De acordo com Paula Fonseca, docente da Escola Superior de Tecnologias da Saúde de Coimbra, quando estão presentes nos efluentes das ETAR, os estrogénios naturais (excretados via urina e fezes) e sintéticos (de anticoncecionais ou terapias hormonais), "podem causar efeitos adversos na saúde humana e animal".

"Estes compostos estão incluídos na classe de disruptores endócrinos, ou seja, substâncias exógenas que agem como hormonas no sistema endócrino e causam alterações na função fisiológica das hormonas endógenas, influenciando o desenvolvimento, crescimento, reprodução e mesmo o comportamento dos humanos e animais", explica.

Por exemplo, há estudos que demonstraram que "a exposição a estrogénios pode causar a feminização de peixes, anomalias no desenvolvimento/crescimento, infertilidade, hermafroditismo, alterações morfológicas e comportamentais".

No que respeita aos humanos, "é conhecida a relação destes compostos com alterações imunológicas e neurológicas", sendo que, no caso dos homens, se pode verificar "redução da fertilidade, redução da quantidade de esperma, cancro da próstata e dos testículos" e, no caso das mulheres, "cancro da mama e ovários policísticos", acrescenta.

Paula Fonseca defende que "a determinação dos níveis de estrogénios é fundamental para a avaliação de riscos sobre os efeitos de disrupção endócrina no ambiente, que constituem uma preocupante questão de saúde pública".

A investigadora recomenda "um tratamento mais adequado nas ETAR que possa prevenir a presença destes micropoluentes, entre outros".

Além da "urgência de implementação de um acompanhamento sistemático na quantificação de estrogénios em todas as ETAR (após tratamento) do país", aconselha "a não utilização de lamas provenientes do tratamento das águas residuais como fertilizantes na agricultura, a separação de águas domésticas, hospitalares e industriais e o controlo de aplicação de hormonas na pecuária e aquacultura".

Estes resultados - que integram a tese de doutoramento "Poluição estrogénica no ambiente: um problema de Saúde Pública" - foram publicados num livro que será lançado na terça-feira.

O estudo incidiu na análise de amostras de águas recolhidas à entrada e à saída de nove ETAR na Região Centro com o objetivo de identificar a presença de quatro tipos de estrogénios.

Foram também estudados anfíbios machos em quatro rios junto de ETAR e dois grupos de controlo de águas não contaminadas.

O estudo "fornece evidências sugerindo que a prolongada exposição aos efluentes das ETAR pode causar efeitos bioacumulativos de estrogénios nestes animais, devido à persistência destes compostos nas águas".

"Há uma evidência da persistência destes compostos à saída das ETAR estudadas, indicando claramente uma ineficiência na remoção destes compostos durante o tratamento das águas residuais, que são sistematicamente lançadas nos rios, lagos e oceanos, afetando os ecossistemas e a água potável que serve as populações", acrescenta.