"As obras de arte estavam indexadas, uma a uma e por lotes, a cada um dos títulos da associação", pode ler-se num segmento da intervenção inicial de Jorge Tomé, citado pelo deputado do PCP Duarte Alves, que não foi lida na totalidade pelo ex-administrador, mas que foi entregue aos deputados e a que a Lusa teve acesso.
Jorge Tomé disse que a informação que tinha "da montagem da estrutura jurídica dessa garantia, que foi uma operação muito complexa", foi que "se teve de construir uma solução jurídica para ter acesso às obras de arte", que consistiu em "ficar numa primeira fase com 70% dos títulos da associação" e depois "com 100%".
"Mas para isso acontecer tínhamos duas condições: os direitos sociais e económicos da associação e não permitir qualquer endividamento da associação", revelou Jorge Tomé na resposta ao deputado comunista.
Jorge Tomé explicou que as obras "estão organizadas por três volumes", e que houve também "uma condição do empresário José Berardo" de que essa garantia, indexada aos títulos de participação que, por sua vez, estariam indexados às obras, "tinha de ser partilhada pelos outros bancos que tinham exposição ao grupo José Berardo [BCP e Novo Banco]".
"E, de facto, nós, bancos, ficámos com 100% do penhor dos títulos da associação", disse Jorge Tomé, acrescentando que as instituições de crédito ficaram "com o direito de nomear o presidente da assembleia-geral, e fez-se a indexação dos títulos às obras. E acho que foi executado assim".
O ex-administrador disse ainda que na preparação para a sua vinda ao parlamento tentou "saber e confirmar" a informação, que lhe foi confirmada.
"E há outro dado, houve conhecimento público de que houve uma tentativa de venda da parte dos quadros, e que o tribunal não permitiu", prosseguiu, numa conclusão que levou Jorge Tomé a "inferir que o tribunal assim decidiu porque os títulos estavam indexados às obras".
Jorge Tomé revelou ainda que antes de os bancos conseguirem esta renegociação de garantias, para o seu reforço, "o grupo José Berardo tentou [...] dar os títulos da Associação Coleção Berardo", mas que "a Caixa recusou sempre" porque "os títulos tal como estavam", sendo ainda por cima "uma pequena parte", não serviam como garantia material.
"Não chegávamos às obras de arte. Há correspondência dessa matéria", acrescentou.
Na sua audição de 10 de maio, o empresário conhecido como Joe Berardo deu a entender que os títulos de participação da Associação Coleção Berardo (a dona das obras de arte) que entregou aos bancos para reforçar as garantias dos empréstimos perderam valor com um aumento de capital em que as entidades financeiras não participaram, aparentemente porque não souberam que existiu.
Na sua audição, Joe Berardo esclareceu também que a garantia dada à CGD são os títulos da Associação Coleção Berardo, e não das obras de arte em si.
"O que os bancos têm são os títulos da associação, sempre souberam isso", disse o empresário, acrescentando que não sabe "como é que [os bancos] fizeram a valorização dos títulos" da instituição.
Na quinta-feira, o ex-administrador da CGD Norberto Rosa afirmou que se o Estado exercesse a opção de compra da Coleção Berardo, "o produto dessa opção [...] reverteria para as respetivas instituições" credoras, ou seja, os bancos.
Em 20 de abril, CGD, BCP e Novo Banco entregaram no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa uma ação executiva para cobrar dívidas de Joe Berardo, de quase 1.000 milhões de euros, executando ainda a Fundação José Berardo e duas empresas ligadas ao empresário.
O valor em dívida às três instituições financeiras totaliza 962 milhões de euros.
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