Trata-se da segunda “greve cirúrgica”, como tem sido denominada pelos profissionais, depois de uma primeira paralisação idêntica em cinco grandes hospitais, que durou de 22 de novembro a 31 de dezembro, tendo levado ao cancelamento ou adiamento de quase oito mil cirurgias.

As duas greves foram convocadas por duas estruturas sindicais, embora inicialmente o protesto tenha partido de um movimento de enfermeiros que lançou publicamente recolhas de fundos para compensar os colegas grevistas que ficam sem ordenado por aderir à paralisação. Ao todo, para as duas greves, recolheram mais de 740 mil euros.

O modelo de greve é considerado inédito em Portugal, não só devido à sua duração como pela criação de um fundo de recolha de dinheiro para financiar os grevistas.

A greve que hoje começou na prática estava prevista para ter início a 18 de janeiro, mas os sindicatos suspenderam-na por quererem continuar a negociar com o Governo, negociações que quarta-feira terminaram sem consenso.

Porquê o nome de greve cirúrgica?

A greve foi denominada como cirúrgica não apenas por se realizar em blocos operatórios. Também porque pretendia ser uma paralisação feita por um reduzido número de enfermeiros e com um grande impacto nos hospitais, também financeiro, sendo dirigida apenas a um tipo de serviços (cirurgias).

É uma greve realizada por uma percentagem relativamente baixa entre os cerca de 43 mil enfermeiros do Serviço Nacional de Saúde, uma vez que apenas paralisam profissionais dos blocos operatórios de alguns hospitais.

Quando e onde é a greve?

A greve começou no dia 31 de janeiro às 08:00 e prolongar-se-á até ao dia 28 de fevereiro. O pré-aviso determina que a greve deveria ter começado no dia 18 de janeiro, mas a paralisação esteve suspensa até quarta-feira, porque decorriam reuniões de negociação com o Governo.

Até dia 7 de fevereiro, o pré-aviso abrange sete centros hospitalares: Centro Hospitalar S. João (Porto), Centro Hospitalar e Universitário do Porto, Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga, Gaia/Espinho, Tondela/Viseu, Braga e Garcia de Orta.

Entre dia 8 e 28 de fevereiro a greve decorre também no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Centro Hospitalar Lisboa Norte e Centro Hospitalar de Setúbal.

A greve é só nos blocos operatórios?

O pré-aviso de greve abrange todos os enfermeiros dos centros hospitalares referidos. Mas o movimento de enfermeiros que fez recolha de fundos para financiar os grevistas indica que a verba só fica garantida para os profissionais do bloco operatório desses hospitais.

Quem decretou a greve?

A paralisação foi decretada por dois sindicatos: Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor) e Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE).

A ideia da primeira greve e a criação de um “fundo solidário” partiu de um movimento espontâneo de profissionais que se auto denomina “Movimento Greve Cirúrgica”

Todas as cirurgias serão canceladas?

São afetadas as cirurgias programadas, dependendo da quantidade de enfermeiros que aderem à greve. A paralisação pode afetar até algumas cirurgias oncológicas com menor grau de prioridade. Contudo, as operações consideradas urgentes serão sempre realizadas, porque há serviços mínimos a cumprir, como em qualquer greve no setor da saúde.

Serviços mínimos

Há serviços mínimos decretados para esta greve, como qualquer outra no setor da saúde. Na primeira greve cirúrgica, os enfermeiros foram até além do que está estabelecido nos serviços mínimos, por acordo com os hospitais.

Os serviços mínimos estabelecidos para estas greves prolongadas às cirurgias foram já criticados pela Ordem dos Médicos e pela Associação dos Administradores Hospitalares, que os consideram insuficientes.

Que impactos podem ter a greve?

A primeira greve, que durou mais de um mês e decorreu em cinco hospitais, levou ao cancelamento de quase 8.000 cirurgias.

Das cirurgias que foram adiadas, o Ministério da Saúde diz que foi possível realizar já 45% até ao final deste mês.

O que diz o Ministério da Saúde?

A ministra da Saúde, Marta Temido, equaciona usar meios jurídicos face à nova greve dos enfermeiros, por entender que levanta “um aspeto muito sério sobre questões éticas e deontológicas”.

A greve é lícita?

Aquando do primeiro período de greve, no final do ano passado, o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República considerou que é lícita a convocatória da greve dos enfermeiros, mas alertou que caso caiba a cada enfermeiro decidir o dia, hora e duração da greve, o protesto é "ilícito".

Esta é a conclusão de um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR), solicitado pelo Ministério da Saúde e que só o divulgou parcialmente.

Sobre a possibilidade de recorrer à requisição civil, a ministra da Saúde tem afastado essa hipótese, considerando até que é uma “opção extrema” e que só se usa quando não há cumprimento de serviços mínimos.

Porquê blocos de cirurgia de centros hospitalares?

O movimento de enfermeiros que impulsionou a greve às cirurgias afirma que cancelando e adiando cirurgias isso causará “constrangimentos económicos ao Estado”.

Segundo dados divulgados pelo jornal Público, a primeira greve teve um impacto de pelo menos 12 milhões de euros em quatro dos cinco hospitais onde se realizou.

Como foi feita a recolha de donativos para apoiar os enfermeiros que façam greve?

O movimento “greve cirúrgica” criou, através de uma plataforma na Internet, uma recolha de fundos. Para a primeira greve foram recolhidos mais de 360 mil euros. Para a greve que hoje começa, os enfermeiros conseguiram mais de 420 mil euros.

A quem se destina o dinheiro?

O fundo serve para financiar os enfermeiros dos blocos que adiram à paralisação. Serão dados 42 euros por cada dia de greve que seja descontado do vencimento. Segundo a página criada pelo movimento, o dinheiro será transferido para a conta dos enfermeiros nos dias seguintes à entrega da folha de vencimento onde estejam discriminados os dias em que o profissional fez greve.

O que reivindicam os enfermeiros?

Os enfermeiros têm apresentado queixas constantes sobre a falta de valorização da sua profissão e sobre as dificuldades das condições de trabalho no Serviço Nacional de Saúde. Lembram que os enfermeiros levam para casa menos de mil euros líquidos por mês e que cumprem muitas horas extraordinárias que não lhes são pagas.

Os sindicatos conseguiram chegar a acordo com o Governo quanto à criação de uma carreira com três categorias, incluindo a de enfermeiro especialista. Contudo, não houve consenso quanto ao descongelamento das progressões para todos os profissionais, quanto ao aumento do salário base (atualmente de 1.200 euros brutos) e quanto à antecipação da idade da reforma.

A Greve criou crispação entre Governo e enfermeiros?

O Governo e os sindicatos dos enfermeiros estiveram em negociações até aos últimos dias de janeiro, uma vez que retomaram o processo negocial mesmo depois da primeira greve cirúrgica.

Contudo, logo na primeira greve, o Ministério da Saúde e o Governo tinham considerado a paralisação como muito agressiva.

Entretanto, já depois da segunda greve, o Ministério suspendeu relações instituições com a Ordem dos Enfermeiros por declarações da bastonária Ana Rita sobre a greve cirúrgica.

O primeiro-ministro, António Costa, veio ainda anunciar que iria apresentar na justiça uma queixa contra a bastonária por considerar que violou a lei das ordens profissionais no que respeita à proibição de promoção da atividade sindical.


Notícia atualizada quinta-feira, dia 7 de fevereiro, às 22:06