui o briefing da reunião do Conselho de Ministros:


"Não há nenhuma razão que justifique qualquer tipo de racionamento"

"Para já, não há nenhuma razão que justifique qualquer tipo de racionamento e se todos mantivermos - como temos mantido genericamente até agora - o comportamento cívico adequado, nada justifica qualquer tipo de racionamento", respondeu.

O primeiro-ministro fez questão de garantir que o Governo tem "estado a adotar todas as medidas de forma a assegurar que o conjunto de toda a cadeia de fornecimentos se mantém sem quebras".

"E isso é muito importante porque como temos dito nós temos que salvar as vidas, assegurando que a vida continue e que para tratarmos da saúde temos também que ter uma economia sã e temos que evitar o mais possível situações de rutura e descontinuidade" justificou.

De acordo com António Costa, o critério adotado "na aplicação destas medidas no quadro do estado de emergência foi o máximo de contenção na expansão da pandemia com o mínimo de perturbação da vida do dia a dia".

Questionado pelos jornalistas sobre a eventualidade de haver um horário dedicado às pessoas mais idosas em estabelecimentos como os supermercados, o chefe do executivo garantiu que "não haverá nenhum horário especial para atendimento das pessoas que estão sujeitas a um dever especial de proteção".

"Aquilo que existe é um pedido muito especial a todos os que têm mais de 70 anos ou sofrem de qualquer morbilidade para limitarem ainda mais do que todos os outros as possibilidades de saída do seu domicilio", insistiu.

Sobre os funerais, António Costa adiantou que "haverá regras genéricas, respeitando naturalmente aquilo que são os sentimentos culturais na sociedade portuguesa quanto aos serviços fúnebres".

"A exemplo alias do que a igreja católica já tomou a iniciativa de fazer quanto às suas próprias atividades de culto, haverá regras orientadoras para que se evite grande concentração de pessoas e que os funerais possam ser momentos de contaminação", explicou.a

Lotação dos transportes públicos vai ser reduzida

Os transportes públicos irão ter a sua lotação reduzida de forma a evitar a acumulação de pessoas e mantermos o distanciamento social” afirmou António Costa.

As empresas de transporte têm também de assegurar a higienização e desinfeção dos veículos e algumas, como o Metropolitano de Lisboa e a CP - Comboios de Portugal, começaram já a aplicar um produto que tem a duração de um mês.

Primeiro-ministro diz que TAP vai continuar a operar nos Açores

“Quanto ao caso da ilha Terceira, […] tendo a SATA decidido cancelar os voos para esta ilha, é fundamental manter a ligação da TAP”, afirmou António Costa, em Lisboa, após a reunião do Conselho de Ministros que aprovou as medidas para aplicar o estado de emergência, na sequência da pandemia de Covid-19.

Em resposta aos jornalistas sobre a operação da companhia aérea nacional, o primeiro-ministro disse que o Governo tem “insistido junto da TAP em que é fundamental continuar a assegurar a ligação com estas comunidades, a continuidade territorial, designadamente com os arquipélagos dos Açores e da Madeira”.

No caso da ilha Terceira, no arquipélago dos Açores, a preocupação do Governo é que “não fique privada da continuidade territorial com o conjunto do país”, após a decisão da SATA, empresa aérea que opera nesta região autónoma.

A SATA para hoje de fazer ligações inter-ilhas nos Açores e também vai deixar de fazer voos de fora da região para dentro, mas a TAP e a Ryanair continuam a operar para São Miguel e para a Terceira.

As medidas referentes à SATA foram hoje definidas pelo Governo dos Açores, que agiu enquanto acionista único da empresa, e visam combater a epidemia de Covid-19, que no arquipélago regista três casos positivos (um na Terceira, um em São Jorge e um no Faial).

No que refere à SATA Air Açores, ramo da empresa que opera dentro da região, determinou-se, até 31 de março, o encerramento da operação desde as 18:00 locais de hoje (19:00 em Lisboa), ficando excecionados voos de transporte de carga ou outros de "força maior", devidamente autorizados pela Autoridade de Saúde Regional.

O Governo dos Açores, presidido por Vasco Cordeiro (PS), deu ainda indicações ao conselho de administração da Azores Airlines - ramo da SATA que opera de e para fora dos Açores - para "suspender todas as ligações aéreas do exterior à região", com as mesmas exceções dos voos inter-ilhas.

Contudo, fica ainda em aberto a possibilidade de a empresa voar dos Açores para fora: neste campo, a empresa açoriana anunciou já que iria os seus voos para Toronto, no Canadá, até 14 de abril de 2020, sendo a última rotação no dia 22 deste mês, no domingo.

Casos diferentes sucedem com a TAP e a Ryanair, ambas a operar em São Miguel e na ilha Terceira.

Primeiro-ministro anuncia gabinete de crise" para lidar com a pandemia da Covid-19

O governo criou um "gabinete de crise" para lidar com a pandemia da Covid-19, anunciou o primeiro-ministro. O gabinete integrará os ministros de Estado, da Administração Interna, da Defesa Nacional e das Infraestruturas.

Serviços públicos em teletrabalho e Lojas do Cidadão fechadas

Em relação ao setor público, António Costa disse que o governo pretende "generalizar utilização de teletrabalho em todos os serviços públicos". Nos casos de atendimento, é recomendado "o recurso ao atendimento por via telefónica ou online", quando este não for possível, impera que o atendimento presencial funcionará apenas por marcação.

Neste âmbito são encerradas as Lojas do Cidadão, locais de grande afluência de pessoas, ficando abertos os postos de apoio aos cidadãos nas autarquias.

O Conselho de Ministros volta a reunir-se na sexta-feira para debater as medidas de apoio social e económico para a população afetada pela pandemia da Covid-19.

O que é que prevê o decreto de estado de emergência?

O estado de emergência proposto pelo presidente da República para conter a pandemia de Covid-19 prevê a possibilidade de confinamento obrigatório compulsivo dos cidadãos em casa e restrições à circulação na via pública, a não ser que seja justificada.

Para “reduzir o risco de contágio” e fazer a prevenção, “podem ser impostas pelas autoridades públicas competentes as restrições necessárias”, incluindo “o confinamento compulsivo no domicílio ou em estabelecimento de saúde, o estabelecimento de cercas sanitárias”, assim como “a interdição das deslocações e da permanência na via pública que não sejam justificadas”.

Marcelo: "Acabei de decretar estado de emergência. Uma decisão excecional num tempo excecional"
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O decreto prevê que o Estado possa requisitar a privados a prestação de serviços e a utilização de propriedades, como hospitais ou fábricas, no âmbito do estado de emergência da Covid-19.

Segundo o decreto, pode ser também “determinada a obrigatoriedade de abertura, laboração e funcionamento de empresas, estabelecimentos e meios de produção ou o seu encerramento”, além de outras limitações ou modificações de funcionamento.

Está ainda prevista suspensão do direito à greve se tal “comprometer o funcionamento de infraestruturas críticas” ou a “prestação de cuidados de saúde” no combate à pandemia e é aberta a possibilidade de as autoridades públicas requisitarem “colaboradores de entidades públicas e privadas, independentemente do tipo de vínculo” para se apresentarem ao serviço.

O decreto impede “todo e qualquer ato de resistência ativa ou passiva” ao cumprimento das medidas previstas no estado de emergência e o Governo pode limitar ou proibir a realização de reuniões ou manifestações devido ao perigo de transmissão do novo coronavírus, SARS-CoV-2, responsável pela doença Covid-19.

liberdade de expressão e de informação ficam salvaguardadas com a declaração do estado de emergência, bem como os direitos à capacidade civil e cidadania.