Uma das maiores instituições de ensino superior destinadas à engenharia na Europa, a Universidade Técnica de Eindhoven, decidiu implementar um programa de contratações em que as vagas serão destinadas na totalidade a candidatas femininas, vigente nos próximos 18 meses.
De acordo com o diário espanhol El País, o plano de contratação, implementado no início deste mês, faz parte de um programa a cinco anos em que abrirão 150 vagas na Universidade e inclui um financiamento de 100 mil euros para investigação e um mentor para todas as candidatas. As vagas apenas destinar-se-ão a homens se não houver candidaturas femininas adequadas.
O plano reflete também a vontade em homenagear a investigação feminina através do seu nome, sendo batizado de Irene Curie, vencedora do Prémio Nobel da Química em 1935 e filha de Marie Curie, a única mulher a ter ganho tanto o Nobel da Física como da Química, e Pierre Curie, também galardoado pelos seus préstimos à ciência física em 1903.
A reitoria quer, com esta medida, combater a “discriminação de género implícita”, procurando que 35% dos professores efetivos e associados e 50% dos professores assistentes passem a ser mulheres, e prevendo que, pelo menos, 20% das posições científicas na instituição sejam ocupadas por mulheres até 2020. Findado o prazo do projeto, a vai passar a abrir algumas vagas exclusivamente a mulheres, mediante o nível de sucesso deste plano.
Assim, a instituição de Eindhoven pretende deixar de ser a universidade de investigação com menos mulheres em posições catedráticas dos Países Baixos: das 14 que existem no país (fala-se aqui de universidades com unidades de investigação, havendo outras 41 de teor mais prático, chamadas de “Hogeschool”), a desta cidade a sul do território tem apenas uma em cada oito mulheres numa posição catedrática das 186 em exercício. Segundo a revista Science, neste momento apenas 29% dos professores assistentes da Universidade Técnica de Eindhoven são mulheres, baixando esse valor para 15% no que toca a professores efetivos e associados.
Robert-Jan Smits, presidente da instituição, admitiu que o tema do equilíbrio de género “já é falado há que tempos” e que “todo o tipo de medidas suaves tem sido aplicado”, mas que “os dados continuam a parecer péssimos”. É por isso que Frank Baaijens, reitor da Universidade Técnica de Eindhoven, disse na apresentação do plano que “este novo tipo de contratações é necessário”, não só para combater a discriminação, mas porque “é sabido há algum tempo que uma força de trabalho diversa dá melhores resultados, é mais criativa e facilita a inovação”.
A discriminação positiva é legal de acordo com as leis da União Europeia e especificamente nos Países Baixos, aplicando-se cada vez que algum grupo social esteja pouco representando em determinados setores profissionais.
Segundo os dados do Eurostat, permanece um desequilíbrio entre homens e mulheres a trabalhar em cargos de ciência e engenharia: 59% são profissionais masculinos, 41% são femininos. Portugal, no entanto, é dos países da União Europeia onde são mais as mulheres que os homens a trabalhar em áreas científicas, tendo o nosso país 51% de cientistas e engenheiras, apenas ultrapassado pela Lituânia (57%), a Bulgária e a Letónia (ambas com 53%). Os Países Baixos, por outro lado, encontram-se bastante mais abaixo, registando 39% de ocupação das posições científicas e de engenharia por mulheres.
Têm surgido, contudo, algumas opiniões contrárias a esta estratégia, sendo Rik Peels, investigador na Faculdade de Humanidades da Universidade Livre de Amsterdão, uma das personalidades que se tem insurgido. Através da rede social Twitter, Peels considerou o plano “condescendente”, agindo “como se as mulheres não conseguissem encontrar trabalho por elas próprias”. “As mulheres querem uma seleção aberta e justa, pois toda a gente deseja ser contratada pelas suas qualidades e não em nome de uma agenda ideológica. Isto discrimina os homens e uma desigualdade não se corrige com outra”, defendeu o investigador.
Os responsáveis já reagiram à contestação, tendo Baaijens admitido que “nem toda a gente é partidária da discriminação positiva, porque de um ponto de vista racional não fazemos distinções entre homens e mulheres”, acrescentando, no entanto, que a discriminação de género existe e “os estudos feitos a este respeito demonstram que fazemos a dita distinção de forma inconsciente”.
Já Smits teve uma postura um pouco mais ríspida. “Algumas pessoas dizem que é ilegal, dizem que vamos baixar os padrões de qualidade. Isso é um monte de tretas”, defendeu o presidente da instituição. Relativamente às acusações de que o plano discrimina homens, Smits concordou, adiantando que isso apenas deve ao facto de “durante anos, os homens terem discriminado mulheres e estas não serem pagas o mesmo que eles nas mesmas posições”.
A reitoria, porém, prevê criar situações de exceção caso surja algum candidato masculino com qualificações extraordinárias durante o próximo ano e meio. Por outro lado, se depois deste período ainda houver vagas por ocupar, as inscrições voltarão a abrir, mas desta vez destinadas a homens e mulheres.
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