O estudo “O Perfil do Autor em Portugal” foi hoje apresentado na Sociedade Portuguesa de Autores (SPA), em Lisboa, e resulta da investigação de uma equipa liderada pelo sociólogo Paulo Castro Seixas, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa, com o sociólogo Ricardo Cunha Dias e a mestranda em Política Social Inês Subtil, elaborada no âmbito do Centro de Administração e Políticas Públicas do ISCSP.
O estudo teve como universo o número de associados e cooperadores da SPA, num total de 26.000 inscritos, e levou Paulo Castro Seixas a afirmar que “a atividade de autoria em Portugal parece ser dominada por uma certa precariedade”, uma vez que testemunha o seu caráter secundário, fonte de um rendimento de “valor ínfimo", num perfil predominante de um autor do sexo masculino, com mais de 45 anos, da área musical, originário do litoral, em particular das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, que consegue ganhar mensalmente "entre um ou dois salários mínimos", se se dedicar a outras atividades.
Neste trabalho, que apresenta vários dados e quadros estatísticos relativamente à atividade autoral, como a “territorialização da autoria”, os escalões etários, as atividades dominantes e áreas de criação, é afirmado que “os autores não vivem em geral (apenas) da autoria”.
“De facto, os direitos de autor representam, para a grande maioria, um valor ínfimo do seu rendimento, ainda que se possa dizer que os autores têm um nível médio de rendimentos acima do dos trabalhadores portugueses como um todo, mas resultado das atividades não autorais”.
Refere ainda o estudo que, “maioritariamente, a autoria é considerada uma atividade criativa e não uma ocupação profissional, e mais uma ocupação secundária do que uma ocupação principal na grande parte dos percursos, provavelmente justificada pelo facto de [os autores] não conseguirem subsistir exclusivamente da atividade autoral”.
O “rendimento auferido pelos autores está entre um e dois salários mínimos, sendo que a percentagem do rendimento que advém dos direitos de autor se mostra insignificante para a larga maioria dos casos”.
Uma questão, que segundo os investigadores, pode explicar o “paradoxo na autoria entre satisfação própria, face ao grau de produção, e insatisfação no reconhecimento recebido por essa mesma produção".
Quanto a escalões etários, mais de dois terços dos associados da SPA estão acima dos 45 anos (67,6%): mais de um quarto, 28,2%, ultrapassa os 66 anos, 18,9% estão entre os 56 e os 65 anos, 20,5%, entre os 46 e os 55 anos, e 23,4%, entre os 36 e os 45 anos. Os autores com 35 anos ou menos são apenas dez por cento do total, e 1,8% tem idade igual ou inferior a 25 anos.
Do ponto de vista da territorialização, afirma-se no estudo que “há uma tendência clara para as duas áreas metropolitanas [Lisboa e Porto] e para um centralismo na Área Metropolitana de Lisboa”, por outro lado, “há uma grande assimetria entre o número de autoras e autores”.
“No geral, os homens são seis vezes mais do que as mulheres”, afirma o estudo, agora publicado.
Por outro lado, segundo o documento, “quem nasce no distrito de Lisboa tem cerca de 40 vezes mais possibilidade (e no Porto 15 vezes mais) de se tornar autor do que quem nasce em Viseu, Évora, Castelo Branco, Vila Real, Bragança ou Viana do Castelo”.
“Um outro argumento é uma centralidade dos distritos ‘mesometropolitanos’: Aveiro, Coimbra e Leiria [que] surgem exatamente como os distritos de nascimento de autores a seguir a Lisboa e ao Porto”, o que leva os investigadores a concluir que “a litoralização do desenvolvimento do país e, especificamente, a ‘mesometropolização’ de tal desenvolvimento, parece ser explicativa da produção cultural da autoria”.
Remetendo para o universo estudado, os 26.000 inscritos na SPA, cerca de 67% dos autores-beneficiários são originários destes cinco distritos.
Relativamente ao digital, “cerca de 75% dos autores-beneficiários considera que influencia a sua estratégia de publicação/produção [e] mais de 80% considera que o digital influencia a divulgação da sua obra”.
Por outro lado, “cerca de 66% concorda que o digital influencia o seu sucesso [e] cerca de 55% que a sua estratégia de financiamento é influenciada pelo digital, e uma percentagem idêntica considera que o digital condiciona a defesa dos seus direitos de autor (54%)".
O estudo apresenta dados sobre questões como “Quem são os autores em Portugal?”, a sua escolaridade, formação e profissão, e até as fontes de inspiração, o “contexto de produção e redes de socialização”, a “gestão de carreira, rendimento e direitos de autor”.
Quanto às principais formas pelas quais os autores procuram inspiração criativa, é referenciado “o isolamento, a solidão, o silêncio, a concentração, a meditação, a reflexão, a noite”, e, quanto às “fontes de inspiração”, hierarquicamente, de forma “clara”, foram referidas a “experiência de vida, emoções, obras de outros autores, viagens, natureza e outras culturas”.
Segundo os investigadores, “uma boa parte dos autores tem ou teve um familiar próximo autor, colocando a hipótese da autoria como produção antroponímica, ou seja, uma produção cultural reprodutiva ao nível familiar, e, portanto, parte do próprio ‘trabalho’ de reprodução familiar e, nesse sentido, uma reprodução intergeracional”.
Quanto ao universo do estudo, a inscrição de autores na SPA evoluiu segundo três momentos, “logo a seguir ao 25 de Abril de 1974”, “no final dos anos 1980, período que coincide com uma importância dada à economia da cultura na Europa, a uma melhoria económica em Portugal e a um período de abertura do mercado com a entrada de Portugal na União Europeia”, e o ano 2001, que, segundo os investigadores, se pode tratar “de um fenómeno de início de século e de milénio, não sendo de menosprezar a coincidência com eventos culturais como a Expo’98 e Porto Capital Europeia da Cultura-2001”.
No sentido inverso, são notados momentos de “desaceleração” entre 1996 e 2000, entre 2001 e 2004, assim como entre 2008 e 2012.
“As inscrições na SPA evidenciam ainda uma enorme assimetria entre a entrada de homens e de mulheres, em particular, na indústria musical, em que os homens são cerca de 20 vezes mais”.
Sobre a SPA, entre outras conclusões, “quase 82% dos autores-beneficiários consideram que a relação com a SPA é 'Boa' ou 'Muito Boa' e, no caso dos autores-Cooperadores, a percentagem dos que consideram a relação 'Boa' ou 'Muito Boa' atinge os 97,1%.”
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