O procedimento foi realizado no final de outubro no laboratório de aritmologia, pela equipa do Serviço de Cardiologia Pediátrica do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa (CHULC), e desde então o bebé não teve mais nenhum episódio de taquicardia.
Esta técnica é utilizada rotineiramente para tratamento de arritmias em idade pediátrica, mas em crianças com idades a partir dos 8, 10 anos, dependendo do seu desenvolvimento. Esta foi a primeira vez que se realizou num bebé em Portugal, disseram os cardiologistas à agência Lusa.
O bebé, com sete quilos, já tinha sido submetido a duas cirurgias por uma malformação congénita do coração e tinha taquicardia resistente a todos os medicamentos, estando muitas vezes internado, uma situação que levou os médicos a decidir realizar o tratamento invasivo por cateterismo, utilizando a ablação das vias anómalas.
“São materiais que são feitos especialmente a pensarem em adultos e têm um tamanho grande e em crianças, principalmente mais pequenas, são muitos poucos os sítios no mundo que fazem estes tratamentos, preferem sempre tratar os doentes com medicação, tentar estabilizar e deixar crescer”, explicou o cardiologista pediátrico que realizou o procedimento, Sérgio Laranjo.
Para o cardiologista, o desafio foi eminentemente técnico: “o tamanho do coração do bebé é tão pequeno que manipular estes materiais dentro do coração, localizá-los e depois fazer um procedimento com segurança é algo que exige muito esforço e muito treino".
No caso deste bebé, ainda era “mais complexo” tinha problemas na estrutura do coração, já operado, e o acesso que tinham para chegar ao coração era uma veia no pescoço. "Os elétrodos quase ocupavam o volume disponível dentro do coração" e encontrar ali "algo milimétrico" é muito difícil.
A diretora do Serviço de Cardiologia Pediátrica do CHULC, Fátima Pinto, contou que já tinham realizado este procedimento a crianças com 10, 15 quilos, mas com este peso e esta idade foi o primeiro caso em Portugal.
Quando há capacidade de tratamento com um método invasivo versus um que não é invasivo os médicos pesam os riscos e os benefícios para o doente: "se o bebé é muito pequenino e nós conseguimos dar medicação que permita que esteja estável e que cresça até ter maior segurança no tratamento, encantado da vida, fazemos isso”, mas há alguns doentes, como é o caso deste bebé, que “compensa o risco, que é acrescido, de fazer este procedimento”, disse Fátima Pinto.
Mas, considerou, “fomos muito atrevidos” ao usar “num coração pequenino e em veias pequeninas” o material que existe disponível para tratamento e fazê-lo com segurança e sem causar dano ao doente. A vantagem é que a criança fica curada.
No caso deste bebé, se não fosse feita esta intervenção teria “um risco grave de entrar em insuficiência cardíaca ou mesmo morrer”, considerou Sérgio Laranjo.
Para Fátima Pinto, este passo abre o caminho para fazer mais e "ao fazer-se mais promove-se uma redução da morbilidade e dos internamentos nestas crianças”.
No fundo, é baixar a idade e o tamanho da criança e em “segurança e com confiança” avançar para este procedimento, não necessariamente no primeiro ano de vida, mas eventualmente numa idade mais jovem 5, 6 anos de idade, em vez de serem tratados quando são adolescentes e andarem 10 anos a fazer medicamento, ir a 50 consultas, fazer 200 exames, fazer cinco ou seis internamentos, acrescentou Sérgio Laranjo.
Sobre a reação dos pais, o médico contou que estavam apreensivos, mas foi-lhes explicado todos os potenciais riscos e benefícios. "Os pais já estavam há algum tempo internados para acompanhar o bebé e estavam a experienciar e a perceber a dificuldade que estávamos a ter" e o que queriam era que o bebé não fosse colocado "em maior risco do que já estava” e no final ficaram francamente satisfeitos.
Na última consulta, “a mãe estava felicíssima”, contou Sério Laranjo.
“Isto é a prova que apesar da covid-19 ainda há hospitais que estão a fazer inovação, técnicas novas, a promover os melhores cuidados aos doentes”, rematou Fátima Pinto.
Comentários