Margarida Marques falava num debate de urgência no plenário da Assembleia da República, a pedido do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), sobre o CETA (acrónimo, em inglês, de 'Comprehensive Economic and Trade Agreement'), um acordo que voltou hoje a ser defendido pela direita e fortemente contestado pelos partidos de esquerda, BE, PCP e Os Verdes, por considerarem que as negociações foram feitas "em secretismo, nas costas do povo" e que o acordo favorece as grandes multinacionais.
"O CETA não é um acordo perfeito, mas é o 'benchmark' [referência] em matéria de acordos comerciais, é um tratado que reconhece que o comércio deve promover o desenvolvimento e o crescimento sustentável, com elevados padrões sociais e ambientais", disse Margarida Marques.
A secretária de Estado destacou que "a questão fundamental" do acordo para Portugal prende-se com a "redução significativa de tarifas alfandegárias das exportações portuguesas", em setores onde ainda existem picos pautais, como o dos têxteis-lar, calçado, mobiliário ou cerâmica.
"Permitirá poupanças anuais em direitos alfandegários para as PME (Pequenas e Médias Empresas) portuguesas", disse Margarida Marques, salientando ainda os benefícios que resultam da globalização e alertando que "a inação pode levar ou à ausência de regras ou à aceitação passiva" das mesmas.
Aprovado pelo Parlamento Europeu a 15 de fevereiro, em Estrasburgo, o CETA poderá ser aplicado provisoriamente a partir de abril, apenas nas matérias comerciais da exclusiva competência da União Europeia, mas só entra plenamente em vigor depois de ratificado pelos parlamentos dos 28 Estados-membros.
Um dos aspetos que mais desconfiança tem gerado é o da arbitragem dos denominados tribunais de investimento - Investment Court System (ICS) -, um sistema privado de administração da justiça entre os investidores e os Estados com quem se pretende uniformizar interpretações e acelerar decisões.
O tratado cria um novo modelo de resolução de litígios em matéria de investimentos de caráter permanente e um mecanismo de recurso, que substituirá o antigo sistema de arbitragem.
"Com o CETA, todos os investidores europeus no Canadá serão tratados de forma igual, ultrapassando a situação em que os sete países, que têm acordos bilaterais, têm tratamento diferente. Conseguimos alcançar uma solução intercalar satisfatória", disse.
Quem não concorda são os partidos de esquerda, tendo já o BE e o PCP apresentado um projeto de resolução a rejeitar a entrada em vigor do acordo.
Os dois partidos e o PEV já tinham apresentado no passado projetos de resolução que rejeitavam o acordo, mas estes foram chumbados pelo PS, PSD e CDS-PP. Os argumentos utilizados são praticamente os mesmos.
Entre as várias criticas que teceu, o BE considerou hoje que este acordo "é mais um prego no caixão dos pobres" e um "retrocesso inaceitável" em diversas matérias, ambientais, laborais e de proteção da saúde pública.
"Em cada capítulo do acordo, existe uma alínea de exceção que permite tudo", alertou a deputada bloquista Isabel Pires.
A deputada Carla Cruz do PCP criticou sobretudo a criação de um mecanismo que "coloca os lucros das multinacionais acima dos interesses nacionais e do povo, dos direitos laborais e sociais".
"Não somos pelo isolacionismo, mas pugnamos por acordos de comércio que beneficiem os dois lados", disse.
Também José Luís Ferreira d'Os Verdes disse que o acordo foi "quase escondido, quase secreto e feito nas costas dos cidadãos" e considerou "inaceitável" a entrada em vigor de determinadas matérias ainda antes dos parlamentos se pronunciarem no âmbito do processo de ratificação, que em Portugal deverá ocorrer ainda nesta sessão legislativa.
Até lá, o Executivo vai promover a realização de três debates, em Lisboa, Porto e Leiria, com a presença dos vários partidos políticos, mas também parceiros europeus, parceiros sociais e organizações da sociedade civil.
O CETA é o primeiro acordo económico da UE após o Tratado de Lisboa a incluir um capítulo inteiramente dedicado aos investimentos, reduz as taxas aduaneiras para um grande número de produtos e uniformiza normas para favorecer intercâmbios e para mudar profundamente as relações comerciais entre o Canadá e a UE.
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