Na reunião pública de câmara realizada na quarta-feira, o presidente do município, Ricardo Leão, eleito pelo PS, avisou que “é para despejar, ponto final, parágrafo”, um titular de contrato de arrendamento em habitação municipal se for “um criminoso que tenha participado” nos acontecimentos registados em vários bairros periféricos de Lisboa, em reação à morte de Odair Moniz, baleado por um agente policial.
Em declarações à Lusa, Maria João Berhan, da associação pelo direito à habitação e à cidade, sublinhou “a falta de caráter de um município que tem abandonado os bairros municipais”.
Segundo recolhas feitas pela Habita!, no concelho de Loures, as habitações municipais estão “em visível estado de degradação”.
A autarquia, recordou, “é o senhorio daquelas pessoas e entre senhorios e inquilinos há um contrato com direitos e deveres de um lado e de outro”.
Ora, Loures “não cumpre as suas obrigações e resolve vir ameaçar”, o que “é feio e descabido”, qualificou Maria João Berhan, lembrando que a missão da autarquia é zelar por todas as pessoas do concelho.
Porém, relatou, esta não é a primeira vez que isso não acontece, pois o município “tem atropelado completamente os direitos das pessoas” e revelado “não tem qualquer respeito pelas pessoas mais pobres, que vivem nos bairros sociais”.
Ao mesmo tempo, lamentou, “é muito triste, numa altura em que os acontecimentos levaram uma grande parte da sociedade a reconhecer que algo está muito errado na maneira como se segregam populações em bairros com muito poucas condições”.
Os tumultos em vários bairros da Área Metropolitana de Lisboa surgiram na sequência da morte de Odair Moniz, cidadão cabo-verdiano de 43 anos e morador no bairro do Zambujal, na Amadora.
Odair Moniz foi baleado por um agente da PSP na madrugada de 21 de outubro, no bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho.
Desde essa altura, ocorreram distúrbios em que foram queimados e vandalizados autocarros, automóveis e caixotes do lixo, somando-se cerca de duas dezenas de detidos e outros tantos suspeitos identificados. Sete pessoas ficaram feridas, uma das quais com gravidade.
Apesar de tudo, Maria João Berhan vê “abertura para debater” a questão dos bairros periféricos da zona de Lisboa e lamentou que o município de Loures vá “atrás do partido cujos dirigentes têm sido mais sanguinários e até criminosos”, referindo-se ao Chega.
É da autoria do Chega a recomendação aprovada na reunião de câmara de quarta-feira que prevê o despejo de pessoas que cometam crimes.
A recomendação foi aprovada com os votos a favor de PS, PSD e Chega e contra de PCP, sublinhando que a perda do direito à habitação seria “uma dupla discriminação”.
Face a isto, a Habita! insta o PS – Ricardo Leão é também presidente da distrital de Lisboa – a ter mais atenção às “pessoas que coloca nos sítios”.
Em comunicado divulgado hoje, o autarca socialista esclareceu que só defende o despejo de inquilinos de habitações municipais que tenham sido condenados e o caso transitado em julgado, assegurando que o município “irá sempre cumprir a lei”.
Ainda assim, Maria João Berhan acredita que o sistema jurídico não permitirá que o autarca cumpra a ameaça, recordando que quem decide condenações são os tribunais.
“Eu não sou jurista, mas não creio que dois castigos pelo mesmo crime seja possível”, assinalou.
Comentários