
“Se a Bulgária entrar na zona euro, será como embarcar no Titanic”, disse à AFP Nikolai Ivanov, um antigo alto funcionário reformado, durante um protesto recente que exigia a manutenção da moeda nacional — o lev.
Desde janeiro, os opositores à adoção da moeda comum europeia têm organizado manifestações e apelado à realização de um referendo sobre o tema, num contexto marcado por uma vaga de desinformação.
Memórias da crise económica de 1996-1997 — que levou à falência de 14 bancos e a uma hiperinflação superior a 300% — também ressurgiram, alimentando a oposição.
Vários inquéritos recentes mostram que cerca de metade dos entrevistados se opõem à entrada da Bulgária na zona euro.
O debate reacendeu a propaganda anti-UE, e muitos opositores ao euro têm sido vistos a empunhar bandeiras russas.
A Bulgária, que aderiu à União Europeia em 2007, é o país mais pobre do bloco.
E “os pobres têm medo de ficar ainda mais pobres”, afirmou Boriana Dimitrova, diretora do instituto Alpha Research.
Este receio, aliado à desconfiança generalizada nas instituições após anos de instabilidade política, criou condições férteis para que a população de 6,4 milhões tema a mudança económica.
O medo tem sido alimentado por alguns partidos políticos, nomeadamente a formação de extrema-direita Vazrazhdane, que convocou um novo protesto anti-euro para sábado na capital.
O presidente pró-russo do país, Rumen Radev, fez um anúncio surpresa no início de maio, defendendo também a realização de um referendo sobre o tema.
Esta semana, acusou o governo de não ter implementado as medidas necessárias para que os “mais vulneráveis” consigam resistir ao impacto da adoção do euro.
Vozes pró-UE em dificuldades
Um terço dos búlgaros esteve em risco de pobreza ou exclusão social no ano passado, segundo dados do Eurostat.
As pessoas que vivem em pequenas localidades e zonas rurais estão particularmente relutantes quanto à moeda única, muitas delas nunca viajaram para o estrangeiro nem estão habituadas a transações internacionais.
A desinformação amplamente partilhada nas redes sociais afirma falsamente que, com a introdução do euro, “Bruxelas vai confiscar as tuas poupanças para financiar a Ucrânia”.
Dimitrova considera que Radev está a fazer “uma jogada política bem calculada”, visando um eleitorado desiludido.
No entanto, a sua proposta de referendo foi considerada “inconstitucional”, gerando críticas de juristas e da presidente da Assembleia, Natalia Kiselova, que recusou levá-la a votação.
Entretanto, as vozes pró-europeias têm dificuldade em fazer-se ouvir.
“Em Sófia e nas grandes cidades, a população — mais rica, mais instruída e mais jovem — vê o euro como o passo lógico seguinte no processo de integração europeia”, afirmou Dimitrova.
As instituições e os bancos já estão preparados, e até o desenho das moedas foi escolhido: a moeda búlgara de dois euros terá a inscrição “Deus proteja a Bulgária”.
Mas, num sinal da falta de informação e de um sentimento de inferioridade ainda presente no país, “algumas pessoas ainda me perguntam se o euro búlgaro será válido em França ou na Alemanha”, lamentou Dimitrova.
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