Quinze anos depois da última conferência, entre 900 e 1.000 delegados comunistas de todo o país, número previsto pelo partido, são chamados a debater e direcionar a intervenção do PCP nos próximos anos, no Pavilhão do Alto do Moinho, em Corroios, no Seixal, distrito de Setúbal.
A Conferência Nacional “Tomar a iniciativa, reforçar o partido, responder às novas exigências” vai reafirmar as conclusões do último congresso do PCP, que se realizou em novembro de 2020, reenquadrando-as às novas realidades nacional e internacional, com a aprovação de uma Resolução Política.
O secretário-geral cessante, Jerónimo de Sousa, fará uma intervenção na abertura dos trabalhos, no sábado, e já será Paulo Raimundo, após eleito líder na reunião do Comité Central, à noite, a encerrar a conferência, no domingo.
Ouvidos pela Lusa, os dirigentes comunistas Margarida Botelho, Bernardino Soares, João Oliveira, Paula Santos e Alma Rivera concordam que as conclusões do último congresso “continuam atuais” - a mesma expressão foi utilizada pelos cinco membros do Comité Central - mas a situação do país e do mundo alteram-se substancialmente desde então.
“Cá dentro”, explicou um dos dirigentes, a maioria absoluta do PS na Assembleia da República, o fim da influência do PCP junto das decisões do Governo que vinha desde 2015, a “inflação galopante e a degradação das condições de vida dos trabalhadores e do povo” obrigam a uma reflexão mais alargada por parte de todas as estruturas do PCP.
Lá fora, os comunistas têm de olhar para a incerteza quanto à evolução da guerra na Ucrânia, as tensões crescentes entre Washington e Pequim por causa de Taiwan, o crescimento da extrema-direita em países europeus, como Itália, Suécia, Hungria e Polónia, e em oposição o ressurgimento de governos de esquerda na América do Sul, como é o caso do Brasil, da Colômbia e do Chile.
Por isso, a direção do PCP sentiu a necessidade de recorrer pela quarta vez a este formato, para conseguir 'limar arestas' e focar a intervenção, numa altura em que a nível nacional o parlamento deixa de ser o centro da intervenção política, por causa da maioria absoluta socialista.
Em 16 páginas, divididas por seis pontos, os comunistas apresentaram um projeto de resolução para a conferência, onde é assumido, entre outros, o objetivo de reforçar a sua estrutura com “1.000 novos quadros, com destaque para operários e outros trabalhadores, jovens e mulheres, por tarefas regulares e organizações do partido” nos próximos dois anos.
A direção comunista considera que colocar “nas mãos de mais militantes a responsabilidade” e o papel de “protagonistas e construtores” vai levar ao “aperfeiçoamento do estilo de trabalho” e a uma “mais ampla ação” do partido.
O recrutamento de mais militantes faz parte de um esforço para reestruturar o PCP e contrariar a “ofensiva antidemocrática, com forte pendor anticomunista” – uma das justificações apontadas para o declínio eleitoral do partido que foi amplamente verbalizada por dirigentes nos últimos anos.
O desenvolvimento e intensificação da “luta dos trabalhadores e das massas populares”, através do trabalho de proximidade com as estruturas sindicais, nomeadamente a CGTP, também faz parte do objetivo de alcançar a “política alternativa, patriótica e de esquerda” - expressão quase sempre presente nas intervenções do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa – que o partido preconiza.
A Conferência Nacional ficaria circunscrita a estes assuntos, mas o anúncio da renúncia de Jerónimo de Sousa ao cargo de secretário-geral do PCP, no último sábado, invocando razões de saúde, e a consequente escolha de Paulo Raimundo para o substituir, vão dominar uma parte da discussão.
Na noite de sábado, após o encerramento dos trabalhos, os 129 membros do Comité Central (Jerónimo de Sousa e Paulo Raimundo incluídos) vão reunir-se para votar a proposta que partiu do Secretariado (órgão mais restrito da direção comunista) para ser o quarto líder em democracia.
Em conferência de imprensa, no último domingo, Jerónimo de Sousa admitiu que o nome escolhido provocou “alguma surpresa”, mas foi acolhido pela maioria dos dirigentes do PCP.
Dirigentes contactados pela Lusa disseram que Paulo Raimundo incorpora algumas das “características humanas” que Jerónimo de Sousa tem e que é um dirigente “mais próximo do português comum” e com os qual as pessoas “se identificam, porque conhece os seus problemas, conhece as suas dificuldades”.
No entanto, este quadro proeminente do PCP é um desconhecido para o público em geral, mas os outros dirigentes ouvidos pela Lusa não olham para este dado como relevante. Certo é que pela primeira vez em 18 anos, desde que Jerónimo chegou à liderança, o líder do partido não vai estar no parlamento, e Paulo Raimundo vai depender das iniciativas nas ruas para se dar a conhecer e para se afirmar como secretário-geral.
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