O ex-ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, com a tutela da comunicação social, do governo de Pedro Passos Coelho, é desde junho presidente do Observatório Europeu dos Media Digitais (European Digital Media Observatory - EDMO, em inglês).
Questionado sobre se prevê um aumento da desinformação, tendo em conta o desenvolvimento da pandemia de covid-19 e as eleições dos Estados Unidos, por exemplo, Miguel Poiares Maduro afirmou: "Eu acho que tenderá a aumentar por duas razões diferentes".
De acordo com o responsável existem duas grandes origens da desinformação, a primeira, interna aos Estados, tem a ver com a "polarização da política, a sua fragmentação, polarização e radicalização".
Isso leva as pessoas a estar "mais disponíveis para aceitarem notícias falsas, para se identificarem com elas porque decidem cada vez mais numa lógica de identificação emocional, não numa lógica racional".
Nesse sentido, "o controlo sobre a veracidade daquilo que estão a ler é menos importante para eles do que a empatia emocional com aquela mensagem que resulta mesmo de uma notícia que é falsa", prosseguiu.
"E a fragmentação política e a polarização e os grupos políticos radicais exploram isso", apontou, referindo que "a nível interno isso tenderá a aumentar, associado à perda de confiança, credibilidade e sustentabilidade dos órgãos de media tradicionais".
Daí a importância de tornar os media mais resilientes também, considerou.
"O segundo tem a ver com a evolução da geopolítica: nós estamos no mundo de uma política internacional cada vez menos multilateral e cada vez mais assente numa lógica transacional de conflito mais aberto de poderes, mas em que esse conflito assume formas mais sofisticadas", salientou Miguel Poiares Maduro.
Ou seja, justifica, "já não é um conflito por ameaça militar, é um conflito cada vez mais utilizando mecanismos como a interferência na política interna dos Estados, por exemplo apoiando movimentos populistas ou apoiando discursos mais radicais dentro de Estados como através de estratégia de desinformação".
Sabe-se, através dos dados das plataformas digitais, que "há muitos casos de desinformação que são promovidos por potências estrangeiras", trata-se de "casos de interferência estrangeira na política interna dos Estados", destacou, dando os exemplos das últimas eleições norte-americanas ou mesmo o referendo do Brexit.
"Acho que uma política de combate à desinformação tem que ter várias linhas, tem que ter uma linha que é tornar mais resiliente a nossa sociedade, as pessoas estarem menos suscetíveis de serem capturadas por essas formas de desinformação, saberem perceber e estarem menos disponíveis para aceitar de forma acrítica informação. E, portanto, isso torna-as mais resistentes à desinformação", elencou.
Em segundo lugar, "uma lógica de regulação que pode começar como começou a União Europeia por uma lógica de autorregulação com um código de conduta aplicável às plataformas digitais", acrescentou.
Por exemplo, "obrigando as plataformas digitais, como já é hoje o caso, a serem mais transparentes quando divulgam a informação que é publicidade política paga".
Miguel Poiares Maduro defende ainda que deveria ser possível - quando as pessoas se confrontam com publicidade política - poderem aceder através dessa publicidade a uma reivindicação política contrária.
"Acho que as plataformas digitais poderiam disponibilizar isso", considerou.
Além disso, "temos mecanismos de regulação de como essas plataformas digitais através, seja dos seus algoritmos, seja através da forma como disponibilizam os conteúdos, podem promover informação menos suscetível de ser capturada por formas de desinformação", disse o responsável.
O controlo de perfis falsos "é outra prioridade do meu ponto de vista, mas também promover mais pluralismo quando as pessoas acedem à informação através dessas plataformas digitais", defendeu.
Uma outra linha é "criar maior resiliência assegurando a independência aos órgãos de comunicação social tradicionais com os seus processos de critérios editoriais. Eles são, como eu costumo chamar, os editores da nossa democracia, temos que proteger essa nossa democracia, não existe democracia sem informação porque [é] a informação que está na base do nosso conhecimento que nos leva depois dar preferência por uma opção política ou por outra".
Por último, "é o pilar internacional", apontou.
"Há que tentar desenvolver a esse nível a uma política internacional assertiva do ponto de vista da União Europeia de combate a essa interferência externa de algumas potências internacionais", em que o caso da Rússia é o mais conhecido, rematou.
Portugal passou a ser agora a base do professor universitário que, apesar de manter a sua ligação ao Instituto Universitário Europeu de Florença, está na Universidade Católica e também na Gulbenkian, presidindo à comissão científica do Fórum Futuro.
O Observatório Europeu dos Media Digitais, do qual também é presidente, foi criado pela União Europeia e visa juntar diferentes atores desde jornalistas, 'fact-checkers' (verificadores de factos), académicos a especialistas em literacia mediática, no combate à desinformação na Europa.
De acordo com Miguel Poiares Maduro, o EDMO está a desenvolver três pilares, um dos quais é juntar numa plataforma diversos grupos e jornalistas 'fact-checkers' para permitir cooperar em casos de investigação jornalística, por exemplo.
O Observatório está também a criar um repositório de investigação europeia, sendo que neste âmbito está a negociar com as plataformas digitais o acesso à informação que permite investigar a desinformação. Ou seja, isso inclui informação sobre o número de perfis falsos, a sua origem geográfica, número de casos de 'fake news', por exemplo, permitindo o acesso de investigadores a esta matéria.
O EDMO vai também desenvolver um programa de formação em literacia mediática.
Comentários