"Tem havido contactos e vamos aguardar pelos desenvolvimentos da situação e, portanto, tudo o resto é especulação. E julgo que a pior coisa que o Estado podia fazer, e o Ministério da Cultura, era contribuir para essa especulação em torno de um quadro que é muito relevante para o país", afirmou Pedro Adão e Silva, em resposta a perguntas de jornalistas em Madrid.
O quadro "Descida da Cruz" está exposto para venda na Feira de Arte e Antiguidades da European Fine Art Foundation (TEFAF), em Maastricht, nos Países Baixos, que abre ao público no sábado, confirmou na terça-feira à Lusa o galerista Mário Roque, da Galeria de São Roque, representado nesta edição do certame de arte e antiguidades, um dos mais importantes do mundo.
A saída da obra de Portugal está envolta em polémica desde o final de 2023, quando a então Direção-geral do Património Cultural decidiu autorizar a saída do país, contrariando pareceres de especialistas.
Os proprietários portugueses entregaram o quadro para venda no final de 2023, depois de ter recebido uma autorização de saída de Portugal, justificada pela “inexistência de qualquer ónus jurídico”.
Pedro Adão e Silva reiterou hoje que a obra de Domingos Sequeira (1768-1837) saiu de Portugal por "uma falha dos serviços" e defendeu que o Ministério da Cultura recolocou "o tema onde ele deve ser tratado", na Museus e Monumentos de Portugal (MMP), onde foi criada uma Comissão para Aquisição de Obras de Arte para os Museus e Palácios Nacionais.
"É no âmbito dessa comissão que têm estado a decorrer contactos com a galeria [Colnaghi, de Madrid] e também com os proprietários. E essas coisas têm os seus tempos, os seus timings, e é nisso que estamos a trabalhar", afirmou o ministro, que sublinhou que as decisões da comissão "devem ser mesmo soberanas".
"A pior coisa que podia acontecer era serem também os membros do Governo, que, como aliás sabemos hoje, são bastante transitórios, a definir qual é o quadro que deve ser comprado para o museu A ou para o museu B", afirmou.
Pedro Adão e Silva insistiu em que a venda, a existência de eventuais compradores ou até o valor do quadro são apenas especulações e sublinhou por diversas vezes que "estas coisas demoram tempo e o ritmo e o tempo destas coisas não é o mesmo ritmo e tempo das notícias".
"Nenhuma aquisição que o Estado faz neste âmbito da comissão para as aquisições se faz de um dia para o outro", afirmou.
A secção portuguesa do Conselho Internacional de Museus (ICOM-Portugal) manifestou em fevereiro, junto do Governo, indignação com a condução do processo que levou à saída do país do quadro de Domingos Sequeira e exigiu respostas oficiais. Anteriormente, um grupo de 12 especialistas da área do património também dirigiu uma carta aberta à tutela manifestando repúdio pela condução do processo.
Nessa altura, em resposta à missiva de 12 especialistas, a secretária de Estado da Cultura, Isabel Cordeiro, assegurou estarem em curso "todos os esforços" para conhecer as "eventuais condições de compra” da obra.
Por seu turno, o presidente da Associação Portuguesa de Museologia (APOM), João Neto, mostrou-se, na mesma altura, contra a aquisição pública da pintura, avaliada em 1,2 milhões de euros, num contexto em que o Estado se encontra "refém de interesses especulativos".
Contactada na terça-feira pela Lusa sobre a presença da pintura na TEFAF e o ponto da situação dos esforços de aquisição pelo Estado português, a MMP respondeu: "Não existe informação nova a partilhar sobre o processo negocial em torno das obras de Domingos Sequeira".
Pedro Adão e Silva esteve hoje em Madrid para a apresentação de uma programação cultural conjunta de Portugal e Espanha para assinalar 50 anos de democracia na Península Ibérica, que decorrerá entre setembro de 2024 e setembro de 2025.
Adão e Silva e o homólogo espanhol, Ernest Urtasun, inauguraram também uma exposição na residência oficial do embaixador de Portugal em Madrid do Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian (CAM).
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