“Relativamente à hipotética injustiça, os agricultores de todos esses concelhos [afetados pelo incêndio de Pedrógão Grande] tiveram medidas de apoio disponíveis de 100 euros para cima, portanto só não recorreu a elas quem não quis, só que com diferentes fontes de financiamento”, afirmou Luís Capoulas Santos, em declarações numa audição na comissão eventual de inquérito parlamentar à atuação do Estado na atribuição de apoios na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior.
Aos deputados desta comissão da Assembleia da República, o ministro da Agricultura no primeiro Governo de António Costa, entre 2015 e 2019, rejeitou a ideia de que houve agricultores a candidatarem-se à medida simplificada de apoio para prejuízos até 5.000 euros, porque apesar dos prejuízos serem superiores a esse valor, não tinham capacidade para elaborar um processo de candidatura ao regime de aplicação do apoio 6.2.2. - Restabelecimento do potencial produtivo, através do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR).
“Uma situação absolutamente absurda, porque não acredito que alguém que esteja carente de receber o apoio financeiro não esteja disponível para fazer o esforço mínimo de ir a um gabinete de projeto e pedir para lhe fazer uma candidatura”, sustentou Luís Capoulas Santos, indicando que o custo da elaboração da candidatura era financiado a 100%.
Sobre a opção de usar o instrumento financeiro do PDR, o ex-ministro defendeu que “compete a qualquer governante fazer uma boa gestão dos dinheiros públicos”, explicando que a medida comunitária é financiada a 85%, ou seja, em cada 1.000 euros a União Europeia dá 850 euros ao Estado português.
Para o ex-governante, “só um gestor imbecil” optaria por usar 100% do Orçamento do Estado quando tem outros instrumentos de financiamento disponíveis.
“O que é que ficou de fora? Que saiba não ficou nada de fora, na reposição do potencial produtivo está tudo […]. Não há nada numa exploração que seja potencial produtivo que não seja indemnizável”, reforçou Capoulas Santos, referindo que foi atribuído apoio para todos os animais, todas as instalações agrícolas, todas as máquinas e alfaias etodas as plantações permanentes afetadas pelo incêndio de Pedrógão Grande.
Questionado sobre as diferenças de apoios aos agricultores aquando do incêndio de Pedrógão e nos incêndios de outubro de 2017, o ex-ministro da Agricultura garantiu que “não houve nenhuma diferença, quer nos níveis de apoio, quer nos montantes de apoio, o que houve de diferente foi as fontes de financiamento, de acordo com o instrumento financeiro que estava disponível a cada momento”.
Sobre as queixas recebidas pela provedora de Justiça, o ex-governante adiantou que o pedido de reabertura do processo de candidaturas aos apoios aos agricultores diz respeito aos incêndios de outubro de 2017 e foi recusado porque tinha passado mais de um ano, pelo que seria difícil comprovar os prejuízos nessa altura.
Quanto ao relatório do Tribunal de Contas sobre o incêndio de Pedrógão Grande, Capoulas Santos manifestou “indignação”, argumentando que há referências “completamente absurdas” sobre a atribuição e fiscalização dos apoios aos agricultores.
Classificando os incêndios de junho e de outubro de 2017 como “verdadeiros cenários de guerra”, o ex-ministro socialista destacou como “verdadeiros heróis” os funcionários do Ministério da Agricultura, recordando que tinha sido ministro há 15 anos e deixou 15.000 funcionários e que quando regressou em 2015 encontrou 5.000 funcionários.
Neste âmbito, Capoulas Santos aproveitou para lembrar a “profunda reforma da floresta”, processo que teve início em 2016, mas que é “uma reforma de longo prazo, de longo folgo, que para ser bem sucedida não pode ser descontinuada, nem pode perder o ritmo”, realçando o cadastro, “que esteve vários meses no congelador na Assembleia da República”, e a nova competência dos municípios nas autorizações de arborização e rearborização.
“Queríamos avançar com o cadastro tão rapidamente quanto possível e espero que esse ritmo não seja abrandado, porque em muitos casos, se se quiser multar a pessoa que tem uma plantação ilegal e não se sabe quem ela é, o poder coercivo do Estado não tem qualquer hipótese de atuar”, declarou o ex-governante.
O incêndio que deflagrou em 17 de junho de 2017 em Escalos Fundeiros, no concelho de Pedrógão Grande, e que alastrou depois a municípios vizinhos, nos distritos de Leiria, Coimbra e Castelo Branco, provocou 66 mortos e 253 feridos, sete deles com gravidade, e destruiu cerca de 500 casas, 261 das quais eram habitações permanentes, e 50 empresas.
Já as centenas de incêndios que deflagraram em 15 de outubro, o pior dia de fogos de 2017 segundo as autoridades, provocaram 49 mortos e dezenas de feridos. Esta foi a segunda situação mais grave de incêndios com mortos em Portugal, depois de Pedrógão Grande.
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