Uma magistrada do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha deu por encerrada a fase de instrução de um caso em que conclui, num auto publicado hoje, que há indícios para julgar Torrent e os antigos membros da mesa do parlamento – Eusebi Campdepedrós (JxCat — Juntos pela Catalunha), Josep Costa (JxCat) e Adriana Delgado (ERC — Esquerda Republicana da Catalunha) – por um ou mais crimes de desobediência.
O caso resulta de uma queixa apresentada pelo Ministério Público contra Torrent e a mesa pelo processamento de duas resoluções a favor da autodeterminação daquela região espanhola e reprovação da monarquia, que o parlamento catalão aprovou em novembro de 2019, pouco depois da decisão de condenar vários políticos regionais envolvidos na tentativa de independência da Catalunha.
Na sua decisão, a magistrada Maria Eugènia Alegret argumenta que Roger Torrent e os restantes deputados da mesa agiram “sem respeitarem a legalidade constitucional e depois de previamente terem sido advertidos pelo Tribunal Constitucional [TC]” quando permitiram a votação de ambas as resoluções, que eram “substancialmente as mesmas” que outras que tinham sido anteriormente suspensas.
As resoluções defendiam o direito do povo da Catalunha à autodeterminação e à reprovação da monarquia, que segundo a juiz é “contrário à configuração constitucional do Rei” reconhecida na Constituição, bem como à “inviolabilidade e isenção de responsabilidade” da sua figura.
A 22 de outubro de 2019, segundo o magistrado, as partes investigadas concordaram em admitir a proposta de resolução para discussão em plenário, “apesar de já terem sido notificadas e solicitada a suspensão de cláusulas semelhantes contidas em outras moções parlamentares”.
“O Parlamento não é um lugar imune ao cumprimento da lei e do princípio da hierarquia das normas”, insiste a magistrada, depois de sublinhar que “as democracias mais avançadas não se baseiam apenas no princípio da divisão de poderes, mas também no compromisso das suas instituições com o Estado de Direito, que obriga todos a submeterem-se ao Estado de Direito e às suas formalidades”.
Depois de rejeitar o argumento da inviolabilidade dos deputados com o fundamento de que este apenas abrange “pareceres ou votos emitidos como parlamentares no exercício das suas funções”, a juiz sustenta que “o cumprimento das decisões judiciais é uma condição prévia indispensável para a estabilidade do sistema”.
“(…) Em nenhuma carta dos direitos fundamentais das democracias à nossa volta nem nas normas legais que julgamos ter de aplicar, encontramos o direito das autoridades públicas desobedecerem às ordens dos tribunais superiores devido a discrepâncias com a norma legal, democraticamente acordada, que eles aplicam e interpretam”, acrescenta o auto.
A juíza questiona se os serviços jurídicos do Parlamento apoiaram a decisão da mesa porque, na sua opinião, na altura, o secretário e o conselheiro superior “avisaram” da “possível contradição” das resoluções com as ordens do TC.
Para a instrutora do processo, “a consciência da ilegalidade da ação é alegadamente revelada pelas manobras levadas a cabo por Torrent para contornar a previsível decisão do TC”, quando antecipou a sessão plenária de 12 de novembro em algumas horas.
Os políticos catalães que organizaram em 2017 um referendo ilegal sobre a autodeterminação da região foram julgados em 2019 e nove deles que estavam a cumprir penas de prisão que iam até um máximo de 13 anos de prisão pelo crime de sedição (contestação coletiva contra a autoridade) foram indultados e saíram da prisão em junho passado.
Um grupo de separatistas está fugido no estrangeiro, não tendo ainda sido julgado, entre eles o ex-presidente do executivo catalão Carles Puigdemont, que reside na Bélgica e foi eleito deputado do Parlamento Europeu.
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