“Eu acho que os senhores [do governo] lá em Lisboa não conhecem o território e legislam uma coisa que não é exequível nesta freguesia”, lamentou Glória Pacheco, em declarações à agência Lusa.
Em Longueira-Almograve, uma das duas freguesias do concelho de Odemira (Beja) que está sob cerca sanitária devido à covid-19 - a outra é São Teotónio -, não há “uma farmácia”, nem “existe um centro de testagem”, disse a autarca.
“A farmácia que nós temos mais perto está fora da cerca, a nove quilómetros, em Vila Nova de Milfontes [outra freguesia]. Para comprar um teste, têm de saltar a cerca e, para a ir a São Teotónio, fazem o dobro dos quilómetros”, esclareceu, criticando a medida adotada pelo Governo, por não se adequar à realidade.
Na quinta-feira, em Conselho de Ministros, o Governo decidiu que a cerca sanitária em vigor, desde dia 30 de abril, nas freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve vai manter-se, devido à elevada incidência de casos de covid-19, mas definiu "condições específicas de acesso ao trabalho".
A entrada nas freguesias de São Teotónio e Longueira-Almograve para o “exercício de atividades profissionais” e para o “apoio a idosos, incapacitados ou dependentes e por razões de saúde ou por razões humanitárias” depende da apresentação de comprovativo de teste PCR negativo realizado nas 72 horas anteriores ou de teste rápido antigénio negativo realizado nas 24 horas anteriores, segundo um despacho publicado, na sexta-feira à noite, em Diário da República.
A saída das duas freguesias pelos mesmos motivos depende também de apresentação de novo teste rápido de antigénio com resultado negativo, realizado nas 24 horas anteriores, de acordo com o mesmo despacho.
Na exposição de motivos do diploma, o Governo sublinhou a necessidade de “estabelecer as condições para, a título excecional, ser permitida a circulação de trabalhadores de serviços essenciais, bem como de trabalhadores de um conjunto de explorações agrícolas que importa salvaguardar, sem descurar a defesa da saúde pública”.
Os encargos com os testes realizados a trabalhadores sazonais afetos a explorações agrícolas e do setor da construção são da responsabilidade da empresa utilizadora ou beneficiária final dos serviços prestados, ficou estabelecido no despacho.
Segundo a presidente da junta de freguesia, “isto mexe muito com as pessoas que também não têm transportes” e “com a parte financeira de cada um”.
“Quem é que tem dinheiro para ir constantemente a São Teotónio comprar um teste”, questionou Glória Pacheco, argumentando que “a população está toda descontente” e que os habitantes sentem-se “discriminados”.
A autarca contou ainda que já ponderou “entregar as chaves” da junta, porque está “constantemente” a receber telefonemas de pessoas “indignadas”, que questionam o que devem fazer: “Não sei se não está também aqui em causa uma questão de direitos humanos”.
“É uma sensação de impotência. Afinal, a junta de freguesia só serve para limpar o lixo. É uma vergonha o que se está a passar”, lamentou.
No despacho, o Governo determina ainda que as entidades empregadoras dos trabalhadores agrícolas, que pretendam entrar nas duas freguesias do concelho de Odemira para prestação de trabalho sazonal, “têm de transmitir à Direção Regional de Agricultura e Pescas do Alentejo os pedidos de acesso desses trabalhadores, indicando o dia e local de entrada e os locais de alojamento, para avaliação das condições de habitabilidade dos mesmos pela autoridade local de saúde e para fiscalização e controlo de acessos pela GNR”.
O diploma, assinado pelo ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, e pela ministra da Saúde, Marta Temido, entrou em vigor às 08:00 de sábado.
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