O relatório apresentado pelo secretário-geral da ONU sobre o tema qualifica o estado da proteção dos civis em 2023 como “extremamente sombrio”.
O conflito no Território Palestiniano Ocupado foi notavelmente o mais mortal, resultando em 21.672 palestinianos mortos e 56.165 feridos, principalmente mulheres e crianças, de acordo com a ONU.
Estes números estiveram hoje em destaque no debate anual do Conselho de Segurança da ONU sobre a proteção de civis, com a secretário-geral adjunta para Assuntos Humanitários, Joyce Msuya, a destacar a intensa resposta militar israelita em Gaza após o ataque do Hamas, que resultou em “morte, destruição e sofrimento a um ritmo e numa escala sem precedentes no passado recente”.
“Cerca de 75% da população de Gaza foi deslocada à força. Uma fome provocada pelo homem está iminente. Milhares de crianças foram mortas e feridas no que os colegas da UNICEF chamaram de ‘guerra às crianças'”, disse, recordando também os reféns que continuam retidos pelo movimento islamita Hamas.
Apesar das Nações Unidas terem registado a morte de mais de 33 mil civis em conflitos armados no ano passado, a representante da ONU frisou que os números reais são provavelmente mais elevados, com a utilização de explosivos em áreas povoadas a terem impactos devastadores sobre as populações civis em numerosos conflitos.
“Em todos os conflitos, os civis representaram 90% dos mortos e feridos quando foram utilizado armamento explosivo em áreas povoadas”, destacou.
Entre os conflitos que elevaram o número de vítimas civis, Joyce Msuya referiu os que lavram em Gaza, Sudão, República Democrática do Congo, Myanmar, Nigéria, região do Sahel, Somália, Síria ou Ucrânia.
No Sudão, por exemplo, o conflito entre as Forças Armadas Sudanesas e as Forças de Apoio Rápido resultou em aproximadamente 12.260 mortes e 33.000 feridos, com relatos generalizados de violência sexual.
Os civis também foram gravemente afetados por danos generalizados e destruição de infraestruturas críticas, que interromperam o fornecimento de eletricidade, água e cuidados de saúde a milhões de pessoas.
Além disso, em 21 conflitos foram registados mais de 2.300 incidentes de violência e outras formas de interferência contra trabalhadores médicos, instalações, equipamentos, transportes e pacientes, apontou Msuya.
“Em 14 conflitos em 2023, sem contar o Território Palestiniano Ocupado, 91 trabalhadores humanitários foram tragicamente mortos, 120 feridos e 53 raptados. Só em Gaza, a Agência da ONU para os Refugiados da Palestina (UNRWA) perdeu 142 funcionários na violência entre outubro e dezembro”, relembrou.
O conflito foi também o principal motor dos níveis surpreendentemente elevados de fome. Em 19 países ou territórios afetados por conflitos, 117 milhões de pessoas experimentaram níveis de crise de insegurança alimentar aguda ou superiores, de acordo com a ONU.
Joyce Msuya aproveitou a forte presença diplomática na reunião de hoje para alertar ”que as resoluções do Conselho sobre a proteção dos civis dos últimos 25 anos permanecem em grande parte ignoradas”.
“Os danos e o sofrimento causados aos civis em 2023 sinalizam uma alarmante falta de cumprimento do direito internacional humanitário e do direito internacional dos direitos humanos. (…) Devemos redobrar esforços para reforçar o cumprimento destas obrigações pelas partes em conflito”, apelou.
A secretário-geral adjunta pediu ainda o reforço da responsabilização por essas violações, incluindo a “defesa da independência e imparcialidade do Tribunal Penal Internacional (TPI)”.
Os apelos da representante da ONU surgem um dia após o procurador do TPI, Karim Khan, ter anunciado que solicitou mandados de captura para o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, e para o ministro da Defesa, Yoav Gallant, por crimes como “fome deliberada de civis”, “morte intencional” e “extermínio e/ou assassínio” relacionados com a operação israelita em Gaza.
O procurador do TPI solicitou também mandados de captura para três altos responsáveis do Hamas – Ismail Haniyeh, Mohammed Deif e Yahya Sinouar – por “extermínio”, “violação e outras formas de violência sexual” e “tomada de reféns como crime de guerra”, relacionados com o ataque do movimento islamita a Israel em 07 de outubro.
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