“Fui ver o desfile e nada mais. Nem levei nada amarelo vestido por respeito aos militares, tenho até familiares que também são militares em França. Nunca faria nada de mal no desfile. Quando passasse o Macron, era para mandar uns berros e uns gritos para que ele soubesse que os coletes amarelos ainda não acabaram”, contou Jérôme Rodrigues em declarações à Agência Lusa.
Jérôme Rodrigues tornou-se numa das figuras mais emblemáticas do movimento dos coletes amarelos em França depois de ter perdido um olho numa das manifestações em janeiro deste ano.
No último domingo, segundo o lusodescendente, chegou cedo aos Campos Elísios, foi autorizado a entrar no perímetro de segurança e detido por volta das 8:45.
“Cheguei às 6:30 da manhã e deixaram-me entrar. Havia muitos controlos da polícia e o último que passou por mim foi às 8:45 e fui preso. A justificação foi que eu estava a manifestar-me. Eu estava sozinho”, relatou Jérôme Rodrigues, que foi retirado da avenida antes mesmo do presidente ter passado revista às tropas.
O lusodescendente esteve detido durante cerca de oito horas, sendo depois libertado ao final do dia. Para além de Rodrigues, também Eric Drouet e Maxime Nicolle, outros dois destacados membros do movimento, foram detidos na avenida.
Mesmo assim, à passagem do carro que transportava o Presidente Emmanuel Macron, os apupos e os gritos, assim como alguns balões amarelos, não faltaram.
“Era para mostrar que os coletes amarelos ainda existem, ainda estão no combate. […] Eu sou, segundo o meu advogado, a oposição política ao Macron”, afirmou Jérôme Rodrigues.
O colete amarelo diz não ter medo das autoridades francesas, mas afirma ter ficado “assustado” com a detenção no domingo, por ter sido a primeira vez que foi preso.
Jérôme Rodrigues está a processar o Estado francês por ter pedido um olho depois de ter sido alegadamente atingido por uma bala de borracha disparada pela polícia durante uma manifestação dos coletes amarelos.
Apenas com um olho, o lusodescendente diz ser “complicado” calcular distâncias, avaliar volumes e impossível voltar ao seu antigo trabalho como canalizador.
No entanto, para dar seguimento ao processo é necessário que as autoridades partilhem com o juiz do processo penal a investigação interna ao incidente, algo que ainda não aconteceu.
Sem trabalhar desde janeiro e com baixa médica, o lusodescendente diz ter uma vida incerta.
“Tenho duas incertezas, uma sobre a minha vida profissional futura ligada à incerteza também do movimento. Hoje em França sou a pessoa que está no centro dos coletes amarelos, há outros que também têm um papel importante no movimento, mas eu não tenho grupo, só funciono em nome próprio e tenho de ser eu a falar com toda a gente”, disse, indicando a necessidade de o movimento agora se estruturar para voltar a atrair o apoio da opinião pública.
Com a notoriedade que adquiriu nos últimos meses e que já o levou a passar pela maioria das rádios e televisões francesas, os convites multiplicam-se, com o lusodescendente a ter sido já convidado para falar ir à Argélia, à Grécia, a Itália e também a Portugal.
Um convite que caso volte a ser feito nestas férias do verão, Jerôme poderá aceitar já que passará um período junto da família e amigos numa aldeia perto de Coimbra de onde é originário o seu pai.
“Ouvi dizer muitas coisas que são mal ditas em Portugal sobre os coletes amarelos e eu posso dar a minha opinião sobre o que se está a passar. Há muitas coisas mal em França e Portugal precisa perceber isso. Em França parece que estamos a voltar a uma ditadura já que não posso andar na rua sem ser preso e os portugueses já conheceram isso há 40 anos”, concluiu.
O movimento dos “coletes amarelos” surgiu em novembro de 2018, inicialmente para contestar um aumento da taxa sobre combustíveis, mas tornou-se rapidamente numa revolta ampla contra a política de Emmanuel Macron, com manifestações violentas ao longo de três meses em várias das principais cidades francesas.
Comentários