O chefe de Estado português deixou esta mensagem na abertura da 2.ª Conferência dos Oceanos da Organização das Nações Unidas (ONU), coorganizada por Portugal e pelo Quénia, que decorre até sexta-feira na Altice Arena, em Lisboa.
Pelas 10:00, o secretário-geral ONU, António Guterres, declarou abertos os trabalhos e de seguida os chefes de Estado de Portugal e do Quénia, Uhuru Kenyatta, foram eleitos por aclamação para presidir à Conferência dos Oceanos.
Convidado por Kenyatta a fazer a declaração inicial, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que esta cimeira acontece "no lugar certo, na hora certa, com a abordagem certa e com o secretário-geral das Nações Unidas certo" para promover este encontro.
Numa intervenção feita em inglês, o Presidente da República pediu "cooperação global em prioridades comuns" e afirmou que "os regimes, os poderes institucionais, os políticos passam", enquanto "os oceanos ficam".
"Têm milhões e milhões de anos, são muito anteriores à humanidade, continuarão por milhões e milhões de anos, desde que cuidemos deles e paremos de os matar", acrescentou.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, esta conferência chega "na altura certa, apesar de dois anos de adiamento forçado, de pandemia, de guerra, de crise económica e social dramática e ainda coincidindo com a reunião do G7 e com a Cimeira da NATO".
"A urgência da pandemia ou da guerra não podem ser a desculpa para esquecer os desafios estruturais duradouros e os seus efeitos na nossa vida do dia a dia", defendeu.
Agora há que "recuperar o demasiado tempo perdido e dar uma oportunidade à esperança, uma vez mais, antes que seja tarde de mais", declarou.
Marcelo Rebelo de Sousa argumentou que "os oceanos são centrais para o equilíbrio de poder geopolítico, os cuidados de saúde, recursos económicos, energia, mobilidade, migrações, desenvolvimento económico e científico, alterações climáticas".
No seu discurso, chamou a atenção para os países e populações especialmente afetados pela falta de ação nesta matéria, "esquecidos ou minimizados pela narrativa mediática liderante do chamado primeiro mundo, os ricos e privilegiados", e falou das gerações mais jovens que esperam ser ouvidas nesta conferência.
O Presidente da República descreveu Guterres como "um homem de princípios, de convicções, um promotor da paz, da justiça social e do desenvolvimento sustentável" e Portugal como um país que "é o que é por causa dos oceanos".
"Portugal, uma plataforma entre oceanos, continentes, culturas civilizações, no passado, no presente, no futuro. Às vezes com sucesso, outras falhando, mas sempre presente e construindo pontes, como esta coorganização frutuosa com o Quénia, outro construtor de pontes – um do norte, outro do sul", disse.
"Esta tem de ser a conferência do desconfinamento e da ambição, no lugar certo, na hora certa, com a abordagem correta. Aqui estamos hoje. Sejam bem-vindos, sintam-se em casa", concluiu.
Marcelo destaca promessa de Costa sobre áreas marinhas e espera mudança global
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, aprovou também para saudar as "promessas concretas e vinculativas" assumidas na Conferência dos Oceanos e destacou o compromisso do primeiro-ministro, António Costa, de ter 30% das áreas marinhas nacionais classificadas até 2030.
Em conferência de imprensa, Marcelo manifestou a esperança de que este encontro seja "um ponto de partida para uma grande mudança" na ação global em relação a esta matéria.
O chefe de Estado referiu que ao longo da manhã de hoje, na sessão de abertura da conferência, houve "promessas concretas e vinculativas vindas de cada continente" e que no caso de Portugal "o primeiro-ministro falou de antecipar a promessa de ter também 30% de áreas marítimas protegidas".
Marcelo Rebelo de Sousa tinha ao seu lado António Guterres e Uhuru Kenyatta. "Gostaria muito de falar da nossa cooperação com o Quénia na preparação desta conferência. Dois países, um do norte, outro do sul, mostrando como a cooperação é importante hoje, num momento de discórdia, nalguns casos de guerra, fazemos o oposto, construímos consensos, construímos multilateralismo", disse, falando em inglês.
"Temos uma abordagem de diálogo, mas diálogo aberto e diversificado, com diferentes gerações – não apenas Estados, poderes políticos, mas sociedades, empresas, ciência, tecnologia", prosseguiu.
Segundo o Presidente da República, "isto é tão promissor, tão promissor, num tempo de alarme relativamente aos oceanos e à ação climática, que Lisboa pode ser um ponto de partida para uma grande mudança na ação baseada na ciência".
Antes, Marcelo Rebelo de Sousa voltou a elogiar António Guterres, a quem agradeceu "por voltar a casa e recordar a sua ação como primeiro-ministro aqui" e pelo seu "compromisso constante num assunto que é tão importante para todos nós".
"Tão corajoso, um lutador, um lutador permanente pelos oceanos, pela ação climática. E esta conferência é um exemplo do seu empenho", considerou.
No discurso que proferiu hoje nesta conferência, o primeiro-ministro, António Costa, comprometeu-se a "100% do espaço marítimo sob soberania ou jurisdição portuguesa seja avaliado em bom estado ambiental" e "até 2030 classificar 30% das áreas marinhas nacionais".
Ainda este ano, segundo António Costa, foi dado um passo nesse sentido ao ser aumentada "em 27 vezes o tamanho da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, tornando-a na maior área marinha protegida do Atlântico Norte".
"Por outro lado, na segurança alimentar, queremos transformar a pesca nacional num dos setores mais sustentáveis e de baixo impacto a nível mundial, mantendo 100% dos 'stocks' dentro dos limites biológicos sustentáveis", declarou a seguir o primeiro-ministro.
Marcelo apela à comunicação social que chame a atenção do mundo para o tema
“Cabe a vocês, como media, chamar a atenção do mundo que é muito importante debater a guerra, encontrar um caminho para a paz, mas também é muito importante, se não, a longo prazo, mais importante, o que estamos a discutir aqui nesta conferência”, afirmou o chefe de Estado português.
O chefe de estado português dirigiu este apelo à comunicação social depois de um jornalista se ter queixado das condições de trabalho da imprensa nesta conferência, sobretudo das limitações à circulação entre espaços.
“Sobre a liberdade de expressão em Portugal, eu sempre pertenci ao setor mediático, eu sei de coração que Portugal é um país muito livre. Não sabia de quaisquer obstáculos sobre movimentos na conferência, seria uma surpresa para mim, mas vou verificar”, respondeu.
O Presidente da República português salientou ainda a proximidade temporal de três reuniões diferentes “no mundo”: o G7, a Cimeira NATO - que decorre esta quarta e quinta-feira, em Madrid - e a Conferência dos Oceanos da ONU.
“É curioso que em duas delas, o debate é sobre a guerra, aqui é sobre a paz. Porque sentimos que estamos a fazer paz com a natureza e, ao mesmo tempo, a fazer a paz entre as pessoas”, disse.
Presidente da República promete empenho pessoal nesta causa para lá do fim do mandato
"Estamos a mostrar cooperação multilateral. Não é a moda nestes dias, a moda é a discórdia, não o consenso. É um bom sinal que aqui em Lisboa falemos de fazer a paz com a natureza e entre nós através do conhecimento, da ciência, da educação", assinalou Marcelo Rebelo de Sousa.
O Presidente da República agradeceu à UNESCO, agência da ONU especializada em educação, ciência e cultura, pelos seus estudos na área da oceanografia, referindo que "durante muito tempo estiveram quase sozinhos" nessa missão.
"Quando falamos de oceanos falamos de urgência, estamos atrasados, falamos de vontade, precisamos de mais vontade política", defendeu.
Quanto ao território marítimo de Portugal, afirmou: "Estávamos muito atrasados no mapeamento, tínhamos apenas cerca de 20%, não é suficiente. E mesmo 30% em 2030 é demasiado tarde, tem de ser antes de 2030. Temos uma enorme plataforma continental, uma zona económica exclusiva, talvez a maior da Europa, uma das maiores da Europa, se não a primeira, a segunda. Temos de a mapear".
"Temos de a mapear porque estamos a aumentar o número de áreas marinhas protegidas. Começámos pelo Atlântico, Madeira e Açores, 30% na Madeira, será 30% nos Açores muito em breve. Mas depois o resto", completou.
Por outro lado, Marcelo Rebelo de Sousa pediu para se "multiplicar o investimento na educação" ambiental que está a ser feito a nível nacional e no quadro europeu com programas como o Escola Azul.
Segundo o chefe de Estado, "esta conferência de Lisboa tem de ser não apenas um sinal de que há espaço para fazer a paz, multilateralismo, diálogo, cooperação, mas também um sinal de que vamos agir ainda mais profundamente e mais depressa".
"Por isso, estou comprometido até ao fim do meu mandato, 2026, e depois do fim do meu mandato, porque sou professor, sempre serei professor no que respeita à investigação, educação e futuro dos oceanos", declarou.
"Vamos superar os obstáculos, estou certo", acrescentou.
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