O Governo apresentou esta segunda-feira, no Museu da Ciência Viva, em Lisboa, o programa Simplex 20-21, onde constam mais de 150 medidas para simplificar processos e modernizar os serviços da administração pública.
A apresentação contou com a presença de António Costa, que tomou palavra para recordar o papel do Estado durante a pandemia da covid-19, que teve "a vantagem de alargar o consenso social em torno da sua imprescindibilidade".
“Estes últimos meses tornaram mais visível a importância vital do Estado", começou por dizer o primeiro-ministro, recordando que "o SNS provou a sua capacidade de resposta no momento mais exigente que teve de enfrentar" e que "sem uma Segurança Social robusta", não teria sido possível "mitigar muitas necessidades que as famílias sentiram".
"Ficou muito claro como o desaparecimento da escola presencial foi dramático para as famílias, foi um enorme desafio para as crianças e os professores, e deixou visível a realidade em que, efetivamente, sem a presença das crianças nas escolas, não há condições efetivas de igualdade de oportunidades no processo de aprendizagens”, referiu Costa.
No entanto, se a pandemia significou grandes desafios, o chefe de Governo diz que esta também "revelou uma extraordinária capacidade que a nossa sociedade têm de adaptação às circunstâncias imprevistas”, considerando que qualquer estudo que tivesse sido encomendado antes da pandemia diria que a transição para o ensino digital “demoraria 15 anos” e que a adaptação para o teletrabalho “demoraria 10 anos”, sendo que, pelo contrário, "no prazo de uma semana ou duas, tivemos de reinventar a nossa forma de nos relacionarmos e de trabalhar".
"Ganhámos décadas nesta transição para a sociedade digital. Esta é uma energia que não podemos desperdiçar, temos de a saber acelerar", sublinhou Costa, acrescentando depois que existe "não só a necessidade", mas também "uma oportunidade histórica de fazer esta mudança”.
O primeiro-ministro recordou que o país deve "desejar o melhor" mas preparar-se "para o pior" quanto aos próximos meses. "Ninguém na ciência nos pode assegurar que no próximo outono ou inverno não vamos viver momentos tão ou mais difíceis como aqueles que vivemos no início de março quanto à pandemia”, disse António Costa".
Por isso mesmo, António Costa disse que cumpre ao Estado agir depressa para tornar a vida dos cidadãos e das empresas mais simples pois "a sociedade, as famílias, as pessoas não suportarão passar de novo pelo mesmo", referindo-se ao período de confinamento.
"Temos de nos adaptar e tem de ser agora. Temos algum tempo de distância para adotar as medidas necessárias e evitar o pior, o tempo não é muito, é curtíssimo, se calhar não conseguimos fazer tudo, mas vamos ter de arregaçar as mangas”, continuou o primeiro-ministro, dizendo ser necessário assegurar a "continuidade do funcionamento da sociedade, das escolas, das empresas e dos serviços de administração pública".
Para chegar a tal ponto, disse o primeiro-ministro, entra a questão da oportunidade, já que o Programa de Recuperação e Resiliência da União Europeia criado no âmbito da pandemia tem "novos recursos que não existiam e que podemos e devemos canalizar para estas reformas".
António concedeu, porém, que ainda há muito trabalho para fazer, já que "o mundo é menos perfeito do que aquele que os primeiros-ministros acham que é", admitindo haver “uma enorme desigualdade entre a qualidade e a acessibilidade dos diferentes serviços públicos digitais”.
Como exemplo disse que entre conceder em dois serviços distintos a mesma autorização dos seus dados pessoais a um terceiro serviço, num demorou apenas cinco minutos, ao passo que noutro demorou três horas e apenas com o auxílio dos seus filhos.
“Temos de fazer um esforço de cruzamento”, pois “modernização do estado passa por simplificação” mas também “pelo reforço dos centros de competências, para que possam apoiar por igual todos os ministérios”, disse António Costa, recordando que "o canal de contacto entre o cidadão e o Estado tem de ser idêntico”, seja a contactar as finanças, a agricultura ou a segurança social.
O primeiro-ministro deixou ainda um recado à oposição, e mais concretamente ao PSD e ao CDS-PP, dizendo ver "com muita satisfação" que "uma boa ideia de 2006", ano em que o primeiro programa Simplex foi criado, num Governo PS liderado por José Sócrates, "não foi possível enterrar em 2011", quando se deu a eleição de um Governo PSD-CDS, com Pedro Passos Coelho como primeiro-ministro.
“Quem quer um estado que seja capaz de produzir boas políticas públicas, assegurar igualdade de oportunidades ou bens públicos fundamentais como a segurança, saúde ou educação, tem de querer um estado eficiente", referiu Costa. Por outro lado, o chefe de Governo criticou quem acredita que “deixando degradar o Estado, se valorizam os mercados”, argumentando que "só há mercados eficientes com um Estado eficiente, só há mercados de qualidade se houver um Estado de qualidade”, já que as políticas e regulação do primeiro asseguram a estabilidade e prosperidade do segundo.
"Mas o Estado também tem de dotar o país das infraestruturas necessárias para funcionar. Depois, há um conjunto de serviços públicos sem os quais nenhuma empresa pode efetivamente competir de forma eficiente com os seus concorrentes à escala global", apontou ainda.
Numa última nota, António Costa recordou que a marca dos programas Simplex foi na criação de uma "cultura" que foi bem assimilada pelos portugueses, de exigência para que o Estado continue a modernizar-se. “A sociedade portuguesa não admite que não haja este esforço continuado de simplificação”, concluiu.
Da consulta de dados pessoais à inscrição online nos exames nacionais: alguns destaques do Simplex 20-21
Antes da apresentação do primeiro-ministro, tomou a palavra a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão.
Considerando o Simplex "mais do que o programa, uma política pública que visa uma cultura de inovação e simplificação", a governante recordou como nos últimos 14 anos se identificaram necessidades, se questionaram as soluções existentes e se encontraram novas respostas.
"Ao longo de mais de 1500 medidas, mudámos a forma como a função pública se relaciona com os cidadãos e as empresas”, disse Alexandra Leitão, frisando como de "desataram nós" da função pública, se "criaram pontes " e se simplificou "a máquina do estado e a vida dos cidadãos”.
Para além disso, a ministra recordou como o Estado "tirou partido da infraestrutura de serviços digitais e da dinâmica de inovação” para responder à pandemia, na sua "procura de serviços digitais e criação de serviços remotos que não existiam".
"A administração pública inovou. A crise pandémica alavancou respostas e soluções que não devem ser desperdiçadas, seja potenciando o que funcionou bem, seja melhorando o que devia ter funcionado melhor”, disse a ministra, citando como exemplos de medidas durante esta fase a disponibilização da declaração de nascimento online, do pedido de reembolso online para beneficiários da ADS ou do balcão digital para Autoridade das Condições do Trabalho.
Para esta edição do Simplex, Alexandra Leitão diz que o Governo se focou em dois eixos, "melhor serviço público e administração pública mais moderna".
Para o primeiro foram criadas "medidas que têm como objetivo facilitar a vida das pessoas e das empresas, melhorando o ambiente para os negócios através da redução de encargos administrativos”, exercendo-se ao "simplificar o cumprimento de obrigações, diminuir o número de interações com a administração, amplificar os serviços digitais e reforçar a proximidade às pessoas e ao território"
Já quanto ao segundo, trata-se de "valorizar os processos de transformação interna da função pública, desenvolvendo as competências dos trabalhadores, promovendo a colaboração entre as entidades e os setores e aumentando a eficiência através da tecnologia".
Para tal, esta edição foi construída com empresas, universidades, representantes do terceiro setor, foi ouvida a Comissão para a Modernização Administrativa, e participaram trabalhadores públicos de todas as áreas governativas, que se reuniram em oficinas. "Das 158 medidas, mais de 40% nasceram destas colaborações", disse a ministra.
Entre elas, há 12 medidas a destacar:
- IRS e IVA mais automáticos: Alargamento adicional do âmbito de aplicação das medidas IRS Automático e IVA Automático +, para simplificar ainda mais o cumprimento das obrigações fiscais.
- Selo eletrónico no registo: Adoção de selo eletrónico que permita certificar e assinar documentos que anteriormente necessitavam de selo físico, permitindo a efetiva desmaterialização do processos de registo.
- Portal Único da Agricultura: visa promover a simplificação e a agilização da relação com os agricultores, os cidadãos, as empresas e outros agentes económicos, funcionando como um posto de atendimento online, com disponibilização progressiva de toda a informação e dos serviços prestados pelos organismos da Área Governativa da Agricultura.
- Financiartes: Pretende-se simplificar, tornar mais transparente e interoperável o acesso ao apoio financeiro das estruturas artísticas, melhorando a forma de controlo e monitorização dos apoios concedidos, tornando mais transparente o acesso ao apoio financeiro às artes.
- Cuidador Informal Online: Disponibilização online, na Segurança Social Direta, do serviço que permita ao cidadão não só pedir o estatuto de Cuidador Informal bem como acompanhar o processo até ao pagamento da Prestação do cuidador Informal, com possibilidade de notificação eletrónica.
- Os Meus Dados: Disponibilização de mecanismos de consulta e validação dos dados constantes nos principais registos da Administração Pública e de monitorização da partilha dos" meus dados" através da iAP - Plataforma de Interoperabilidade da AP. Representa uma evolução do mecanismo "Gestor de Acessos" disponibilizado no ePortugal.
- Centro de Contacto Inclusivo: Disponibilização de canal interativo por videochamada mais acessível e personalizado para apoio aos emigrantes na utilização do serviços prestados pelos CNAIM (Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes).
- Mais Telesaúde: Dinamizar o alargamento da ferramenta RSE LIVE desenvolvida pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde para a realização de consultas à distancia, no SNS. O período de confinamento que o covid-19 nos impôs, permitiu ultrapassar um conjunto de resistências relativamente ao uso dos instrumentos TIC que permitem em certos casos a prestação de cuidados de saúde não presenciais, demonstrando a pertinência da sua utilização alargada.
- Modo Simplex AP: Capacitação para aprofundar a cultura de simplificação e inovação na administração pública, desenvolvendo atitudes e capacidades nos trabalhadores e dirigentes para a realização do trabalho de forma simples, rápida e eficaz. Trabalhando com todas as áreas governativas, será alavancada a capacidade de resposta rápida a novos desafios, através da identificação das medidas adequadas, de forma prática e colaborativa.
- Desmaterialização das comunicações dos tribunais com a Saúde e com a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária: dos pedidos com origem nos Tribunais para consulta do Registo Individual do Condutor no âmbito de processos judiciais e um piloto de desmaterialização dos pedidos de informação entre os Tribunais e entidades de Saúde.
- Interoperabilidade entre o Base.gov e o Portugal 2020: A medida permite a transferência, para o sistema de informação do Portugal 2020, de forma automática, da informação constante no website BASE.GOV.pt relativa aos contratos públicos sinalizados pelos beneficiários em cada operação. Desta forma, é eliminado o envio pelos beneficiários do Portugal 2020 da informação já residente na BASE.GOV.pt, contribuindo para a agilização do processo e diminuindo os custos de contexto.
- EUEleitor: Disponibilizar às mesas de voto constituídas no estrangeiro, nas eleições para a Presidencia da República, Parlamento Europeu e Assembleia da República, cadernos eleitorais desmaterializados (eletrónicos), que permitam a consulta eletrónica dos eleitores recenseados nessa secção de voto e o registo de votação. A implementação desta plataforma irá permitir responder ao incremento do número de recenseados de nacionais residentes no estrangeiro, que aumentou de 300.000 para cerca de 1.500.000
Para além destas medidas, o Governo vai ainda criar novos serviços digitais, sendo estes:
- my Turismo de Portugal: acesso único para qualquer serviço online que o Turismo de Portugal disponibilize aos seus utilizadores, permitindo a consulta do estado dos vários processos do utilizador junto do Instituto e a realização das operações online inerentes a esses processos.
- Casa Pronta: Desmaterialização completa do processo "Casa Pronta", com emissão final de certidão online do título Casa Pronta.
- Inscrição eletrónica em provas e exames: Criação de uma solução tecnológica para a inscrição eletrónica em provas e exames.
- e-Rennda: Criação de uma plataforma de registo online para facilitar o procedimento aos utentes que pretendam constar no Registo Nacional de Não Dadores (RENNDA).
- Portugal Performance Abroad: ferramenta de monitorização qualitativa da AICEP das atividades de internacionalização das empresas portuguesas nos mercados de interesse, podendo cada empresa, através da sua página privada na plataforma My Aicep, receber informação em tempo real e alertas de ação. Cada empresa registada poderá assim organizar rapidamente intervenções de “gabinete de crise” nesse mercado, ampliação de movimentos de afinidade ou mesmo captação de novos influenciadores locais, obtendo dados qualitativos sobre a avaliação dos seus produtos, serviços e marcas, perceções de parceiros e consumidores em cada mercado, assim como as motivações que levam a escolher, aceitar ou rejeitar a oferta portuguesa.
- Declarações da Segurança Social na Hora: Criação de condições para permitir aos cidadãos e entidades empregadoras pedir e obter declarações online na Segurança Social Direta, nomeadamente: Abono de Família para crianças e jovens; Rendimento Social de Inserção; Subsídio de Desemprego; Subsídio Social de Desemprego.
- Digitalização das Autorizações de Importação de Pescado: Desmaterialização do processo de submissão de pedidos de importação de pescado e respetivos certificados de captura, e emissão das autorizações pela Autoridade Nacional de Pesca.
Alexandra Leitão afirmou que, em relação a 50 das 158 medidas mais impactantes do ponto de vista da economia, o Governo estima que, "uma vez aplicadas, representem uma poupança de 190 milhões de euros, seja em tempo poupado, seja em facilidade de acesso, ou inícios de atividade mais rápidos por parte das empresas".
"Temos uma medida virada para o turismo que permite mais rapidamente aceder a um conjunto de serviços por parte dos operadores - uma área que agora precisa de um apoio importante por parte do Estado. Destaco, também, através da plataforma My AICEP, uma facilitação às empresas de um conjunto de atividades em termos de objetivos de instalação em Portugal", referiu a título de exemplo.
Em termos de medidas com impacto social, Alexandra Leitão declarou que "a pensão na hora vai permitir a toda a gente que atinja a idade da reforma possa ter, através da Segurança Social direta, a sua pensão imediatamente deferida com o seu montante, caso tenha toda a sua carreira contributiva em Portugal".
"Isto evita aquele hiato que por vezes existia entre o momento em que a pessoa atinge a idade da reforma e o momento em que efetivamente pode ir para a sua reforma. A pensão na hora estará totalmente implementada no quarto trimestre de 2021. Ou seja, no termo do período a que se destina este Simplex", especificou a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública.
Alexandra Leitão referiu também que, em matéria de Segurança Social, se pretende que, tanto o cidadão, como entidades económicas, possam solicitar online um conjunto de documentos, evitando o atendimento presencial no caso do abono de família, rendimento social de inserção, subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego.
No final de 2021, o Governo prevê ainda "o alargamento adicional do âmbito de aplicação das medidas IRS Automático e IVA Automático +, para simplificar de forma crescente o cumprimento das obrigações fiscais".
Na sessão, além de António Costa e de Alexandra Leitão estiveram ainda presentes os ministros de Estado e da Economia, de Estado e da Presidência, da Segurança Social, da Educação, da Cultura, do Planeamento, da Coesão Territorial, da Agricultura e do Mar.
Perante os jornalistas, Alexandra Leitão destacou igualmente a medida "os meus dados", a qual pretende diminuir o número de interações dos cidadãos com os serviços do Estado.
"Essa circulação de dados tem de dar garantias de proteção e vai permitir às pessoas em cada momento saberem que dados a administração dispõe sobre si. Pode validá-los e verificar que partilhas esses dados tiveram. É uma medida com uma dimensão de transparência muito importante", frisou.
Ainda segundo a ministra, em relação a dinheiro europeu que o país se prepara eventualmente para receber, o Governo vai avançar com a interação entre o portal dos contratos públicos e o portal 2020 dos fundos comunitários.
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