A polémica com o acolhimento de refugiados ucranianos por uma organização alegadamente encimada por “pró-russos” destruiu num dia um projeto de vinte anos, denuncia, numa entrevista aos jornais ‘Público’ e ‘Setubalense’, o casal no centro das acusações. “Foi destruído num dia”, dizem Yulia e sobre o projeto que começaram em 2002 quando, ao ajudarem na abertura de uma loja de produtos de leste, foram abordados por vários imigrantes que pediam informações sobre estadia, emprego, entre outras."

"Nós tentámos contactar com entidades [em 2002], como o SEF, para saber se havia possibilidade de organizar um encontro de esclarecimento. No SEF disseram-nos que só podiam responder a uma estrutura organizada", explica Igor.

"Foram eles que nos sugeriram que criássemos uma associação", afirma Yulia   O casal russo confessa que quebrou o silêncio porque  começou a temer pela família e com o que "se poderia passar". Igor - que optou por uma postura recatada - assume-se como uma pessoa inexperiente a lidar com jornalistas. "Não sou uma pessoa pública".

Tem-se levantado a questão sobre os motivos que levam os dois russos, que moram em Portugal há mais de 20 anos, a ajudar prontamente tantos refugiados de Leste. Igor explica que deu o primeiro passo pela "vontade em ajudar".

A esposa acrescenta que na altura "não havia tempo" para pensar noutras questões. "Foi tudo muito de repente e o Estado tinha que dar uma resposta muito rápida, por isso é que tudo aconteceu assim. Foi a melhor resposta possível que a Câmara Municipal de Setúbal  encontrou".

Igor falava em russo com as pessoas que atendia, uma língua "praticamente como o inglês" na Europa ocidental. Confrontado com as alegações que uma refugiada ucraniana fez sobre Igor a inquirir acerca do paradeiro do marido, este alega que as questões pessoais que fez faziam parte do protocolo para o preenchimento de dados acerca de questões sobre o agregado familiar. Da mesma forma, garante que o computador que usava era dado pela Câmera de Setúbal e esclarece que nunca enviaram dados para a Rússia. “Garanto, com toda a seriedade, que não enviámos dados para qualquer autoridade russa (...) O único sítio para onde alguns foram encaminhados foi para o IEFP, para inscrição no curso de Português".

Presidente do conselho coordenador de compatriotas russos em Portugal, que responde diretamente ao Ministério de Negócios Estrangeiros na Rússia, desde 2007, Igor Kashin tem sido o elemento mais visado nas suspeitas de espionagem. "Não sou espião russo nem transmiti os dados à embaixada nem a qualquer autoridade russa. E estou disposto a ser submetido a uma máquina da verdade."

Yulia e Igor classificam a guerra na Ucrânia como uma "tragédia" e têm a esperança de que o projeto ao qual dedicaram 20 anos das suas vidas não termine.

O semanário Expresso noticiou no passado dia 29 de abril que refugiados ucranianos foram recebidos na Câmara de Setúbal por russos simpatizantes do regime de Vladimir Putin e que responsáveis pela Linha de Apoio aos Refugiados estão a fotocopiar documentos dos refugiados, entre os quais passaportes e certidões das crianças.