Ao projeto de lei do PS — que tinha sido anunciado pelo líder, Pedro Nuno Santos, durante o debate do Programa do Governo de Luís Montenegro no início de abril — juntaram-se os de BE e PCP e ainda os projetos de resolução (sem força de lei) de IL, PSD/CDS-PP, PAN e Chega.
Com a atual geometria da Assembleia da República e com os partidos a não adiantar ainda à Lusa qual será o sentido de voto nas diferentes iniciativas, o desfecho destas votações é ainda uma incógnita.
Em declarações à agência Lusa, a deputada do PS Isabel Ferreira defendeu que os socialistas têm “sido coerentes no compromisso com a redução gradual nas taxas de portagem até à sua eliminação”.
“Fizemos em 2021 um desconto de quantidade de 25% logo em janeiro, depois em julho de 2021 uma redução de 50% e agora desde janeiro deste ano uma redução de 65%”, recordou, referindo-se à governação do PS que integrou como secretária de Estado do Desenvolvimento Regional.
O “esforço adicional” para que as portagens sejam agora eliminadas na totalidade, de acordo com Isabel Ferreira, tem uma “perspetiva de coesão territorial porque reduz encargos de quem não tem alternativa e também permite proporcionar o acesso devido a bens e serviços essenciais”.
A proposta do PS pretende terminar com as portagens na A4 – Transmontana e Túnel do Marão, A13 e A13-1 -Pinhal Interior, A22 – Algarve, A23 – Beira Interior, A24 – Interior Norte, A25 – Beiras Litoral e Alta e A28 — Minho nos troços entre Esposende e Antas e entre Neiva e Darque.
“Esta era uma medida que constava do programa eleitoral do PS”, acrescentou, adiantando que a proposta tem um custo estimado de 157 milhões de euros.
De acordo com a deputada do PS, os socialistas estão a ser coerentes ao apresentar uma proposta “exequível, justa e oportuna” e também seguindo a trajetória que os socialistas fizerem de “redução gradual” das portagens nas antigas SCUT.
“Esperemos que a proposta seja aprovada porque é uma questão de comprometimento com territórios onde não há alternativa [para circular em segurança]. É mais do que justo do ponto de vista da coesão territorial e deve mobilizar e comprometer todos os partidos”, apelou.
Confrontada com o facto de o PS, então com maioria absoluta, ter chumbado em 2023 projetos do PSD, Chega e PCP para acabar com o pagamento de portagens, Isabel Ferreira explicou que então o Governo estava “num processo ainda de redução gradual das portagens, com um grupo de trabalho criado para estudar essa diminuição de custos de contexto associados às questões da mobilidade e da descarbonização”.
Na mesma linha e apenas com algumas diferenças nas vias abrangidas são os projetos de lei do BE e PCP.
Os bloquistas pretendem eliminar as portagens para as autoestradas de acesso às regiões do interior (A22, A23, A24, A25, A28, A29, A41, A42) e os comunistas querem abolir este pagamento na A4, A13, A22, A23, A24, A25, A28, A29, A41 e A42.
Os partidos do Governo, PSD e CDS-PP, juntaram-se num projeto de resolução que recomenda a redução gradual e financeiramente responsável de portagens no interior e nas grandes áreas metropolitanas, pretendendo que o executivo apresente ao parlamento os custos envolvidos com a adoção desta medida e um estudo que fixe os valores base que acautelem os custos de manutenção das vias”.
Também sem força de lei, o Chega leva ao debate um projeto de resolução que prevê a implementação de um plano gradual de isenção do pagamento de portagens, a IL recomenda ao Governo que avalie o custo-benefício de isentar de portagens as antigas SCUT e o PAN sugere a renegociação dos contratos de parcerias público-privadas do setor rodoviário.
Portagens em autoestradas contestadas ao longo dos anos
A introdução de portagens em autoestradas portuguesas tem sido motivo, nas duas últimas décadas, da contestação de populações, autarquias, empresas e partidos, suscitando também vários debates parlamentares.
Na quinta-feira, o tema volta a estar em discussão no plenário da Assembleia da República, com três projetos de lei do PS, do BE e do PCP para a eliminação de portagens em várias autoestradas, e com projetos de resolução (sem força de lei) da IL, do PSD e do CDS, do PAN e do Chega para isentar ou reduzir as taxas, inclusive de forma gradual.
Em causa estão, consoante a proposta, várias autoestradas que já foram SCUT (sem custos para o utilizador): A4, A13 e A13-1, A22, A23, A24, A25, A28, A29, A41 e A42.
Na anterior legislatura, com o PS no Governo, foram aplicadas algumas reduções em portagens, tendo agora o partido requerido um novo debate, ao abrigo do direito dos grupos parlamentares de fixarem algumas ordens do dia no plenário.
Eis uma síntese de alguns processos de contestação pela cobrança de portagens em ex-SCUT:
A4
Quando, em 2010, foram introduzidas portagens em algumas SCUT, o distrito de Bragança ainda não tinha um quilómetro de autoestrada (a Autoestrada Transmontana seria inaugurada em setembro de 2011) e chegar a Vila Real fazia-se sem o Túnel do Marão da A4, apenas concluído em 2016, após cerca de três anos de paragem nas obras.
Autarcas, partidos, empresários, associações e utentes sempre disseram não às portagens, tanto na ligação da Autoestrada Transmontana, entre Bragança e Vila Real, como na Autoestrada do Marão, entre Amarante e Vila Real, e a contestação chegou até à Assembleia da República com uma petição e projetos de resolução contra a cobrança e em defesa da interioridade, sem qualquer sucesso.
Em 2016, quando foram anunciados descontos nas portagens num troço da A4, empresários de Vila Real falaram num “analgésico” para ir colmatando os problemas da região.
O Orçamento do Estado para 2024 incluiu a A4 nos descontos a aplicar a autoestradas com portagens, mas o setor do granito reivindicou “mais oxigénio” por parte do Governo, lamentando a redução do custo das portagens em apenas 13% para os veículos pesados.
A13
A introdução de portagens na A13, conhecida como Autoestrada do Pinhal Interior (de Coimbra à Marateca, ligando as sub-regiões de Coimbra, Leiria e Médio Tejo), foi contestada por autarquias, movimentos e associações empresariais.
Logo em dezembro de 2011, dois meses depois da cobrança, a Câmara de Vila Nova da Barquinha anunciou que iria avançar para as vias judiciais. No ano seguinte, os municípios do Médio Tejo defenderam que uma "redução significativa das tarifas" na A13 provocaria o aumento das receitas de circulação.
Posteriormente, a Comunidade Intermunicipal do Pinhal Interior Norte pediu ao Ministério da Economia a revisão em baixa do preço das portagens da A13 e manifestou o seu desagrado pela “discriminação negativa” a que o território estava sujeito.
A contestação não esmoreceu e, em outubro de 2016, o Movimento de Utentes dos Serviços Públicos do distrito de Santarém apelou ao Governo que inscrevesse no Orçamento do Estado para 2017 a abolição das portagens na A13 (e também na A23).
Em fevereiro de 2020, as associações empresariais dos concelhos de Lousã, Miranda do Corvo, Penela e Vila Nova de Poiares defenderam o fim imediato da cobrança, alegando que, como este território se viu privado do Sistema de Mobilidade do Mondego, de alternativa à Estrada da Beira (EN17), e de uma ligação digna ao Itinerário Principal (IP) 3, a A13 era uma importante via para o desenvolvimento económico e turístico.
Três anos depois, a Comissão de Utentes dos Serviços Públicos do Médio Tejo realizou em Torres Novas uma concentração popular para exigir a abolição das portagens nas autoestradas A13 e A23, onde foram apresentadas mais de 12.500 assinaturas recolhidas em 13 municípios com esse fim.
A22
A contestação à cobrança de portagens na também denominada Via do Infante, antiga SCUT que atravessa o Algarve, iniciou-se em 2005, alguns anos antes da aplicação da medida, por deputados, autarcas de várias forças políticas e entidades económicas da região, após o Governo de então ter anunciado a intenção de impor o pagamento.
Em 2010, um ano antes da entrada em vigor dos pagamentos, o que ocorreu em 08 de dezembro de 2011, os protestos assumiram maior visibilidade através da Comissão de Utentes da Via do Infante, um movimento cívico criado por um grupo de sete pessoas a que se juntaram outras dos diversos setores da sociedade.
O movimento promoveu diversas iniciativas de protesto, entre marchas lentas, abaixo-assinados, manifestações, concentrações à porta da Assembleia da República e até de habitações onde governantes gozavam férias no Algarve.
A um dos protestos juntou-se uma delegação composta por autarcas, militantes de partidos políticos, dirigentes empresariais e sindicalistas oriundos da Andaluzia, em Espanha, alegando que o pagamento afetava negativamente a economia dos dois países.
A A22, também conhecida como Via do Infante de Sagres, atravessa longitudinalmente a região do Algarve, entre Lagos e Castro Marim, terminando na Ponte Internacional do Guadiana, com ligação a Espanha.
A23, A24 e A25
A contestação ao pagamento de portagens nas autoestradas A23 (Guarda/Torres Novas), A24 (Viseu/Chaves) e A25 (Aveiro/Vilar Formoso) começou ainda antes de a medida estar no terreno (o que ocorreu em dezembro de 2011), com comissões de utentes, movimentos e comunidades intermunicipais a prometerem não baixar os braços contra o que consideravam ser um atentado económico e social ao interior do país e um entrave à coesão territorial.
Em setembro de 2011, a comissão de utentes das três autoestradas mostrou-se descontente com a possibilidade da cobrança e apelou à desobediência e ao protesto nas ruas, o que viria a acontecer logo no mês seguinte, com marchas lentas em vários pontos da região Centro, que depois se foram repetindo ao longo dos anos.
Ainda o ano não tinha acabado e a Comissão de Utentes da Autoestrada da Beira Interior (A23) já estava a entregar na residência oficial do primeiro-ministro, em Lisboa, mais de 20 mil assinaturas contra a introdução de portagens.
Na mesma altura, o Movimento Pró IP6 anunciou a interposição de duas ações judiciais nos tribunais de Abrantes e de Leiria numa tentativa de terminar com a cobrança de portagens na A23 e reclamar o ressarcimento do que os automobilistas tinham entretanto pagado.
As iniciativas de protesto foram-se sucedendo ao longo dos anos, sendo delas exemplo as marchas lentas e os buzinões promovidos pela Plataforma pela Reposição das SCUT nas Autoestradas 23 e 25 e a ação popular contra a cobrança de taxas apresentada no Tribunal Administrativo de Viseu pela comissão de utentes das autoestradas A23, A24 e A25.
Em fevereiro de 2019, o parlamento chumbou projetos de resolução do PCP, BE e PEV que recomendavam a eliminação das portagens nas três autoestradas (e também na A22).
A28
Desde 2008, mal se vislumbrou a possibilidade de introdução de portagens na A28, que autarcas, empresários e movimentos do distrito do Porto, de Viana do Castelo e da Galiza contestaram a opção, concretizada em outubro de 2010.
Buzinões, marchas lentas e outros protestos populares prolongaram-se por vários meses e a imprensa espanhola chegou mesmo a classificar a ex-SCUT A28 como as “mais cara autoestrada da Europa”, por obrigar os automobilistas estrangeiros a desembolsar 77 euros para percorrer 76 quilómetros.
A contestação nunca terminou e o Orçamento do Estado para 2024 serviu para novos lamentos e reivindicações, desta vez devido à exclusão da A28 da redução de 30% aplicada a algumas ex-SCUT.
Autarcas, partidos e empresários criticaram a falta de alternativas e penalização da região, nomeadamente nas relações com a Galiza.
O Alto Minho reclama ainda a relocalização do pórtico da A28 entre Neiva e Darque, de acesso a uma das principais zonas industriais do concelho de Viana do Castelo.
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