
Há uma semana, o presidente americano revelou que tem a intenção de ficar com a Gronelândia "de uma forma ou de outra". E acrescentou: "Vamos conseguir. Vamos manter-vos em segurança. Vamos torná-lo rico e juntos vamos levar a Gronelândia a patamares como nunca se imaginou ser possível antes".
Argumenta que o país é essencial "para garantir a segurança" dos Estados Unidos da América (EUA), uma vez que é dali onde podem partir os primeiros disparos de mísseis inimigos em direção ao território americano.
No entanto, as sondagens dizem que os habitantes da ilha não querem fazer parte dos Estados Unidos, e a maioria quer a independência da Dinamarca. Afinal, quem decide o futuro do país?
Trump quer a Gronelândia, mas a Gronelândia não quer Trump
A Gronelândia é uma ilha localizada no norte do Oceano Atlântico, com 57 mil habitantes, que faz parte da América do Norte, mas politicamente é uma região autónoma da Dinamarca e as suas políticas externa, de defesa e monetária são decididas em Copenhaga.
A localização estratégica e os recursos da ilha começaram a interessar Donald Trump, que passou a incluir este país no seu discurso expansionista. De facto, a ilha situa-se ao longo da rota mais curta entre a Europa e a América do Norte, essencial para o sistema de alerta de mísseis balísticos dos EUA.
Um dos objetivos dos EUA é expandir a presença militar no território, pela colocação de radares para monitorizar as águas entre a ilha, a Islândia e a Grã-Bretanha, que são uma porta de entrada para navios e submarinos nucleares russos.
Até ao momento, os militares dos EUA têm uma base aérea em Pituffik, no noroeste da Gronelândia. Um acordo de 1951 com a Dinamarca estabeleceu o direito dos EUA de se movimentarem livremente e construírem bases militares na Gronelândia, desde que a Dinamarca e a Gronelândia sejam devidamente notificadas. Mas a vontade é estender a todo o território.
Além disso, Donald Trump expressou em várias ocasiões o desejo de que a ilha do Ártico passe a integrar os Estados Unidos pela pela possibilidade de conter grandes reservas inexploradas de minerais e petróleo. A capital da ilha, Nuuk, está mais próxima de Nova Iorque do que de Copenhaga, e tem riquezas minerais, petróleo e gás natural.
Questionado pela SIC Notícias sobre o assunto, um funcionário da Casa Branca afirmou: "A Gronelândia tem uma enorme reserva de minerais de terras raras que vão impulsionar a próxima geração da economia americana".
Qual é a vontade da Gronelândia?
Poucas horas depois de Trump ter declarado que tenciona ganhar o controlo da ilha, o primeiro-ministro da Gronelândia, Múte Bourup Egede postou uma mensagem simples no Facebook: "A Gronelândia é nossa".
O primeiro-ministro da Gronelândia, Múte Egede, é claro quando defende que não tem interesse em negociar com os EUA. Uma das suas prioridades é a independência, mas, depois das declarações de Donald Trump, esclareceu que não defende uma possível independência imediata. No que depender de Egede, esta reforma só será feita com a cooperação dos governos da Dinamarca e da Gronelândia.
Além disso, Mute Egede reiterou que os gronelandeses, que aspiram à independência, não querem ser dinamarqueses ou americanos. "Há uma ordem mundial que está a apostar em muitas frentes e um presidente dos Estados Unidos que é muito imprevisível, de tal forma que faz com que as pessoas se sintam inseguras", declarou à rádio pública da Dinamarca.
Para o primeiro-ministro, o presidente dos Estados Unidos é "muito imprevisível" e que, por isso, "as pessoas se sentem inseguras", numa entrevista divulgada esta segunda-feira (10), um dia antes das eleições legislativas no território dinamarquês.
"As coisas recentes que o presidente americano fez levaram-me a desistir de uma aproximação que já quis no passado", acrescentou.
"Nós merecemos ser tratados com respeito e não acho que o presidente americano tenha feito isso ultimamente, desde que assumiu o cargo", disse Egede.
O Parlamento da Gronelândia, preocupado com possíveis interferências estrangeiras nas eleições, aprovou uma lei que proíbe que partidos políticos recebam doações anónimas ou estrangeiras.
Após as eleições de terça-feira, será necessário estabelecer também um plano para a independência, com atenção especial para a diversificação da economia e o desenvolvimento de certas indústrias como o turismo, a extração de minérios e a energia verde, disse o primeiro-ministro.
O governante vê o futuro da Gronelândia "dentro da aliança ocidental". "Há questões de política de segurança e defesa que nos obrigam a estabelecer uma aliança com outros países com os quais já estamos aliados", nos quais não se incluem os EUA.
Qual o peso de decisão da Dinamarca?
A Gronelândia tem o seu próprio primeiro-ministro e gera as suas instituições públicas desde 1979 mas as decisões estratégicas, como os assuntos externos, a política monetária e a defesa, continuam sob o controlo dinamarquês. Apesar de lutar pela independência há várias anos, a Gronelândia continua a ter o apoio na Dinamarca contra o interesse dos EUA.
E, por isso, também o governo dinamarquês respondeu às declarações do presidente americano, dizendo: "Isso não acontecerá". O ministro da Defesa da Dinamarca, Trouls Lund Poulsen, disse ainda à imprensa estatal que "a escolha que a Gronelândia desejar tomar será decidida pelos gronelandeses".
Como funcionam as eleições na Gronelânida?
Nestas eleições serão escolhidos os 31 membros do parlamento da Gronelândia, o Inatsisartut. O sistema eleitoral gronelandês é baseado na representação proporcional do método d'Hondt para a atribuição de assentos.
A independência será uma das questões cruciais em jogo nas eleições legislativas de terça-feira.
Uma sondagem realizada pela Verian em janeiro revelou que o partido de esquerda Inuit Ataqatigiit poderia obter cerca de 31% e vencer o partido no poder, Siumut, por cerca de 9%.
Atualmente, o partido Inuit Ataqatigiit e o partido Simiut governam em coligação. O primeiro-ministro Mute Egede pertence ao partido com maior número de lugares, o Inuit Ataqatigiit, um partido de esquerda ecológico independente.
*Com AFP
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