“Caso as ações do Serviço Nacional de Inteligência constituam violações graves da lei (…) os indivíduos poderão ser sujeitos a processo disciplinar e ou criminal. Significa isso que o grande poder que esta instituição tem exige uma grande responsabilidade dentro dos seus limites legais estabelecidos”, afirmou Longuinhos Monteiro.
Longuinhos Monteiro falava no Palácio do Governo em Díli por ocasião da transferência de responsabilidades como diretor-geral do Serviço Nacional de Inteligência, cargo para que foi nomeado no início do mês pelo primeiro-ministro, Xanana Gusmão.
Os comentários, perante o ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Agio Pereira, e outros responsáveis timorenses, destacam algumas das polémicas que nos últimos anos marcaram a atuação do SNI, com acusações de alegadas ações além das suas competências.
Sem se referir a casos concretos — o SNI chegou a estar envolvido em rusgas a casas do próprio Longuinhos Monteiro por alegada existência de armas de fogo — o novo diretor-geral do SNI disse que cabe à instituição olhar pela “salvaguarda dos interesses nacionais em todo os aspetos com competência externa e interna”.
O SNI, recordou, está “impedido de praticar atos que envolvam a violação dos direitos, liberdades e garantias consagradas na Constituição, ou que sejam da competência exclusiva das demais autoridades que exerçam as funções de segurança interna”, estando vedado aos seus agentes “proceder à detenção de pessoas e à instauração de processos de natureza criminal”.
Monteiro disse que o SNI não pode, em nenhuma circunstância, violar as regras processuais e violar os direitos fundamentais, “com objetivo de acusar que outra pessoa violou uma lei”, devendo ser “um modelo de conduta ética e legal”.
“É crucial que a SNI respeite esses princípios e contribua na manutenção da integridade do nosso sistema judiciário, que todos os processos corram nos seus procedimentos legais, e evitando contornar as leis em busca de resultados desejados”, disse.
“A confiança da nossa justiça depende da certeza de que as nossas polícias atuam em conformidade com as regras processuais, e não pela sua posição ou influência política”, disse.
Várias operações no último ano envolvendo elementos do SNI foram questionadas, incluindo na justiça, com críticas sobre se os efetivos ultrapassaram ou não as suas competências legais.
O chefe de Estado, José Ramos-Horta, que fez várias intervenções públicas críticas sobre esta questão, disse em janeiro à Lusa que alguns responsáveis de instituições de segurança em Timor-Leste atuam sem respeitar as leis e valores democráticos e com “total impunidade”.
Monteiro insistiu que “qualquer forma de violação das regras não tem lugar numa instituição encarregada de promover a segurança do Estado e dos cidadãos”, e comprometeu o SNI a atuar nas áreas críticas, como segurança cibernética e crimes relacionados.
Neste contexto, defendeu colaboração com congéneres internacionais para fortalecer as capacidades do SNI, partilhar informações e aprofundar conhecimentos, especialmente no espaço digital, áreas onde haverá formação especifica para os agentes.
Proteger infraestruturas críticas, incluindo do novo cabo submarino de fibra ótica, são outras áreas onde o SNI vai trabalhar, disse Monteiro.
Em entrevista à Lusa esta semana, o primeiro-ministro, Xanana Gusmão, disse que o SNI é um exemplo do que considera ser a “disfunção” de várias estruturas do Estado, com a nomeação pelo anterior Governo de pessoas “sem experiência” e sem capacidade.
“O SNI precisa de uma volta. Antes, cumpria o papel de serviço nacional de inteligência, a olhar para questões maiores, que afetam o país […]. Deixou de ter aquele espírito de visão de todo o país, de olhar para potenciais grandes ameaças que podem vir de fora”, afirmou.
Questionado sobre se o SNI foi usado para fins políticos, Xanana Gusmão considerou que o maior problema foi, “como ocorreu noutras estruturas do Estado”, terem sido colocados na liderança “pessoas dos partidos” do anterior Governo, “que não sabiam nada”.
“Se soubessem alguma coisa, tudo bem, mas não sabem nada. Esse é o grande problema de disfunção de todo o Governo. Tirar pessoas de cargos só porque eram do CNRT, colocando pessoas sem conhecimentos, experiência, sem memória institucional. De forma que temos de corrigir isso tudo”, afirmou.
Longuinhos Monteiro substituiu o anterior diretor-geral, Domingos da Câmara “Amico”, nomeado para o cargo em 2021 pelo anterior primeiro-ministro, Taur Matan Ruak, e cujo mandato deveria ter terminado em 2025.
Militar ativo nas forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), o coronel “Amico” foi exonerado na semana passada.
Citado pelo portal Hatutan, o ex-responsável do SNI disse rejeitar algumas das referências na carta de exoneração sobre a sua alegada parcialidade política na organização, enfatizando que nunca militou nem milita em qualquer força política.
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